Informativo de Jurisprudência n. 381

Período: 16 a 31 de outubro de 2018

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TEMAS

 

Direito Constitucional

CRÍTICA A COLEGA DE TRABALHO NA INTERNET – OFENSA À HONRA E À IMAGEM – DANOS MORAIS

DECLARAÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE DE NORMA ESTADUAL – EXTENSÃO DO EFEITO VINCULANTE SOBRE A MULTA DECORRENTE DO TRANSPORTE CLANDESTINO INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS

 

Direito Administrativo

DEMOLIÇÃO DETERMINADA EM DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO – REGULARIZAÇÃO DA ÁREA POR LEGISLAÇÃO POSTERIOR – POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS

 

Direito Civil e Processual Civil

MANIFESTO INTERESSE DA PARTE NA REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO – PROCEDIMENTO ASSEGURADO PELO CPC DE 2015

ACIDENTE EM EXCURSÃO ESCOLAR – DANOS À SAÚDE DE ALUNO – RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DA ESCOLA 

ESTERILIZAÇÃO EM PESSOA COM DEFICIÊNCIA – NECESSIDADE DO CONSENTIMENTO ESCLARECIDO

 

Direito Penal e Processual Penal

ERRO PROFISSIONAL QUE CAUSA MORTE – OBSERVÂNCIA DE NORMAS TÉCNICAS – ATIPICIDADE

XINGAMENTO A FUNCIONÁRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES – INEXISTÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO – NÃO CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE DESACATO

 

Direito do Consumidor

PERDA DE ÓRGÃO EM RAZÃO DE ERRO MÉDICO – DANOS MORAIS E ESTÉTICOS

 

Direito Tributário

COBRANÇA DE ITBI – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE DO IMÓVEL – INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM

 

Direito Empresarial

SOCIEDADE SIMPLES NA MODALIDADE LIMITADA – PLEITO DE SÓCIO, CONTRÁRIO A CLÁUSULA CONTRATUAL – VIOLAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA E VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM

Direito Constitucional

CRÍTICA A COLEGA DE TRABALHO NA INTERNET – OFENSA À HONRA E À IMAGEM – DANOS MORAIS

A criação de história em quadrinhos veiculada na internet, com críticas a colega de trabalho, enseja indenização por danos morais. Um servidor público ajuizou ação de indenização por danos materiais e morais em desfavor do colega de trabalho que criou histórias em quadrinhos nas quais ele era o protagonista. O requerente demonstrou a coincidência entre si e o personagem, pois este ocupava as mesmas funções que ele exerceu, durante cinco anos, no órgão público, além de haver semelhanças físicas entre ambos. Na sentença, o pedido foi julgado parcialmente procedente, para condenar o réu a pagar a indenização no valor de oito mil reais, a retirar as publicações da internet e a retratar-se. Indeferido o pleito de danos materiais. O réu interpôs recurso inominado. A Turma confirmou a identidade entre o personagem principal e o autor da demanda e acrescentou que o nome do recorrido fora expressamente mencionado em uma das narrativas. Consignou que o personagem – “uma porca homossexual e de ética duvidosa” – representa “uma crítica não apenas ao serviço público”, mas ao “próprio recorrido”, que sofreu abalo nas honras objetiva e subjetiva. O Colegiado asseverou que a liberdade de expressão não constitui direito ilimitado, pois não pode violar a esfera jurídica alheia. Por isso, manteve o dever de retratação e de remoção das histórias ofensivas da internet, bem como considerou adequada a indenização arbitrada. O recurso foi desprovido em decisão unânime.

Acórdão 1132753, 07096265520188070016, Relator Juiz ALMIR ANDRADE DE FREITAS, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, data de julgamento: 24/10/2018, publicado no DJe: 29/10/2018.

DECLARAÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE DE NORMA ESTADUAL – EXTENSÃO DO EFEITO VINCULANTE SOBRE A MULTA DECORRENTE DO TRANSPORTE CLANDESTINO INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS

A decisão definitiva em controle concentrado de constitucionalidade, sobre lei que trata do transporte clandestino de passageiros e que foi proferida por Tribunal estadual, possui efeito vinculante e se estende à multa aplicada em decorrência dessa prática. Na origem, a agência goiana de regulação, controle e fiscalização de serviços públicos ajuizou ação de execução fiscal lastreada em certidões da dívida ativa, para cobrar de cidadão autuado por transporte clandestino intermunicipal de passageiros, em conformidade com a Lei 14.480/2003, do Estado de Goiás, o pagamento de multa. Nos embargos à execução opostos em desfavor da agência, o embargante sustentou a inconstitucionalidade do artigo 2º da referida Lei em virtude do artigo 22, XI, da CF/88, que prevê a competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte. Requereu a anulação dos autos de infração que originaram a cobrança, além da suspensão do feito principal até o julgamento definitivo do RE 661702/DF, no qual o STF analisava a controvérsia sobre a competência para legislar sobre matéria relativa à lavratura de auto de infração, à imposição de penalidades e ao recolhimento de veículo no transporte irregular de passageiros. Sobreveio sentença que reconheceu a inconstitucionalidade do artigo 2º da citada Lei e declarou extinta a execução fiscal. Inconformada, a agência embargada apelou. Ao apreciar o caso, a Turma ressaltou que, apesar de reconhecer a corrente jurisprudencial, no TJDFT, que entende pela inconstitucionalidade da multa prevista na norma mencionada, verificou que, em consulta à jurisprudência do TJGO, este aplica as multas previstas na Lei questionada com base em acórdão proferido em controle concentrado de constitucionalidade (ADI 368/9-199). Destacou que a decisão definitiva no controle de constitucionalidade concentrado possui efeito vinculante para todos os órgãos do Judiciário, de acordo com o disposto no artigo 30, § 6º, da Constituição Estadual de Goiás. Esclareceu que o TJDFT deve observar que a legislação é originária e aplicável àquele Estado da Federação e que a supremacia do interesse público deve prevalecer sobre o interesse particular. Asseverou que a constitucionalidade da apreensão de veículo utilizado para o transporte clandestino de passageiros se estende também à multa, corretamente aplicada em razão do exercício do poder de polícia. Ainda, o Colegiado consignou que, embora tenha sido reconhecida a repercussão geral do RE 661702/DF, o pedido de sobrestamento dos processos foi indeferido; portanto, não existe óbice para o julgamento do recurso. Por fim, concluiu que a execução fiscal possui título executivo válido e, ausente a comprovação de ilegalidade ou de abuso de poder, deu provimento ao apelo, para reformar a sentença e para afastar a declaração de inconstitucionalidade do artigo 2º da Lei Estadual.

Acórdão 1130384, 07005095820188070010, Relatora Desa. VERA ANDRIGHI, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 11/10/2018, publicado no DJe: 22/10/2018.

Direito Administrativo

DEMOLIÇÃO DETERMINADA EM DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO – REGULARIZAÇÃO DA ÁREA POR LEGISLAÇÃO POSTERIOR – POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS

É possível a conversão da obrigação de demolir edificação em perdas e danos, se posterior alteração legislativa regularizar a edificação do imóvel. Na origem, a autora ajuizou ação de nunciação de obra nova, para inibir ou para demolir obra em imóvel vizinho, de propriedade do réu, policial militar, denominado “becos” do Gama. A área da edificação havia sido doada pelo Distrito Federal a policiais e a bombeiros militares com fundamento na Lei Complementar 728/2006. Na sentença, os pedidos foram julgados improcedentes. Interposta apelação, o Tribunal reformou a decisão, para que o réu se abstivesse de realizar edificações no “beco”, pois a lei que autorizou a distribuição das áreas fora declarada inconstitucional pelo TJDFT. A demolição foi determinada em feito diverso, o Agravo de Instrumento 2012.00.2.011424-6. Acionado para executar o ato de demolição da construção, o Distrito Federal, na fase de cumprimento de sentença, manifestou-se contrário à determinação, alegando que a superveniência da Lei Complementar 882/2014 regularizou as ocupações. Essa Lei Complementar foi objeto de ADI 2014.00.2.016828-2 no TJDFT e, julgada improcedente pelo Conselho Especial, aguarda julgamento de Recurso Extraordinário pelo Supremo Tribunal Federal. Assim, o Juízo de origem determinou a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, no valor de R$ 20.000,00. Interposto novo agravo de instrumento pela autora, o Relator verificou que a agravante detinha título judicial com trânsito em julgado, que legitimava a demolição; todavia, a edificação feita pelo executado/agravado seria considerada legal, enquanto a Lei de regularização das ocupações continuasse vigente. Dessa forma, o Colegiado concluiu que o meio mais adequado para solucionar o problema seria a conversão da obrigação de demolir o imóvel em perdas e danos, pois, apesar de a construção ser legítima, a agravante experimentou prejuízos materiais que culminaram no ajuizamento da ação protetiva do exercício da posse. Assim, a Turma negou provimento ao agravo de instrumento à unanimidade.

Acórdão 1129551, 07128322820188070000, Relator Des. SEBASTIÃO COELHO, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 10/10/2018, publicado no DJe: 18/10/2018.

Direito Civil e Processual Civil

MANIFESTO INTERESSE DA PARTE NA REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO – PROCEDIMENTO ASSEGURADO PELO CPC DE 2015

O atual Código de Processo Civil assegura a realização de audiência de conciliação ou de mediação, desde que haja requerimento expresso de uma das partes e o direito em litígio seja passível de autocomposição. No caso, trata-se de ação de repetição de indébito com pedidos de tutela de urgência, para suspender de cadastro de inadimplentes a inscrição do nome da autora, e de designação de audiência de conciliação. O Juízo a quo indeferiu a antecipação dos efeitos da tutela, por considerar necessária a análise probatória. Quanto ao pedido de audiência de conciliação, asseverou que, em virtude da congestionada pauta de julgamentos, a realização do ato implicaria demora na prestação jurisdicional, o que representaria ofensa ao princípio da duração razoável do processo. Além disso, o Magistrado ponderou que postergar eventual conciliação não acarretaria prejuízo às partes, haja vista que, em qualquer fase do processo, poderia ocorrer a solução alternativa extrajudicial do litígio. Irresignada, a autora interpôs agravo de instrumento com novo pedido de antecipação de tutela, o qual foi deferido pelo Relator. Segundo o Desembargador, a audiência de conciliação ou de mediação, prevista no artigo 334 do Código de Processo Civil, constitui mecanismo de estímulo à autocomposição das partes na fase inicial do processo, antes mesmo da dilação probatória. Acrescentou que a designação da audiência preliminar aos feitos não julgados liminarmente improcedentes é assegurada pela legislação processual, desde que haja manifesto interesse de uma das partes e seja admissível a composição consensual do direito em conflito. Nesse contexto, a Turma, ao confirmar a tutela de natureza antecipada deferida, deu provimento ao recurso, para determinar a designação de audiência de conciliação pelo Juízo de origem e para condicionar a suspensão da inscrição do nome da autora em órgãos de proteção ao crédito ao prévio depósito de caução idônea, compatível com o valor devido.

Acórdão 1129888, 07098131420188070000, Relator Des. HECTOR VALVERDE, 1ª Turma Cível, data de julgamento: 10/10/2018, publicado no DJe: 16/10/2018. 

ACIDENTE EM EXCURSÃO ESCOLAR – DANOS À SAÚDE DE ALUNO – RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DA ESCOLA

Acidente em excursão escolar que causa danos sérios à saúde de aluno enseja a responsabilização da escola por danos material e moral. Em primeira instância, instituição de ensino infantil foi condenada ao pagamento de indenização por danos materiais e morais à aluna de seis anos de idade, que teve a perna direita fraturada em razão de uma pirueta chamada “estrelinha”, efetuada por outro aluno de compleição e idade maiores que as da vítima, em excursão promovida pela escola. Em apelação, a ré alegou que o evento danoso decorreu de caso fortuito e não houve falha na prestação de serviço nem culpa in vigilando. Pleiteou que fosse reduzida a indenização por dano moral, fixada em R$ 20.000,00, sob o argumento de que tratou o caso com zelo e de que não foi negligente. Ao apreciar o recurso, o Relator destacou que a responsabilidade da instituição de ensino é objetiva e fundada no risco da atividade desenvolvida, consoante prevê o código consumerista. Pontuou que a escola assumiu o risco de ocorrência do acidente, na medida em que não procedeu à separação dos alunos por faixa etária, durante o passeio. Explicou que o sofrimento causado à criança pela “brincadeira” ultrapassa a esfera do mero dissabor e enseja o pagamento de indenização por dano moral. Assim, a Turma, em decisão unânime, negou provimento à apelação.

Acórdão 1132264, 20160110859720APC, Relator Des. ALFEU MACHADO, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 17/10/2018, publicado no DJe: 30/10/2018.

ESTERILIZAÇÃO EM PESSOA COM DEFICIÊNCIA – NECESSIDADE DO CONSENTIMENTO ESCLARECIDO

O consentimento esclarecido da mulher com deficiência, respeitadas as peculiaridades e a extensão de suas limitações, é imprescindível para a realização de laqueadura tubária no momento do parto. Na origem, uma deficiente, representada por curadora, ajuizou ação cominatória contra o Distrito Federal, para requerer, em sede de tutela de urgência, a submissão à cirurgia de laqueadura tubária no momento do parto, nos termos de prescrição médica, em hospital da rede pública. A medida foi indeferida sob o fundamento de não ter sido demonstrada a recusa do DF em submeter a requerente ao procedimento. Em resposta ao agravo de instrumento interposto pela autora, os Magistrados consignaram que a ausência de comprovação não impede o pleito. Entenderam que o caso se amolda à hipótese de esterilização voluntária, prevista no inciso II do artigo 10 da Lei 9.263/1996. Pontuaram, contudo, que o consentimento expresso da mulher é necessário e que ela deve ser devidamente informada sobre a intervenção cirúrgica. Apontaram que no termo de solicitação de contracepção cirúrgica consta apenas a assinatura da curadora da agravante, o que ofende dispositivos da Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), que assegura aos deficientes exercerem direitos sexuais e reprodutivos, decidirem sobre reprodução e planejamento familiar, conservarem sua fertilidade e consentirem na realização de tratamento, procedimento, hospitalização e pesquisa científica. Além disso, os Desembargadores afirmaram que a Lei prevê que a curatela não alcança direitos inerentes ao corpo e à sexualidade do deficiente. A Turma concluiu que, sem o consentimento esclarecido da agravante, obtido conforme as peculiaridades e a extensão de suas limitações, é impossível permitir a esterilização voluntária. Com base em tais fundamentos, negaram provimento ao recurso.

Acórdão 1131055, 07085703520188070000, Relator Des. JAMES EDUARDO OLIVEIRA, 4ª Turma Cível, data de julgamento: 17/10/2018, publicado no PJe: 23/10/2018.

Direito Penal e Processual Penal

ERRO PROFISSIONAL QUE CAUSA MORTE – OBSERVÂNCIA DE NORMAS TÉCNICAS – ATIPICIDADE

O médico que observa os procedimentos técnicos adequados, mas se equivoca no diagnóstico, não pode ser considerado negligente, ainda que o paciente venha a óbito. Na origem, médica de hospital público foi condenada por homicídio culposo (artigos 121, § 3º, c/c 13, caput e §2º, ambos do CP) e ao pagamento de R$ 65.000,00 a título de danos morais, em razão da morte de paciente de 74 anos. A acusação sustentou que a ré agiu culposamente e violou as regras técnicas da profissão, pois realizou atendimento clínico “sucinto e incompleto” e determinou alta hospitalar precipitada. Assim, o idoso retornou para casa após a liberação da médica plantonista, mesmo sentindo fortes dores abdominais, e faleceu cerca de cinco horas depois, por choque hipovolêmico secundário de dissecção de aneurisma de aorta abdominal. A ré apelou e requereu absolvição, além do afastamento da condenação por danos morais. Na análise do recurso, a Turma esclareceu tratar-se de acidente médico (erro profissional e fato atípico), e não de erro médico (omissão negligente). Naquele caso, são empregados os conhecimentos e as práticas normais à área técnica, mas o profissional se equivoca no diagnóstico. Já na hipótese de erro médico, o Colegiado consignou que o garante/médico quebra o dever geral de cautela em relação ao paciente e age de forma culposa. Entendeu que os exames físicos e complementares não evidenciaram a existência da patologia que causou a morte da vítima. Dessa forma, a Turma explicou que o quadro apresentado pelo paciente era de difícil acerto no diagnóstico e de alto índice de mortalidade. Tais circunstâncias, confirmadas por outros médicos em depoimentos, resultado de sindicância no CRM, e também por perícia, levaram à conclusão de que o resultado trágico não pode ser imputado à ré. Por fim, a Turma ressaltou que o diagnóstico equivocado poderia ter ocorrido até mesmo em situações ideais de recursos humanos e materiais, o que notoriamente não é o caso dos hospitais públicos. Assim, o recurso foi provido à unanimidade, para absolver a acusada da imputação de homicídio culposo, nos termos do artigo 386, VII, do CPP.

Acórdão 1130867, 20140810009917APR, Relator Des. JESUINO RISSATO, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 4/10/2018, publicado no DJe: 17/10/2018.

XINGAMENTO A FUNCIONÁRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES – INEXISTÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO – NÃO CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE DESACATO

O ato de xingar policial militar no exercício das funções não caracteriza o crime de desacato, quando ausente o dolo específico de denegrir ou de menosprezar funcionário público ou a Administração. Na hipótese, o réu foi abordado por policiais militares, enquanto conduzia sua motocicleta. Na vistoria, constataram que o lacre da placa estava rompido, o condutor não possuía habilitação e a documentação do veículo estava vencida. O acusado, então, foi informado de que a moto seria retida e conduzida ao depósito do DETRAN. Ao resistir à apreensão do bem, o réu foi rendido pelos policiais com o uso de spray de pimenta e passou a xingar os agentes. Denunciado pelo crime de desacato a funcionário público no exercício da função ou em razão dela (artigo 331 do Código Penal), o condutor foi absolvido por inexistência de dolo específico. Interposta apelação pelo Ministério Público, o Relator asseverou que, em razão das circunstâncias em que foram proferidos os xingamentos contra os militares, não se vislumbrou, na conduta do réu, o animus de denegrir ou de menosprezar o poder estatal, elemento imprescindível para a caracterização do delito. Acrescentou que houve, em verdade, mero desabafo num momento de raiva e nervosismo. Segundo o Magistrado, tipificar tal fato como desacato significaria privilegiar o excesso de sensibilidade do funcionário que lida com o público. Assim, a Turma, à unanimidade, concluiu que o entendimento mais próximo do ideal de justiça seria a absolvição do acusado.

Acórdão 1130151, 20170310063073, Relator Juiz ARNALDO CORRÊA SILVA, 2ª Turma Recursal, data de julgamento: 10/10/2018, publicado no DJe: 16/10/2018. 

Direito do Consumidor

PERDA DE ÓRGÃO EM RAZÃO DE ERRO MÉDICO – DANOS MORAIS E ESTÉTICOS

A perda de órgão por erro médico enseja indenização por danos morais e estéticos, ainda que a deformação causada seja transitória e passível de correçãoEm primeira instância, o autor ajuizou ação de indenização por danos morais e estéticos contra o hospital que, ao lhe prestar atendimento médico emergencial, deixou de solicitar qualquer exame clínico, apesar dos relatos de fortes dores na região escrotal. Afirma que o atendimento foi falho, pois somente lhe foram ministrados remédios. Informou que, dois dias depois, realizou nova consulta em hospital especializado e, constatada a torção, com ausência de vascularização, em um dos testículos, foi imediatamente submetido à intervenção cirúrgica para remoção do órgão. O Juízo a quo condenou o réu ao pagamento de R$ 35.000,00 a título de danos morais, mas julgou improcedente o pedido de indenização por danos estéticos. As partes apelaram. O Relator destacou que a obrigação do prestador de serviço médico é de meio, ou seja, o hospital não poderia ser responsabilizado por não ter curado o autor, ou por não ter evitado a perda do testículo dele.  Contudo, asseverou que o nosocômio deveria ter proporcionado ao paciente o melhor tratamento possível, e não o fez, visto que deixou de realizar os exames indicados pela literatura médica para o caso. Acrescentou que, segundo indicações científicas, a dor testicular é o principal sintoma do diagnóstico denominado escroto agudo; logo, seria plenamente viável que um médico reconhecesse os sintomas apresentados pelo autor. O Magistrado pontuou que, de acordo com a perícia, a intervenção médica deveria ter sido feita em curto espaço de tempo, pois menos de 10% dos pacientes apresentam viabilidade testicular após 24 horas de torção. Ponderou, ainda, que, se o paciente tivesse sido alertado sobre a possibilidade da perda do órgão, certamente teria procurado atendimento especializado imediatamente. Assim, concluiu que não houve culpa exclusiva do autor, como alegado pelo réu; que o nexo de causalidade ficou comprovado em virtude da conduta negligente e determinante do hospital para o retardamento do procedimento médico adequado; e que, ainda que não houvesse o citado nexo de causalidade naturalístico, a responsabilidade civil não poderia ser afastada em decorrência da omissão do hospital, que causou a perda de uma chance de cura para o autor. Ao final, esclareceu que o dano moral é evidente, pois a integridade física do paciente foi atingida, gerando dor, sofrimento e transtornos. Sobre o dano estético, entendeu que este também foi configurado, porque o autor, jovem de vinte anos, perdeu “parte do seu corpo”, fato que causou alteração morfológica capaz de produzir constrangimentos, ainda que possa ser corrigida por meio de cirurgia de prótese testicular. Dessa forma, em decisão unânime, a Turma negou provimento ao apelo do réu e deu parcial provimento ao recurso do autor, para, mantida a condenação por danos morais, condenar o hospital ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de danos estéticos.

Acórdão 1131262, 20160111193833APC, Relator Des. ESDRAS NEVES, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 17/10/2018, publicado no DJe: 23/10/2018.

Direito Tributário

COBRANÇA DE ITBI – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE DO IMÓVEL – INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM

Não existe bis in idem na cobrança de ITBI, quando consolidada a propriedade do bem imóvel em favor do credor fiduciário, após inadimplemento do devedor fiduciante. Uma construtora ajuizou ação para obter a declaração de nulidade do lançamento de ITBI relativo a imóvel objeto de contrato de compra e venda com alienação fiduciária em garantia bem como a condenação do Distrito Federal à devolução ou à compensação do valor recolhido. Argumentou que haveria bis in idem na tributação, pois o comprador, ao adquirir o bem e lavrar a escritura, recolheu o imposto. A sentença julgou a demanda improcedente, por considerar legal a cobrança do tributo na espécie, e a requerente apelou.  O Colegiado explicou que, nos contratos de alienação fiduciária disciplinados pela Lei 9.514/1997, o devedor/fiduciante transfere a propriedade resolúvel do imóvel ao credor/fiduciário até o pagamento total da obrigação. Como nesse tipo de operação subsistem dois instrumentos negociais: a compra e venda, como contrato principal; e a alienação, como pacto acessório, o comprador tem o dever de recolher o ITBI logo na assinatura da avença, pois há registro do imóvel em seu favor. A Turma esclareceu que, quando quitada a dívida, a propriedade se torna plena para o adquirente e, se houver inadimplemento deste, o direito consolida-se em nome do credor fiduciário. Assim, neste caso, existe efetiva hipótese de incidência do tributo, pois a propriedade fiduciária, que antes era temporária, passa a ser definitiva, transmitindo-se ao credor a integralidade dos poderes que lhes são inerentes. Logo, o Colegiado entendeu ser cabível a exação, por não mais se tratar de direito de garantia resolúvel, mas de direito real, advindo do inadimplemento do mútuo. Desse modo, ponderou que não existe duplicidade na cobrança, porque o primeiro recolhimento decorreu da compra e venda e recaiu sobre o comprador, enquanto a segunda cobrança proveio do descumprimento daquele contrato e da consolidação da propriedade plena em favor do fiduciário. Por fim, negou-se provimento ao recurso.

Acórdão 1133391, 07045288320188070018, Relatora Desª. ANA CANTARINO, 8ª Turma Cível, data de julgamento: 25/10/2018, publicado no DJe: 31/10/2018.

Direito Empresarial

SOCIEDADE SIMPLES NA MODALIDADE LIMITADA – PLEITO DE SÓCIO, CONTRÁRIO A CLÁUSULA CONTRATUAL – VIOLAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA E "VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM"

O pedido de sócio que não contribuiu com o trabalho efetivo e intenta a percepção de lucros condicionada ao labor, contrariando disposição contratual à qual anuíra expressamente, viola a boa-fé objetiva e caracteriza venire contra factum proprium. Sócia de empresa da área médica, constituída como sociedade simples na modalidade limitada, postulou em juízo a declaração de nulidade de cláusula contratual que condicionou a distribuição dos resultados ou a percepção de pró-labore ao trabalho efetivo do sócio, bem como a condenação ao pagamento dos valores que apontou na inicial. A sentença julgou prescrita a pretensão relativa à partilha dos lucros auferidos desde 2008 até três anos anteriores ao ajuizamento do feito e improcedentes os demais pleitos. Interposta apelação, a Turma esclareceu que existe norma específica para a sociedade limitada na parte que concerne à remuneração dos sócios, conforme artigos 1.053 c/c 1.071, IV, do Código Civil. Os Desembargadores explicaram que a requerente anuiu ao critério adotado pela empresa, segundo o qual a divisão dos lucros caberia apenas aos sócios em atividade à época do pagamento. Na hipótese, a sócia não detinha condições de preencher o requisito, porque residia fora do país e, nessa circunstância, não poderia contribuir com seu labor. Segundo o Colegiado, a inserção dessa condicionante tem pertinência com a atividade econômica desenvolvida pelo grupo, que depende do trabalho profissional ou intelectual dos sócios para atingir suas finalidades. Os Julgadores aduziram ainda que a autora afrontou a boa-fé objetiva, quando formulou pedido contrário às disposições contratuais, contra as quais não se insurgiu no momento adequado, incorrendo em venire contra factum proprium. Portanto, violou os deveres anexos ao contrato, pois buscou a percepção de valores que concordara em não receber. Por fim, concluíram que o exercício anormal e atemporal de um direito configura abuso, conduta que deve ser excluída do mundo jurídico em prol da manutenção do equilíbrio nas relações jurídicas privadas.

Acórdão 1130282, 07384206820178070001, Relator Des. CARLOS RODRIGUES, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 11/10/2018, publicado no DJe: 26/10/2018.

Informativo

1ª VICE-PRESIDÊNCIA

Secretária de Jurisprudência e Biblioteca: Sheyla Teixeira Lino

Subsecretário de Doutrina e Jurisprudência: Clélio Lima Santa Cecília Neto

Redação: Ana Paula Gama, Andrea Djanira Santos de Paula, Luana Oliveira Torres Monteiro, Mark Willis Valério Costa, Patricia Lopes da Costa e Susana Moura Macedo

Colaboradores: Cristiana Costa Freitas, Monica Maria Oliveira Fonseca e Paulo Gustavo Barbosa Caldas

Revisão: Ana Luiza de Azevedo dos Santos

Conversão do texto em áudio: Alexandre da Silva Lacerda

E-mail: jurisprudencia.nupijur@tjdft.jus.br

 

Este Informativo é produzido pelo Núcleo de Pesquisa e Informativo de Jurisprudência – NUPIJUR.

 

As notas aqui divulgadas foram elaboradas a partir de acórdãos selecionados pelo Núcleo de Pesquisa e Informativo de Jurisprudência da SUDJU e não constituem, portanto, repositório oficial da jurisprudência deste Tribunal.

 

Acesse também:

Direitos fundamentais na visão do TJDFT

Novo Código de Processo Civil e o TJDFT

Dano Moral no TJDFT

CDC na visão do TJDFT

Doutrina na Prática

Lei Maria da Penha na visão do TJDFT

Entendimentos Divergentes no TJDFT

Inconstitucionalidades

Jurisprudência em Detalhes

Jurisprudência em Perguntas

Jurisprudência Administrativa Interna

Decisões em Evidência

Jurisprudência Reiterada