Informativo de Jurisprudência n. 415

Período: 16 a 31 de maio de 2020

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Publicação: 24 de junho de 2020

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Direito Administrativo

Degustação de “narguilé” – interdição da loja prestadora do serviço – risco à saúde de usuários

A disponibilização de produto fumígeno por comerciante em recinto coletivo, ainda que parcialmente fechado, justifica a adoção imediata de medida sanitária preventiva – interdição do estabelecimento – para cessar a exposição da saúde dos clientes a risco, devido ao consumo de gêneros do tabaco. Uma empresa de produtos de tabacaria interpôs agravo de instrumento contra decisão que, em sede de antecipação de tutela, impediu a comercialização e uso de “narguilé” por consumidores nas imediações do estabelecimento. Alegou que, após a lavratura do auto de interdição pelo fiscal da Vigilância Sanitária do Distrito Federal, perdeu parte considerável da clientela e do faturamento. Ao apreciar as razões recursais, o Colegiado asseverou que a Lei 9.294/1996, regulamentada pelo Decreto 2.018/1996, proíbe o consumo de qualquer produto fumígeno, derivado ou não do tabaco, em recinto coletivo fechado privado ou público, incluídos também os ambientes parcialmente fechados. Na hipótese, os Desembargadores entenderam que a comerciante agiu em desconformidade com a legislação sanitária ao utilizar área externa próxima à loja para oferecer o serviço de “narguilé”, pois o local, que se encontra sob marquises, é considerado recinto coletivo parcialmente fechado. Nesse contexto, os Julgadores concluíram que a presunção de legitimidade do auto de infração justifica a aplicação imediata de medida sanitária como meio de prevenir as pessoas dos malefícios causados pelo uso de “narguilé” em espaços públicos fechados. Com isso, a Turma manteve a decisão agravada.

Acórdão 1248822, 07042896520198079000, Relator Juiz EDILSON ENEDINO DAS CHAGAS, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, data de julgamento: 24/4/2020, publicado no PJe: 22/5/2020.

Paciente com próteses quebradas no corpo – demora para realização de procedimento cirúrgico – dano moral

A excessiva demora do sistema público de saúde para realizar cirurgia de substituição de prótese quebrada dentro do corpo de paciente retira-lhe a efetividade real do direito à saúde, assegurado pela Constituição, e gera dano moral devido pelo Estado. Na origem, um homem requereu indenização por danos morais contra o Distrito Federal devido à demora excessiva para a realização de cirurgia corretiva na região da coluna, após o rompimento de próteses colocadas em procedimento anterior de emergência, ocorrido em hospital público. Narrou que a espera de mais de dois anos com o material quebrado dentro do corpo provocou-lhe sofrimento, dor e limitações físicas. A pretensão foi julgada parcialmente procedente em sentença contra a qual ambas as partes apelaram: o autor pediu o aumento do valor da condenação por danos morais, fixado em R$ 2 mil; e o DF pugnou pela total improcedência do pleito inicial. Ao examinar os recursos, a Turma explicou tratar-se de responsabilidade civil objetiva do Estado, por risco administrativo na prestação do serviço médico-hospitalar, fundada em ato comissivo relativo a suposto erro médico (artigo 37, § 6º, da Constituição Federal). Esclareceu, contudo, inexistirem provas de que o material utilizado na primeira intervenção teria sido de má qualidade e, por isso, tenha motivado a ruptura. Por outro lado, os Desembargadores consideraram que a demora na realização do segundo procedimento não foi razoável, ainda que no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Afirmaram que um retardo tão grande retira a efetividade real do direito à saúde, assegurado pela Carta Magna, pois priva os necessitados de tratamento adequado e eficaz, com garantia de maior dignidade e menos sofrimento. Nesse contexto, asseveraram que o dano moral na espécie é evidente, haja vista os transtornos experimentados pelo apelante – longa espera para a retirada de hastes fraturadas, agravo significativo na angulação da coluna, dificuldade para executar movimentos simples, além das dores que o acompanharam durante todo o tempo – ultrapassarem o mero dissabor. Mantiveram, portanto, a condenação nesse particular, sem alteração do quantum fixado em primeira instância, por considerá-lo razoável e proporcional. Com tais fundamentos, o Colegiado negou provimento aos recursos.

Acórdão 1247956, 07040126320188070018, Relator Des. ALFEU MACHADO, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 6/5/2020, publicado no DJe: 20/5/2020.

Direito Civil e Processual Civil

Contrato eletrônico – suficiência da certificação digital como garantia da validade do negócio jurídico – título executivo extrajudicial

O contrato eletrônico certificado por meio de assinatura digital verificada por autoridade certificadora legalmente constituída possui força de título executivo extrajudicial, independentemente da assinatura de duas testemunhas, uma vez que a certificação digital garante a autenticidade e a validade do documento. O Juízo de primeiro grau, nos autos de ação de execução por quantia certa, extinguiu o processo sem resolução de mérito sob o fundamento de que os contratos de mútuo celebrados por meio da internet não possuem força executiva. Em sede de apelação, o Colegiado consignou que a exigência de assinatura de duas testemunhas em documento particular como requisito extrínseco à formação do título executivo (artigo 784, III, do Código de Processo Civil) tem por objetivo aferir a existência e a validade do negócio jurídico. Assim, se o documento se fundar em obrigação líquida, certa e exigível e a autenticidade e higidez puderem ser demonstradas por meios diversos do testemunhal, excepcionalmente poderá ser considerado título apto a embasar pretensão executiva. Na hipótese, os Desembargadores entenderam que a assinatura digital confere autenticidade e integridade ao contrato eletrônico de mútuo firmado pelas partes, uma vez que é chancelada por autoridade certificadora legalmente constituída. Segundo os Julgadores, a anuência eletrônica do contratante devidamente certificada equipara-se à assinatura de próprio punho como prova de autoria de um documento. Nesse sentido, a Turma reconheceu que os documentos particulares objetos do processo executivo, embora não contenham a assinatura de duas testemunhas, podem constituir títulos executivos extrajudiciais, motivo pelo qual foi cassada a sentença e determinado o retorno dos autos ao Juízo de origem para o regular processamento da execução.

Acórdão 1248057, 07107693320198070020, Relator Des. ESDRAS NEVES, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 6/5/2020, publicado no DJe: 20/5/2020.

Monitória amparada em cheque prescrito – simulação de endosso – ilegitimidade do portador

O endosso de cheque realizado para encobrir prática ilícita e afastar, de forma intencional, a discussão da causa debendi configura negócio jurídico simulado e torna o portador do título parte ilegítima para realizar a cobrança do valor constante da cártula. Na origem, uma empresa de informática ingressou com ação monitória para cobrar diversos cheques emitidos por pessoa física, devolvidos por falta de provisão de fundos. Os títulos foram repassados à autora por uma empresa de cobrança, mediante endosso tardio, após a devolução pela instituição financeira. O Juízo a quo declarou constituído o título executivo judicial em favor da autora, por considerar que o portador desses documentos pode exercer o direito de crédito independentemente das relações que o antecederam, em razão do princípio da abstração, que desvincula o título da relação que lhe deu origem. A devedora interpôs apelação e alegou a origem ilícita do débito, o qual seria oriundo da prática de agiotagem, oportunidade em que sustentou a necessidade de perquirição da causa subjacente à emissão e das ilegalidades vinculadas ao montante perseguido nos cheques. Questionou ainda a forma de transmissão das cártulas, mediante endosso póstumo com efeitos de cessão de crédito, acerca da qual deveria haver notificação à devedora, conforme artigo 290 do Código Civil, o que não ocorreu na espécie. Ao analisarem o recurso, os Desembargadores consignaram que algumas circunstâncias chamaram atenção de plano: a inicial ter sido instruída com procuração outorgada por pessoa jurídica estranha à lide, o endereço de endossante e endossatária ser o mesmo, além de serem representadas por idêntico patrono. Destacaram que, em consulta ao sítio eletrônico do TJDFT, encontraram mais de 140 ações judiciais promovidas pela autora e relacionadas à cobrança de créditos oriundos de cheques ou notas promissórias emitidos em favor da endossante. Os Julgadores ressaltaram que não é razoável que uma empresa de assistência técnica e de manutenção de equipamentos de informática constituída em outubro de 2018 tenha em sua posse centenas de títulos de crédito para executar e todos emitidos em favor de empresa de cobrança. Assim, o Colegiado concluiu que os elementos dos autos evidenciam que a transferência das cártulas com os efeitos da cessão de crédito foi realizada para, de fato, ocultar a discussão da causa debendi, prática que configura negócio jurídico simulado e que, portanto, constitui causa de nulidade (artigo 167, I, do Código Civil). Nesse contexto, a Turma reconheceu a ilegitimidade ativa da portadora dos cheques para ajuizar a demanda de cobrança e deu provimento ao recurso para extinguir o feito, sem resolução do mérito. Como existe suspeita da prática de ilícito penal, o Colegiado determinou o encaminhamento de cópia dos autos ao Ministério Público, para adoção das medidas cabíveis.

Acórdão 1248651, 07173615320198070001, Relator Des. ROBSON TEIXEIRA DE FREITAS, 8ª Turma Cível, data de julgamento: 13/5/2020, publicado no DJe: 25/5/2020.

Direito Constitucional

Doente renal hipossuficiente – tratamento de diálise em casa – responsabilidade do Estado pelo custeio da energia elétrica utilizada – direito à saúde

O Estado possui o dever de custear o consumo de energia elétrica decorrente de tratamento de diálise realizado em casa por doente renal hipossuficiente, como forma de efetivar o direito à saúde constitucionalmente garantido. A autora, portadora de doença renal grave, teve o fornecimento de energia elétrica suspenso e, movida pela necessidade de continuar o tratamento de diálise em casa, propôs ação contra o Distrito Federal e a Companhia Energética de Brasília – CEB a fim de obter o restabelecimento do serviço e o respectivo custeio pelo Poder Público. O Juízo de primeiro grau condenou a CEB a realizar a instalação de rede elétrica e medidor específicos para o aparelho de diálise, e o DF ao custeio da implementação dessa rede autônoma e das despesas de energia elétrica consumida pela aparelhagem do tratamento. Em sede recursal, os Desembargadores asseveraram que a proteção, promoção e recuperação da saúde do indivíduo hipossuficiente constitui dever estatal e deve ser realizado de forma eficaz, organizada, planejada e eficiente, tanto na forma preventiva como na curativa. Desse modo, o Colegiado destacou que o ente da federação – ao qual se impõe o dever constitucional de integral atendimento à saúde (artigo 198, II, da Constituição Federal) – é responsável, inclusive, pelo custeio da energia elétrica necessária à viabilização da terapêutica demandada pela parte. Por fim, a Turma deu parcial provimento ao recurso do ente distrital apenas para desobrigá-lo ao pagamento da instalação de medidor de energia elétrica autônomo para o aparelho de diálise, repassando o ônus dessa providência à CEB, nos termos do pedido inicial.

Acórdão 1247559, 07013985120198070018, Relatora Desª. MARIA IVATÔNIA, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 6/5/2020, publicado no DJe: 29/5/2020.

Direito da Criança e do Adolescente

Saída especial a jovem infrator – suspensão do benefício em razão da pandemia (COVID-19)

A saída especial deferida a jovem infrator pode ser suspensa como medida preventiva à contaminação dos demais internos e servidores do sistema socioeducativo durante o período de pandemia, sem implicar revogação ou cassação da decisão. Por meio de agravo de instrumento, o Ministério Público se insurgiu contra decisão que deferiu pedido de saídas especiais em favor de jovem infratora que cumpre medida de internação pela prática de ato infracional análogo ao crime de homicídio qualificado. Em suas alegações, o órgão ministerial advertiu sobre o prejuízo à finalidade punitiva da medida socioeducativa, haja vista a grave violência do ato – onze facadas na vítima em via pública. Nesse contexto, os Desembargadores consignaram que a concessão do benefício extramuros deve se pautar não somente pela gravidade do ato infracional, mas por todo o histórico de evolução da adolescente durante o cumprimento da medida socioeducativa. Asseveraram que, de acordo com os relatórios apresentados, a jovem não possui registros infracionais, alcançou as metas estabelecidas no Plano Individual de Atendimento – PIA e possui suporte familiar constante. O Colegiado entendeu que, em razão do atual contexto de pandemia (COVID-19), é razoável a suspensão das saídas especiais determinada pelo Juízo da Vara de Execuções Penais como forma de prevenir o contágio e a propagação do coronavírus entre os internos e servidores que atuam no sistema de justiça socioeducativo e penal. Segundo os Julgadores, a medida não significa reforma ou cassação da decisão que reconheceu o direito às saídas temporárias, pois o benefício poderá ser usufruído pela infratora uma vez cessada a situação transitória de pandemia sem ocorrências disciplinares. Assim, a Turma negou provimento ao recurso.

Acórdão 1249248, 07055471320208070000, Relator Des. SILVANIO BARBOSA DOS SANTOS, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 14/5/2020, publicado no PJe: 25/5/2020.

Direito do Consumidor

Atraso na entrega de imóvel – culpa exclusiva da construtora – multa moratória e devolução integral do valor pago

A demora excessiva para a entrega de imóvel por culpa exclusiva da construtora gera a devolução integral do valor desembolsado pelo consumidor e o pagamento da multa moratória, pois eventos previsíveis e circunstâncias inerentes à atividade empresarial não são aptos a afastar a responsabilidade objetiva do fornecedor. Na origem, promitentes-compradores pediram em Juízo a rescisão do contrato de compra e venda firmado com uma construtora, em decorrência de atraso na entrega de dois imóveis, e a reparação de danos resultantes da mora. Declararam que a empreiteira não apresentou justificativa plausível para não adimplir a obrigação no prazo de vigência do ajuste. Na sentença, o Juízo a quo rescindiu o pacto e condenou a empresa à devolução parcial das quantias retidas e ao pagamento de lucros cessantes e da multa moratória. Ao analisarem as apelações interpostas por ambas as partes, os Desembargadores entenderam que ficou configurada a responsabilidade civil objetiva da fornecedora, pois presente o nexo causal entre a não entrega do imóvel na data aprazada, 28/2/2013, e o prejuízo derivado da privação do usufruto econômico do bem pelos adquirentes que, até o ajuizamento do feito (11/10/2013), não haviam recebido as chaves. Consideraram afastadas as causas excludentes do caso fortuito e da força maior, em virtude da previsibilidade dos eventos alegados como justificativa para o retardo, quais sejam, excesso de chuvas, escassez de mão de obra e de material, bem como aumento nas vendas das unidades imobiliárias. Ressaltaram que, ainda que previstas expressamente em contrato e comprovadas, tais circunstâncias constituem o risco inerente à atividade da construção civil desenvolvida pela pessoa jurídica. Nesse contexto, a Turma concluiu que as explicações não foram hábeis a ilidir o inadimplemento contratual, de modo a eximir a culpa exclusiva da empreiteira, porque existente a prorrogação para a entrega e desrespeitado o prazo de tolerância de 180 dias para cobrir eventuais incidentes não programados. Assim, deu parcial provimento aos recursos para autorizar o pagamento da multa moratória e a restituição integral dos valores pagos aos autores, mas suprimir da condenação a parte relativa aos lucros cessantes, em razão da impossibilidade de cumulação dessa parcela com a cláusula penal decorrente do atraso.

Acórdão 124323300062907520138070011, Relatora Desª. ANA MARIA AMARANTE, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 15/4/2020, publicado no DJe: 7/5/2020.

Falha na gestão de serviço de investimento financeiro – comando verbal para aplicação de valores – intermediação por corretora vinculada a banco – responsabilidade solidária entre os fornecedores

A responsabilidade pelas perdas de investidor, decorrentes de falha na prestação do serviço de aplicação em bolsa, é solidária entre o banco e a corretora de valores mobiliários partícipe do mesmo grupo empresarial, porque ambos compõem a cadeia de fornecimento e visam ao lucro. Um consumidor requereu indenização contra estabelecimento bancário e agência de valores mobiliários vinculada àquele para reaver os prejuízos sofridos em decorrência de falha na prestação de serviços de investimento em bolsa. O Juízo a quo julgou os pedidos iniciais parcialmente procedentes. Inconformado, o autor recorreu da sentença ao argumento de que o provimento jurisdicional fora omisso quanto aos valores já liquidados e certos a que entendeu fazer jus, referentes a dividendos e juros de capital; e o banco, por seu turno, alegou sua ilegitimidade passiva. Ao analisarem os recursos, os Desembargadores esclareceram que o direito material estabelecido entre os litigantes tem natureza de relação de consumo e, portanto, se sujeita ao Código de Defesa do Consumidor. Afirmaram que, por integrarem o mesmo grupo econômico, com atuação no mercado financeiro, à luz da teoria da aparência, ambas as entidades possuem legitimidade para figurar no polo passivo. Aduziram que a corretora foi contratada para efetuar investimentos por meio da ferramenta intitulada home broker, a qual admite ordens verbais do cliente para dizer onde e quanto investir, de acordo com as orientações dos agentes financeiros. Ocorre que, em uma das ocasiões, a despeito da autorização verbal do investidor, a empresa deixou em aberto a transação, sem tomar as providências cabíveis, o que gerou um débito de R$ 25.167,43 em nome do autor, ao invés do esperado lucro. Os Julgadores explicaram que o banco, como gestor mediato das operações realizadas no mercado de ações, e a corretora, intermediadora da carteira de valores, são solidariamente responsáveis pelos danos derivados da falha na prestação de serviços ao investidor. Nesse contexto, a Turma confirmou a existência do dano provocado pelo defeito na prestação do serviço, mas asseverou que o quantum relativo ao prejuízo não pode ser aferido de imediato, devendo ser apurado em liquidação de sentença, por arbitramento, devido à complexidade dos cálculos. Assim, por entender necessária a elaboração de prova técnica pericial para apurar o valor da obrigação, negou provimento aos recursos.

Acórdão 1247962, 00295069020168070001, Relator Des. TEÓFILO CAETANO, 1ª Turma Cível, data de julgamento: 6/5/2020, publicado no DJe: 20/5/2020.

Direito Penal e Processual Penal

Destruição de tornozeleira eletrônica – crime de dano simples – não cabimento de analogia “in malam partem”

A conduta de destruir tornozeleira eletrônica utilizada para monitoramento de acusado caracteriza crime de dano simples, e não qualificado, por se tratar de bem de natureza privada pertencente à empresa prestadora de serviço público e ser irrelevante a responsabilidade contratualmente conferida ao ente federado pelos prejuízos decorrentes de aparelhos danificados. O Ministério Público ofereceu denúncia, pela prática de dano qualificado (artigo 163, parágrafo único, III, do Código Penal), contra acusado de destruir, inutilizar e deteriorar a tornozeleira eletrônica que o monitorava. O Juízo sentenciante desclassificou a conduta para tipificá-la como dano simples (artigo 163, caput, do CP) e reconheceu a decadência para o exercício do direito de queixa. Interposta apelação pelo Parquet, os Desembargadores consignaram que o equipamento danificado não pertence ao Distrito Federal, mas à sociedade empresária contratada pelo ente público para prestação do serviço de “monitoramento e rastreamento eletrônico de pessoas vinculadas a procedimentos judiciais”. Asseveraram que a legislação penal brasileira não admite analogia in malam partem, razão pela qual não se pode ampliar o conceito de patrimônio público – elementar do tipo penal qualificado – a fim de alcançar bem de propriedade de empresa privada prestadora de serviço público. Ressaltaram que a responsabilidade do DF pelos prejuízos decorrentes de aparelhos danificados, prevista contratualmente, não é suficiente para enquadrar a conduta como dano qualificado. Por fim, entenderam que, como o crime de dano simples é processado por meio de ação penal privada e já transcorreram mais de seis meses desde a data do fato sem que a proprietária dos dispositivos tenha oferecido queixa-crime, a punibilidade do réu está extinta. Com isso, a Turma negou provimento ao recurso.

Acórdão 1249379, 00019138820188070010, Relator Des. CRUZ MACEDO, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 14/5/2020, publicado no PJe: 25/5/2020.

Direito Tributário

Fato gerador de ITBI – adstrição ao registro do título aquisitivo do imóvel – complementação de alíquota

O adquirente de imóvel que recolhe ITBI a menor com base em título aquisitivo ainda não registrado deve adequar-se à alíquota fixada em lei à data do registro do bem e complementar o pagamento, se for o caso, pois somente após o ato registral é que se aperfeiçoa a transmissão da propriedade ou do domínio útil e se tem por constituído o fato gerador do imposto. Uma adquirente de imóvel interpôs recurso contra sentença que julgou improcedente o pedido para que o Distrito Federal deixasse de realizar novas cobranças de Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI relativas a seu terreno. A recorrente invocou direito adquirido à alíquota de 2% sobre o valor da propriedade, recolhida quando da compra do terreno, em 2007. Ao apreciarem o recurso, os Desembargadores explicaram que o ITBI tem como fato gerador a transmissão da propriedade ou do domínio útil de imóveis, por ato entre vivos, mediante registro do título aquisitivo no cartório competente (artigos 35, I, do Código Tributário Nacional e 1.245, caput, do Código Civil). Aduziram também que a Lei Distrital 5.452/2015 majorou a alíquota local do tributo para 3% e que um ato interpretativo dessa norma isentou do pagamento de eventual complementação do percentual apenas os contribuintes que tivessem providenciado a prenotação do registro até o final do exercício de 2015. Assim, os adquirentes que possuíssem apenas a escritura do bem até a referida data deveriam inteirar o valor. Nesse contexto, o Colegiado esclareceu que a autora comprou uma chácara em 2007 e recolheu alíquota de 2% sobre o valor do imóvel, com base na escritura, conforme lei anterior declarada inconstitucional pelo Conselho Especial (Lei Distrital 3.820/2006). Por outro lado, a apelante deixou de colacionar aos autos qualquer comprovação de que tenha levado a efeito o registro do terreno até o final do ano de 2015. Desse modo, os Julgadores entenderam que não houve ilegalidade na cobrança feita pelo DF em 2018, pois, de fato, cabível a integração do percentual. Assim, negaram provimento ao recurso.

Acórdão 124699507296628420198070016, Relator Juiz FABRÍCIO FONTOURA BEZERRA, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, data de julgamento: 24/4/2020, publicado no PJe: 28/5/2020.

Informativo

1ª Vice-Presidência

Desembargadora Primeira Vice-Presidente: Ana Maria Duarte Amarante Brito

Secretária de Jurisprudência e Biblioteca: Camila Lucas Porto

Subsecretária de Doutrina e Jurisprudência: Amanda Lopes de Araújo Soares

Redação: Alessandro Soares Machado, Ana Paula Gama, Andrea Djanira Santos de Paula, Mônica Maria Oliveira Fonseca, Susana Moura Macedo e Tiago de Carvalho Resende Rodrigues

Colaboradores: Letícia Vasco Mota, Maria Celina Fernandes de Souza, Paulo Gustavo Barbosa Caldas e Rodrigo Bruno Bezerra Pereira 

Conversão do texto em áudio: Alexandre da Silva Lacerda

E-mail: jurisprudencia.nupijur@tjdft.jus.br

Este Informativo é produzido pelo Núcleo de Pesquisa e Informativo de Jurisprudência – NUPIJUR

As notas aqui divulgadas foram elaboradas a partir de acórdãos selecionados pelo Núcleo de Pesquisa e Informativo de Jurisprudência da SUDJU e não constituem, portanto, repositório oficial da jurisprudência deste Tribunal.

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Decisões em Evidência

Direitos fundamentais na visão do TJDFT

Doutrina na Prática

Entendimentos Divergentes no TJDFT

Inconstitucionalidades

Jurisprudência Administrativa Interna

Jurisprudência em Detalhes

Jurisprudência em Perguntas

Jurisprudência Reiterada

Lei Maria da Penha na visão do TJDFT

Novo Código de Processo Civil e o TJDFT

Saúde e Justiça