Informativo de Jurisprudência n. 404

Período: 1º a 15 de novembro de 2019

Versão em áudio: audio/mpeg informativo404.mp3 — 27.8 MB

Publicação: 4 de dezembro de 2019

Acesse a versão em PDF

Direito Administrativo

Incidente de uniformização de jurisprudência – recusa em realizar teste de alcoolemia – infração de mera conduta

Restrição de animais domésticos em área de proteção ambiental – poder de polícia administrativa

Suspensão integral do salário de policial preso – pagamento parcial garantido por lei especial

Direito Civil e Processual Civil

Correção de registro civil – divergência entre assentamentos nacional e estrangeiro – procedimento especial de jurisdição voluntária

Cumprimento de sentença – consulta à Central Nacional de Indisponibilidade de Bens – instrumento de prevenção à dilapidação de patrimônio

Direito Constitucional

Morte de detento em presídio – ingestão de cápsulas de drogas diversas – culpa exclusiva da vítima

Direito do Consumidor 

Aluguel de vestido à distância – rescisão do contrato – inexistência de obrigação de pagar por substituto mais caro

Direito Empresarial

Trespasse realizado por empresa franqueada – anuência tácita da franqueadora – inexistência de sucessão empresarial

Direito Penal e Processual Penal

Convencimento da vítima a repassar dinheiro a pretexto de abrir empresa para contratar com órgão público – obtenção de vantagem indevida mediante ardil

Dissimulação de gênero em namoro virtual – perfil falso em rede social – violação sexual mediante fraude

Direito Tributário

Diferencial de alíquota de ICMS – repartição de receitas – inexigência de lei complementar específica 

Direito Administrativo

Incidente de uniformização de jurisprudência – recusa em realizar teste de alcoolemia – infração de mera conduta

A infração prevista no artigo 165-A do Código de Trânsito Brasileiro, que trata da recusa do condutor de veículo a realizar testes ou exames para verificação do uso de álcool ou de outras substâncias psicoativas, é de mera conduta e dispensa a certificação do estado de embriaguez. In casu, um condutor se recusou a fazer o teste do bafômetro e foi autuado. Posteriormente, o auto de infração foi anulado por não ter sido atestada a situação de embriaguez. O Departamento de Trânsito do Distrito Federal (DETRAN-DF) recorreu. Ao analisar o recurso, o Relator suscitou, de ofício, incidente de uniformização de jurisprudência, em razão da controvérsia entre as Turmas Recursais acerca da necessidade de comprovação do estado de embriaguez do condutor para caracterizar a infração do artigo 165-A do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Ao discutirem a divergência, os Juízes afirmaram que o artigo 165, caput, do CTB pune quem dirige sob a influência de álcool e de substâncias entorpecentes, enquanto o artigo 165-A do mesmo diploma sanciona o motorista que se nega a realizar os procedimentos previstos no artigo 277 do CTB, os quais objetivam atestar o estado de consciência e de lucidez da pessoa ao volante. Asseveraram que os tipos são autônomos e diversos, embora ambos sejam infrações gravíssimas apenadas com multa, suspensão do direito de dirigir, recolhimento da habilitação e retenção do automóvel. Ressaltaram que, diferentemente do artigo 165, caput, a infração do artigo 165-A é de mera conduta e dispensa a constatação de que o agente tenha feito uso de substância entorpecente antes de dirigir. Os Magistrados esclareceram que o legislador buscou punir aquele que se nega a realizar o teste do bafômetro com o mesmo rigor que penaliza os condutores embriagados, com o fim de evitar as constantes recusas de motoristas a se submeterem ao exame e, assim, conferir maior efetividade à lei. Nesse contexto, aduziram que o princípio constitucional de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo (nemo tenetur se detegere) somente é aplicável na esfera administrativa quando também constituir ilícito penal, o que não é o caso. Acrescentaram que punir a recusa não fere o princípio da dignidade humana, pois a submissão ao teste não representa coação moral ou física. Assim, o Colegiado fixou a seguinte tese jurídica: “A recusa do condutor de veículo, abordado na direção de veículo em via pública e/ou que tenha se envolvido em acidente de trânsito, em realizar o teste do etilômetro, por si só, configura a infração de trânsito prevista no artigo 165-A do Código de Trânsito Brasileiro, independentemente da elaboração do auto de constatação.”

Acórdão 1213765, 20190020029770UNJ, Relator Juiz ASIEL HENRIQUE DE SOUSA, Turma de Uniformização, data de julgamento: 12/9/2019, publicado no DJe: 13/11/2019.

Restrição de animais domésticos em área de proteção ambiental – poder de polícia administrativa

O ato de polícia administrativa que restringe o ingresso de animais domésticos em parque ecológico prevalece sobre os interesses de determinados frequentadores quando visa conferir proteção diferenciada ao meio ambiente. Alguns cidadãos ajuizaram ação popular contra o Distrito Federal e o Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do DF (IBRAM) com o objetivo de anular ato administrativo que proibiu a entrada de animais de estimação em parque ecológico, sem prévia consulta à população diretamente interessada ou apresentação de justificativa ambiental. O pedido foi julgado improcedente. Ao analisarem o recurso, os Desembargadores apontaram a existência de um conflito entre o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o interesse dos frequentadores do parque de acessá-lo acompanhados dos animais domésticos. Consignaram que o ato atacado – um ofício circular – é válido, pois concilia a amplitude de acesso do usuário com a preservação ambiental e a proteção dos ecossistemas protegidos, em conformidade com as disposições do Regimento Interno dos Parques do DF. Os Julgadores ressaltaram que o IBRAM tem a finalidade de controlar e fiscalizar, por meio do poder de polícia, qualquer atividade que cause ou possa causar poluição ou degradação do meio ambiente e dos recursos hídricos. Nesse contexto, esclareceram que a proibição, baseada em pareceres técnicos, constitui medida necessária e adequada à proteção da fauna, destinada a evitar o dano ambiental causado pelos dejetos não recolhidos adequadamente. Os Desembargadores observaram que, devido às peculiaridades do parque, este foi elevado ao status de unidade de conservação, motivo pelo qual demanda maiores cuidados para sua preservação. Assim, entenderam que o ato atacado é revestido de validade, pertinência e adequação para garantir a proteção constitucional ao meio ambiente, cujo titular é a coletividade, sobretudo na hipótese, que trata de área ambiental sensível. Com isso, a Turma negou provimento ao recurso. 

Acórdão 1213280, 00321577820158070018, Relator Des. GILBERTO PEREIRA DE OLIVEIRA, 3ª Turma Cível, data de julgamento: 6/11/2019, publicado no PJe: 8/11/2019.

Suspensão integral do salário de policial preso – pagamento parcial garantido por lei especial

A determinação de corte integral da remuneração de policial civil preso cautelarmente constitui medida ilegal e abusiva, em razão da existência de lei específica da carreira policial que assegura o pagamento parcial do salário durante o encarceramento do agente. Na origem, um agente da Polícia Civil do Distrito Federal, preso preventivamente, impetrou mandado de segurança contra ato do Diretor-Geral da PCDF que o excluiu da folha de pagamento do órgão. O Juízo sentenciante concedeu a ordem ao fundamento de que a exclusão é inconstitucional, por ferir direitos e garantias individuais. Em reexame necessário, a Turma confirmou a sentença. O Distrito Federal interpôs Recursos Especial e Extraordinário. O Supremo Tribunal Federal cassou o acórdão e determinou o retorno dos autos para que fosse respeitada a cláusula de reserva de plenário. Observado o quórum qualificado, o Conselho Especial afastou a arguição de inconstitucionalidade. Em nova apreciação da remessa necessária pela Turma, os Desembargadores ressaltaram que o regime próprio dos agentes da PCDF lhes assegura o recebimento da remuneração – reduzida de apenas um terço – durante o período da prisão preventiva (Lei 4.878/65 e Decreto 59.310/66). Assim, concluíram que o corte integral da verba salarial do impetrante foi ilegal e abusivo. Nesse contexto, a Turma negou provimento à remessa oficial e manteve a decisão de primeira instância, embora por outros fundamentos, para garantir ao impetrante o recebimento de dois terços da remuneração até ulterior soltura, demissão ou eventual decisão condenatória criminal definitiva. 

Acórdão 1211305, 20010111044894RMO, Relator Des. CESAR LOYOLA, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 23/10/2019, publicado no DJe: 6/11/2019.

Direito Civil e Processual Civil

Correção de registro civil – divergência entre assentamentos nacional e estrangeiro – procedimento especial de jurisdição voluntária

A retificação de registro civil de pessoa natural para se conformar a assentamento estrangeiro deve ser postulada mediante procedimento especial de jurisdição voluntária, no juízo de registros públicos. Mãe e filho ajuizaram ação declaratória para corrigir registro civil de parente português falecido, por divergência na grafia do nome e omissão do sobrenome português na certidão de casamento lavrada no Brasil, com o intuito de obterem o reconhecimento da cidadania lusitana. O sentenciante extinguiu o feito, sem resolução do mérito, por ausência de interesse processual. Os autores apelaram pugnando pela cassação da sentença. Ao analisarem o recurso, os Desembargadores consignaram que é da competência exclusiva do Juízo de Registros Públicos o processo e o julgamento de questões relacionadas a registros públicos e notariais (artigo 31, III, da Lei 11.679/2008). In casu, entenderam que eventual dissonância nos dados do assentamento brasileiro em relação ao registro português deve ser resolvida mediante procedimento especial de jurisdição voluntária, no Juízo especializado, e não por meio de ação declaratória proposta no Juízo Cível – como feito na hipótese. Com isso, a Turma confirmou a carência da ação declaratória, por não subsistirem dúvidas quanto à identificação da pessoa falecida, mas apenas incongruências em assentamento civil, as quais devem ser sanadas em jurisdição administrativa.

Acórdão 1211082, 07112254020198070001, Relator Des. TEÓFILO CAETANO, 1ª Turma Cível, data de julgamento: 23/10/2019, publicado no DJe: 4/11/2019.

Cumprimento de sentença – consulta à Central Nacional de Indisponibilidade de Bens – instrumento de prevenção à dilapidação de patrimônio

A consulta à Central Nacional de Indisponibilidade de Bens, ferramenta que rastreia os bens do devedor e evita a dilapidação do patrimônio, deve ser permitida para garantir o resultado útil da execução, especialmente quando o exequente não encontra, por meio de outros sistemas de busca, bens disponíveis para satisfazer seu crédito. Em cumprimento de sentença, o juízo indeferiu o pedido formulado pelo exequente para localizar bens do devedor por meio da Central Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB). Ao apreciarem recurso interposto pelo credor, os Desembargadores esclareceram que a CNIB foi criada pelo Provimento CNJ 39/2014 com a finalidade de integrar todas as indisponibilidades de bens decretadas nas esferas judicial e administrativa. Explicaram que a central confere efetividade às decisões judiciais, pois transmite dados relativos a bloqueio de bens aos ofícios de notas e registros de imóveis de todo o território nacional, de forma a conferir segurança aos negócios de compra, venda e financiamento de bens. Nesse contexto, os Julgadores asseveraram que a Central evita a anulação de transações patrimoniais realizadas de boa-fé. Acrescentaram que, ao rastrear todos os bens do atingido pela indisponibilidade, a CNIB impede a dilapidação de patrimônio e consolida-se como importante ferramenta usada no combate ao crime organizado e na recuperação de ativos de origem ilícita. Os Magistrados afirmaram que, na hipótese, o exequente adotou as medidas possíveis para receber o que lhe era devido, a exemplo das buscas via BACENJUD, RENAJUD, INFOJUD e Junta Comercial, mas não obteve êxito. Por fim, destacaram que a finalidade da execução é a satisfação do crédito, de forma que a expropriação do patrimônio do devedor, nesse tipo de procedimento, visa garantir o resultado útil do processo. Ao final, a Turma deu provimento ao agravo para determinar a consulta à central.

Acórdão 1212543, 07123400220198070000, Relator Des. JOÃO EGMONT, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 23/10/2019, publicado no DJe: 7/11/2019.

Direito Constitucional

Morte de detento em presídio – ingestão de cápsulas de drogas diversas – culpa exclusiva da vítima

A morte de detento em presídio após a ingestão voluntária de cápsulas de substâncias entorpecentes decorre de culpa exclusiva da vítima, que afasta a responsabilidade do Estado. A genitora de um ex-detento ajuizou ação indenizatória contra o Distrito Federal, após a morte de seu filho no interior de estabelecimento prisional. Na primeira instância, reconhecido o dano moral, o pedido foi parcialmente atendido. Ao analisarem o recurso interposto pelo DF, os Desembargadores esclareceram que, no dia do evento, mais de quatrocentos presos retornaram ao presídio após autorização de saída em final de semana. Na ocasião, os agentes responsáveis pela segurança foram alertados pelos internos que um deles não se sentia bem, oportunidade em que acionaram o Serviço de Atendimento Médico de Urgência – SAMU para realização dos primeiros socorros. Apesar do pronto atendimento, o detento não resistiu e faleceu. Os Julgadores asseveraram que o laudo cadavérico atestou a presença de quinze corpos estranhos envoltos em dedos de luva de látex no abdômen do falecido – dentre eles, um isqueiro. Ressaltaram que um dos pacotes encontrava-se rompido e que a perícia confirmou a presença de substâncias como maconha, cocaína e mais de trezentos comprimidos de Rohypnol (medicamento indutor do sono). Nesse contexto, concluíram que o preso foi o único causador do dano e que o Poder Público não tinha como evitar o resultado morte. Assim, a Turma afastou a responsabilidade civil do Estado e reformou a sentença para julgar improcedente a pretensão indenizatória.

Acórdão 1209895, 07093017420188070018, Relatora Desª. VERA ANDRIGHI, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 16/10/2019, publicado no DJe: 4/11/2019.

Direito do Consumidor

Aluguel de vestido à distância – rescisão do contrato – inexistência de obrigação de pagar por substituto mais caro

A entrega ao consumidor de produto diverso do contratado enseja a rescisão do contrato, com restituição do valor pago, mas não implica a obrigação do fornecedor de arcar com a compra de produto mais caro. Uma consumidora alugou, pela internet, um vestido que seria confeccionado para o primeiro uso da filha em sua festa de quinze anos. Quando a peça ficou pronta, a requerida enviou uma foto à autora, a qual entendeu que o modelo era diferente do pretendido e requereu o cancelamento do negócio. Como a requerida não aceitou o distrato, a autora ajuizou ação para pedir a restituição do valor pago e da quantia despendida a mais com o aluguel de um novo vestido, além de reparação por danos morais. O sentenciante julgou parcialmente procedente o pedido e decretou a rescisão do contrato – com base no direito de arrependimento de sete dias – condenando a requerida à devolução do valor pago pela peça. Ao analisar o recurso interposto pela autora, a Turma afastou a pretensão de ressarcimento pela diferença dos valores dos aluguéis do vestido contratado com a recorrida e da peça efetivamente utilizada pela filha na festa, ao não vislumbrar o nexo causal entre a conduta atribuída à ré – confeccionar vestido diverso do modelo pretendido – e a contratação pela apelante de aluguel de modelo mais caro após a desistência do negócio anterior. Explicou que, para a teoria da causalidade adequada, o nexo causal só se configura se o dano for decorrência direta e imediata da conduta atribuída à fornecedora, o que não ocorreu na espécie. Em relação ao dano moral, esclareceu que o simples descumprimento contratual não viola direitos da personalidade e que os diálogos mantidos pelas partes, ainda que carregados de acidez, ocorreram no contexto de discussão e de divergência, sem intenção ofensiva. Assim, o Colegiado negou provimento ao recurso.

Acórdão 1209633, 07023003720198070007, Relatora Juíza SONÍRIA ROCHA CAMPOS D'ASSUNÇÃO, 1ª Turma Recursal dos Juizados Cíveis e Criminais do Distrito Federal, data de julgamento: 17/10/2019, publicado no DJe: 6/11/2019.

Direito Empresarial

Trespasse realizado por empresa franqueada – anuência tácita da franqueadora – inexistência de sucessão empresarial

Os débitos decorrentes de contrato de franquia relacionados a período posterior a trespasse que contou com a anuência tácita da franqueadora devem ser exigidos por esta diretamente da trespassária. Uma franqueadora do ramo alimentício propôs ação de cobrança contra microempresa franqueada e seus fiadores por entender devido o pagamento de royalties e de contribuições ao fundo de marketing, em razão do inadimplemento de obrigações decorrentes de contrato de franquia. Em primeira instância, o pedido foi julgado parcialmente procedente para condenar os réus a pagarem o valor da taxa de publicidade, parcela mínima do quantum pretendido na inicial. A requerente interpôs apelação, por meio da qual alegou existirem débitos a serem pagos pela franqueada, advindos de trespasse firmado com outra pessoa jurídica. Ao apreciarem o recurso, os Desembargadores consignaram que a franqueadora não se opôs aos termos da negociação de trespasse ocorrido entre a franqueada e a terceira adquirente (adotou “comportamento de tolerância”), embora, de início, o contrato de franquia tenha sido assinado intuitu personae. Esclareceram que a continuidade do uso exclusivo dos produtos de franchising pela empresa adquirente e a ida da franqueadora in loco para se certificar da observância do padrão da marca confirmaram a validade do contrato verbal tácito entre elas. Por isso, os Julgadores entenderam que os débitos referentes ao período em que a terceira adquirente administrou a empresa deveriam ser dela exigidos diretamente, ainda que a franqueada originária tenha retomado o estabelecimento comercial posteriormente, por não haver indícios de que as dívidas tenham sido regularmente contabilizadas, requisito exigido pelo artigo 1.146 do Código Civil para a sucessão empresarial, a qual implica a transferência da responsabilidade pelos débitos. Com isso, o Colegiado manteve a sentença.

Acórdão 1213403, 07024567720188070001, Relatora Desª. GISLENE PINHEIRO, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 30/10/2019, publicado no DJe: 12/11/2019.

Direito Penal e Processual Penal

Convencimento da vítima a repassar dinheiro a pretexto de abrir empresa para contratar com órgão público – obtenção de vantagem indevida mediante ardil

A obtenção de vantagem ilícita mediante o convencimento da vítima a abrir uma empresa para firmar suposto contrato com órgão público sobre o qual a ré exerceria influência configura o crime de estelionato. Na origem, a ré convenceu a vítima a efetuar diversos depósitos em contas bancárias indicadas por ela, sob o pretexto de abrir uma empresa de aluguel de carros para contratar com órgão público sobre o qual supostamente exerceria influência. Foi condenada pelo crime de estelionato (artigo 171, caput, do Código Penal) e apelou. Ao analisarem o recurso, os Desembargadores esclareceram que a ré admitiu, na fase inquisitorial, ter recebido os depósitos da ofendida, embora tenha afirmado, em juízo, que os devolvera à vítima, sem apresentar, todavia, qualquer comprovação. Assim, entenderam caracterizado o crime de estelionato, que se consuma com a simples obtenção da vantagem ilícita, mediante ardil. Os Julgadores asseveraram que o engodo consistiu em ganhar a confiança da ofendida, porque a requerida fingia ser advogada com bons contatos em um órgão público, os quais facilitariam a assinatura de contrato de licitação para prestação do serviço de aluguel de carros. Por fim, a Turma concluiu que a recorrente utilizou meio fraudulento para obter vantagem aproximada de 380 mil reais. Com isso, negou provimento ao recurso.

Acórdão 1213714, 20120110022329APR, Relator Des. DEMETRIUS GOMES CAVALCANTI, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 7/11/2019, publicado no DJe: 13/11/2019.

Dissimulação de gênero em namoro virtual – perfil falso em rede social – violação sexual mediante fraude

A farsa mantida por pessoa do sexo feminino, que se passa por homem para manter relação sexual virtual com outra mulher, durante anos, configura o crime de violação sexual mediante fraude, ainda que não exista contato físico entre as partes. O Ministério Público ofereceu denúncia contra uma mulher que se passou por homem e manteve em rede social um perfil falso usado para relacionamento com outra mulher, durante mais de cinco anos. O Juízo de primeiro grau condenou a ré pelos crimes de constrangimento ilegal e de violação sexual mediante fraude, em contexto de violência doméstica (artigos 146 e 215, ambos do Código Penal, e artigo 5º, III, da Lei 11.340/2006). Ao examinar a apelação interposta pela acusada, os Desembargadores afastaram a preliminar de incompetência do juizado especial de violência doméstica contra a mulher, pois entenderam que as particularidades do caso concreto envolvem violência de gênero, em razão da vulnerabilidade da vítima, que se submeteu, por longo período, a situação de hierarquia e de subjugação por pessoa que imaginou ser do sexo masculino. Para o Colegiado, o emprego das diversas fraudes praticadas pela ré – como o uso falso de perfil masculino em site de relacionamento, o envio de fotos falsas para identificação pessoal, o fato de não se mostrar em chamadas de vídeo, além da alteração da voz, em ligações telefônicas, a fim de conferir maior credibilidade à farsa – foi o suficiente para enganar a vítima, que se envolveu emocionalmente e acreditou se relacionar com pessoa do sexo oposto. Os Julgadores esclareceram que, para a configuração do delito de violação sexual mediante fraude, não é necessário o contato físico presencial, de modo que as transmissões em tempo real da vítima nua foram suficientes para configurar a prática de ato libidinoso capaz de satisfazer a lascívia da acusada. Nesse contexto, salientaram que, ao tentar romper o relacionamento, a ofendida sofreu constrangimento ilegal em razão da grave ameaça de ter seus vídeos íntimos divulgados, de forma a sentir-se amedrontada com a promessa de mal injusto e grave direcionado a ela e a sua família, o que a forçou a prosseguir com o romance virtual por anos. Em conclusão, a Turma deu parcial provimento ao recurso para manter a condenação e reduzir a pena aplicada, por considerar que os crimes foram cometidos quando a apelante era menor de vinte e um anos, circunstância não considerada pelo juízo sentenciante. 

Acórdão 1212701, 20150610011433APR, Relator Des. JESUINO RISSATO, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 31/10/2019, publicado no DJe: 6/11/2019.

Direito Tributário

Diferencial de alíquota de ICMS – repartição de receitas – inexigência de lei complementar específica

A obrigação de pagar o diferencial de alíquota de ICMS independe da edição de lei complementar específica, por se tratar de mera regra de repartição da receita tributária. Duas empresas vendedoras de mercadorias impetraram mandado de segurança contra ato do Subsecretário da Receita do Distrito Federal para o reconhecimento da inexigibilidade do pagamento do diferencial de alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – DIFAL/ICMS. O Juízo ordinário denegou a segurança. As impetrantes interpuseram apelação. Ao analisarem o recurso, os Desembargadores esclareceram que o DIFAL consiste na diferença entre as alíquotas interna, do estado destinatário, e interestadual, do estado remetente, gerada sobre as operações de compra e venda de produtos por consumidores finais domiciliados no DF e que não sejam contribuintes do ICMS. Acrescentaram que o recolhimento diferencial de alíquota envolve apenas regra de repartição de receita oriunda do próprio ICMS, e, para tal hipótese, a edição de lei complementar específica é desnecessária, pois a referida espécie normativa é exigida apenas para a definição do fato gerador, da base de cálculo e do sujeito passivo – elementos essenciais do tributo. Os Julgadores ressaltaram que o recolhimento de DIFAL busca eliminar as graves distorções nacionais referentes à partilha do imposto e ao desequilíbrio na arrecadação tributária entre os entes federativos. Concluíram que as empresas não sediadas no DF têm a obrigação de recolher o diferencial, mesmo que a mercadoria seja entregue em outra unidade federativa. Pontuaram que tal sistemática, constante do Convênio ICMS 93 e da Lei Distrital 5.546, ambos de 2015, tem fundamento constitucional, pois, na ausência de normas gerais sobre o tema, o Distrito Federal exerce competência tributária plena (artigo 24, § 3º, da Constituição de 1988). Nesse contexto, a Turma negou provimento ao recurso.

Acórdão 1210445, 07077116220188070018, Relator Des. FÁBIO EDUARDO MARQUES, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 23/10/2019, publicado no DJe: 12/11/2019.

Informativo

1ª Vice-Presidência

Secretária de Jurisprudência e Biblioteca: Sheyla Teixeira Lino

Subsecretário de Doutrina e Jurisprudência: Clélio Lima Santa Cecília Neto

Redação: Ana Paula Gama, Andrea Djanira Santos de Paula, Luana Oliveira Torres Monteiro, Mônica Maria Oliveira Fonseca, Susana Moura Macedo e Tiago de Carvalho Resende Rodrigues 

Colaboradores: Cristiana Costa Freitas, Eliane Torres Goncalves,  Gressiely Marinho Guimaraes, Letícia Vasco Mota, Paulo Gustavo Barbosa Caldas e  Rodrigo Bruno Bezerra Pereira

Conversão do texto em áudio: Alexandre da Silva Lacerda

E-mail:

Este Informativo é produzido pelo Núcleo de Pesquisa e Informativo de Jurisprudência – NUPIJUR

As notas aqui divulgadas foram elaboradas a partir de acórdãos selecionados pelo Núcleo de Pesquisa e Informativo de Jurisprudência da SUDJU e não constituem, portanto, repositório oficial da jurisprudência deste Tribunal.

Acesse também:

CDC na visão do TJDFT

Dano Moral no TJDFT

Decisões em Evidência

Direitos fundamentais na visão do TJDFT

Doutrina na Prática

Entendimentos Divergentes no TJDFT

Inconstitucionalidades

Jurisprudência Administrativa Interna

Jurisprudência em Detalhes

Jurisprudência em Perguntas

Jurisprudência Reiterada

Lei Maria da Penha na visão do TJDFT

Novo Código de Processo Civil e o TJDFT