Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios

19/1/2022 – Descarte de embriões criopreservados – Divórcio – TJDFT

por nadjur — publicado 20/01/2022

A Quinta Turma Cível confirmou sentença que julgou procedente pedido para que fossem descartados os embriões excedentários criopreservados da fertilização homóloga realizada in vitro durante a constância do casamento das partes. In casu, autora e réu utilizaram a aludida técnica em outubro de 2012 quando o homem consignou no formulário da clínica de fertilização que, na hipótese de divórcio, os embriões ficariam sob a responsabilidade da mulher. O ex-marido apelado, em reconvenção na ação de divórcio movida pela apelante, pleiteou o descarte dos embriões excedentários da técnica realizada quando ainda eram casados. Ao analisar o apelo, a Relatora destacou que o art. 5º da Lei 11.105/2005 (Lei de Biossegurança) permite a pesquisa científica com embriões desde que autorizada pelos genitores, de maneira que a manipulação e posterior descarte do material estão permitidos quando observadas as normas legais, sem que isso enseje violação ao direito à vida. Informou que o Conselho Federal de Medicina/CRM em diversas Resoluções sobre as técnicas da reprodução assistida, permite o descarte do material biológico decorrente desses procedimentos, observadas as regras legais e regulamentares. Explicou que a anuência do apelado reconvinte no formulário da clínica não foi voluntária, uma vez que esse pronunciamento foi imposto pela Resolução 157 do CRM, vigente à época dos fatos, a qual determinava que as clínicas de fertilização colhessem a manifestação informada dos genitores na hipótese de separação do casal. Esclareceu que, conforme o disposto no § 3º do citado art. 5º da Lei de Biossegurança, os embriões não podem ser comercializados e, por isso, não devem ser objeto de contrato, não havendo que se falar, assim, no princípio do pacta sunt servanda no presente caso. Asseverou que nos termos do § 7º do art. 226 da Constituição Federal, fundado nos princípios da paternidade responsável e da autodeterminação também no planejamento familiar, é decisão do casal ter filhos ou não, sendo proibida qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. Ponderou que a paternidade responsável abrange uma porção de direitos e deveres jurídicos sociais e morais dos pais biológicos ou afetivos, os quais ganharam uma nova roupagem a partir do desenvolvimento das técnicas de reprodução assistida, nas quais se verifica “a cisão temporal entre a formação do embrião e a implantação no útero da pessoa que gestará o feto.” Disse que em virtude dos princípios da autodeterminação e do livre planejamento familiar como decisão do casal, o desejo de ter filhos daqueles que escolherem a fertilização in vitro homóloga, se quiserem exercer a paternidade a partir de embriões excedentários criopreservados, deve ser mantida até a implantação na mulher que gestará a criança. Acrescentou que nesse caso, um ou ambos os cônjuges ou ex-consortes que utilizaram a reprodução assistida podem alterar ou revogar a vontade com relação ao embrião criopreservado. Assegurou que a paternidade responsável é um ato voluntário, fruto do exercício da autodeterminação de cada pessoa, não se tratando de uma imposição. Argumentou que acolher o pedido da apelante significaria impor ao apelado a eventual utilização dos embriões pela recorrente, o que o tornaria pai biológico de uma nova criança, contra a sua vontade. Ao fim, o Colegiado entendeu que o consentimento externado no documento da clínica de reprodução assistida pode ser modificado ou revogado a qualquer momento, em homenagem aos princípios da autodeterminação no planejamento e da paternidade responsável.  

0702501-17.2019.8.07.0011, Relatora: Desembargadora Maria Ivatônia, Quinta Turma Cível, unânime, data da publicação: 13/12/2021.