SOCIEDADE SIMPLES NA MODALIDADE LIMITADA – PLEITO DE SÓCIO, CONTRÁRIO A CLÁUSULA CONTRATUAL – VIOLAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA E "VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM"

O pedido de sócio que não contribuiu com o trabalho efetivo e intenta a percepção de lucros condicionada ao labor, contrariando disposição contratual à qual anuíra expressamente, viola a boa-fé objetiva e caracteriza venire contra factum proprium. Sócia de empresa da área médica, constituída como sociedade simples na modalidade limitada, postulou em juízo a declaração de nulidade de cláusula contratual que condicionou a distribuição dos resultados ou a percepção de pró-labore ao trabalho efetivo do sócio, bem como a condenação ao pagamento dos valores que apontou na inicial. A sentença julgou prescrita a pretensão relativa à partilha dos lucros auferidos desde 2008 até três anos anteriores ao ajuizamento do feito e improcedentes os demais pleitos. Interposta apelação, a Turma esclareceu que existe norma específica para a sociedade limitada na parte que concerne à remuneração dos sócios, conforme artigos 1.053 c/c 1.071, IV, do Código Civil. Os Desembargadores explicaram que a requerente anuiu ao critério adotado pela empresa, segundo o qual a divisão dos lucros caberia apenas aos sócios em atividade à época do pagamento. Na hipótese, a sócia não detinha condições de preencher o requisito, porque residia fora do país e, nessa circunstância, não poderia contribuir com seu labor. Segundo o Colegiado, a inserção dessa condicionante tem pertinência com a atividade econômica desenvolvida pelo grupo, que depende do trabalho profissional ou intelectual dos sócios para atingir suas finalidades. Os Julgadores aduziram ainda que a autora afrontou a boa-fé objetiva, quando formulou pedido contrário às disposições contratuais, contra as quais não se insurgiu no momento adequado, incorrendo em venire contra factum proprium. Portanto, violou os deveres anexos ao contrato, pois buscou a percepção de valores que concordara em não receber. Por fim, concluíram que o exercício anormal e atemporal de um direito configura abuso, conduta que deve ser excluída do mundo jurídico em prol da manutenção do equilíbrio nas relações jurídicas privadas.

Acórdão 1130282, 07384206820178070001, Relator Des. CARLOS RODRIGUES, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 11/10/2018, publicado no DJe: 26/10/2018.