Informativo de Jurisprudência n. 418

Período: 1º a 15 de julho de 2020

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Publicação: 5 de agosto de 2020

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Índice

Direito Administrativo

  • Violência praticada por policial militar em serviço – abuso de poder – dano moral

Direito Ambiental

  • Condomínio “pro indiviso” em área de preservação ambiental – impossibilidade de usucapião

Direito Civil e Processual Civil

  • Ação de alimentos – filho maior e incapaz para o trabalho – genitor idoso com doença grave – excepcionalidade do dever de solidariedade familiar

Direito Constitucional

  • Federação de associações – ilegitimidade para a defesa de indivíduos associados – ausência de previsão legal

Direito do Consumidor 

  • Acidente em razão de cabeamento irregular de telefonia – responsabilidade objetiva da operadora
  • Intoxicação de criança por manuseio de caixa de papelão em supermercado – grave falha na prestação do serviço – dano moral

Direito Empresarial

  • Marca mista – uso de nome idêntico – registro válido e conjugação de elementos distintivos – individualidade empresarial preservada

Direito Penal e Processual Penal

  • Ato obsceno – ausência de exibição do órgão sexual – atipicidade

Direito Penal Militar e Processual Penal Militar

  • Atuação investigativa do Ministério Público – suficiência de elementos probatórios – denúncia de crime militar

Direito Tributário

  • Taxa de Limpeza Pública (TLP) – grandes geradores de resíduos sólidos – tratamento diferenciado – princípios da isonomia material e do poluidor-pagador

Direito Administrativo

Violência praticada por policial militar em serviço – abuso de poder – dano moral

A conduta de policial militar em serviço que utiliza de agressão para intimidar vítima de acidente de trânsito, imobilizada e à espera de atendimento médico, sem oferecer qualquer ameaça, configura abuso de poder e gera ao Estado o dever de indenizá-la por danos morais. Um cidadão ajuizou ação de responsabilidade civil contra o Distrito Federal, sob a alegação de ter sido agredido por policial militar em serviço enquanto aguardava assistência médica em pronto-socorro. O autor sustenta que, após ter sofrido acidente de moto, foi conduzido ao hospital por bombeiros e, ao se queixar da demora para ser atendido, um agente de segurança pública mandou que se calasse e deu três tapas em seu rosto. A defesa argumentou que o policial agiu no exercício do dever legal, o que afastaria eventual ilicitude capaz de justificar a pretensão requerida. O Sentenciante julgou o pedido parcialmente procedente para condenar o DF a pagar ao autor R$ 12 mil a título de danos morais. Ao analisarem a apelação interposta, os Desembargadores explicaram que, por força do artigo 37 da Constituição Federal, o Estado responde objetivamente pelos danos causados por seus agentes, à luz da teoria do risco. Ressaltaram que, de acordo com as imagens dos vídeos anexados aos autos, a vítima chegou ao hospital com o ombro e o braço direito imobilizados e, minutos depois, o policial iniciou as agressões. Os Julgadores acrescentaram que a conduta violenta persistiu mesmo com a intervenção de outro militar, que se colocou entre o agente e a vítima, o que comprova o abuso praticado. Consignaram que a vítima não oferecia ameaça nem apresentava sinais de agressividade que justificassem o emprego da força física. Dessa forma, os Magistrados entenderam que houve tratamento violento e humilhante por parte do agente público que, valendo-se dessa condição, violou direitos inerentes à personalidade do autor aptos a gerar a responsabilidade civil do Estado. Por fim, a Turma reconheceu que o quantum indenizatório fixado pelo Juízo a quo atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, razão pela qual negou provimento ao recurso.

Acórdão 1261247, 07081662720188070018, Relator Des. ROMULO DE ARAUJO MENDES, 1ª Turma Cível, data de julgamento: 1º/7/2020, publicado no DJe: 15/7/2020.

Direito Ambiental

Condomínio “pro indiviso” em área de preservação ambiental – impossibilidade de usucapião

É vedada a usucapião sobre bens públicos, mormente quando se tratar de área de preservação ambiental que constitui condomínio pro indiviso entre o Poder Público e terceiro particular – situação em que não há demarcação do quinhão pertencente a cada um dos condôminos. Na origem, o Juízo a quo julgou procedente pretensão de usucapião sobre área rural ocupada por mais de trinta anos pelos autores, que desenvolviam atividade de suinocultura na gleba de terras pertencente a particular e à Companhia Imobiliária de Brasília – TERRACAP, mediante posse mansa e pacífica, até o advento de proibição legal que afetou a região como Área de Preservação Ambiental – APA e Área de Proteção de Manancial – APM. Em grau de recurso, insurgiram-se a mencionada empresa pública e o Distrito Federal – este como assistente litisconsorcial, sob a alegação de composse do imóvel em condomínio, fato que impossibilitaria o parcelamento do solo rural, sobretudo no interior de APM. Inicialmente, o Colegiado esclareceu que a prescrição aquisitiva de imóvel tem por objeto o reconhecimento de domínio em favor do possuidor, em decorrência de posse justa, mansa, pacífica, ininterrupta, sem oposição e com ânimo de dono, independentemente do tipo de usucapião: ordinário, extraordinário e especial – artigos 1.238 ao 1.242 do Código Civil. Todavia, ressaltou que, a depender da natureza do imóvel, pode o objeto da declaração ser inábil à pretensão usucapiente. Com efeito, ao analisar a matrícula de registro da área sob litígio, verificou a inexistência de descrição ou especialização objetiva capaz de torná-la inconfundível, localizável e mensurável, ou seja, absolutamente única, haja vista a referência à propriedade conjunta da TERRACAP e de terceiro particular, embora em tamanhos desiguais. Nesse sentido, destacou que a parcela de propriedade da empresa pública deu-se sobre coisa indivisa, tomando por objeto meras frações, uma vez que não havia individualização submissa ao princípio da especialização objetiva, de modo a tornar a área absolutamente única. Dessa forma, a Turma reconheceu que as terras estão em estado de condomínio pro indiviso, fato que inviabiliza a distinção da área pública da privada, tornando a gleba inteiramente imune ao fenômeno prescricional (artigo 102 do CC; artigos 183, § 3º, e 191 da Constituição Federal; Súmula 340 do Supremo Tribunal Federal). Além disso, destacou a questão ambiental que inviabiliza a pretensão dos autores, haja vista a qualificação do local como manancial hídrico, circunstância impeditiva da exploração privada por constituir afronta a interesse difuso de maior relevância. Assim, os Desembargadores deram provimento à apelação para julgar improcedente a pretensão de usucapião intentada.

Acórdão 1257190, 00099152120118070001, Relator Des. CARLOS RODRIGUES, 1ª Turma Cível, data de julgamento: 24/6/2020, publicado no DJe: 1º/7/2020.

Direito Civil e Processual Civil

Ação de alimentos – filho maior e incapaz para o trabalho – genitor idoso com doença grave – excepcionalidade do dever de solidariedade familiar

A obrigação de prestar alimentos, fundada nos deveres de solidariedade familiar e de assistência mútua, tem caráter excepcional e só pode ser fixada quando demonstrada a capacidade econômica de quem irá provê-la, especialmente se for pessoa idosa, que goza de especial proteção constitucional. Na origem, o autor propôs ação de alimentos contra o pai, sob a alegação de que, apesar de ter 41 anos de idade, é acometido de graves moléstias que o incapacitam para o trabalho e não possui meios de prover a própria subsistência. O requerido, um senhor de 82 anos de idade, alegou não ter condições de atender o pedido, pois sua renda já está comprometida com medicamentos para controlar o avanço da doença de Parkinson, além de pagar outra pensão alimentícia à filha adolescente, com fundamento no poder familiar. A sentença acolheu a tese da defesa. Ao analisarem a apelação interposta pelo autor, os Desembargadores esclareceram que a obrigação de prestar alimentos, baseada na solidariedade familiar, possui caráter excepcional e depende da condição econômica do alimentante. Destacaram que a hipótese requer a interpretação cautelosa dos artigos 1.694 e 1.695 do Código Civil, com adaptação dos fatos e seus conflitos, especialmente pela condição de idoso do requerido, o qual goza de sistema de proteção constitucional (artigo 230 da Constituição Federal) e legal (Lei 10.471/2003) que deve ser observado. Nesse contexto, os Julgadores explicaram que cabe ao Estado garantir à pessoa idosa proteção à vida e à saúde, nos aspectos moral, social e espiritual, assegurando a ela os meios necessários para permitir um envelhecimento digno e saudável. Asseveraram que, apesar de o quadro clínico do demandante revelar incapacidade laboral, o conjunto probatório demonstra que o requerido não possui condições financeiras para honrar a pretensão autoral sem desfalque do necessário para seu sustento. Com isso, a Turma entendeu não ser razoável impor a obrigação de alimentos em favor do filho maior, sob pena de prejudicar o tratamento de saúde de pessoa senil, notadamente na fase mais frágil da vida, razão pela qual negou provimento ao recurso.

Acórdão 1260563, 07081370520178070020, Relatora Desª. GISLENE PINHEIRO, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 1º/7/2020, publicado no DJe: 13/7/2020.

Direito Constitucional

Federação de associações – ilegitimidade para a defesa de indivíduos associados – ausência de previsão legal

A federação de associações não é parte legítima para atuar na defesa de pessoas associadas, devido à falta de previsão legal expressa nesse sentido, requisito imprescindível para a representação em juízo na qualidade de substituta processual. Uma federação de associações ajuizou ação com o objetivo de reaver diferenças, reflexos e reajustes pertinentes ao cálculo do complemento do plano de aposentadoria privada dos indivíduos filiados. O Sentenciante acolheu a preliminar de ilegitimidade ativa suscitada pela ré e extinguiu o feito sem resolução do mérito. Irresignada, a autora interpôs apelação ao fundamento de que poderia atuar na demanda, na qualidade de substituta processual, sem que isso fosse considerado quebra de hierarquia entre os graus de representação. Ao examinar o recurso, o Colegiado explicou que o instituto da legitimação extraordinária, por ser excepcional e permitir a atuação em juízo em nome próprio na defesa de direitos alheios, deve ser interpretado de maneira restritiva e com obediência às hipóteses expressamente admitidas pelo ordenamento jurídico. Explicaram que o artigo 8º da Constituição Federal confere aos sindicatos a hipótese excepcional de representação em juízo sem a necessidade de autorização de seus filiados, todavia não estende tal prerrogativa às federações de associações, pois estas defendem os interesses das entidades que lhes são associadas, o que não inclui a substituição processual direta das pessoas. Nesse contexto, os Desembargadores acrescentaram que, por força do artigo 18 do Código de Processo Civil, ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando a lei autorizar. Assim, diante da lacuna normativa para albergar a pretensão da apelante, a Turma manteve a extinção do feito, sem resolução do mérito, por ilegitimidade ativa.

Acórdão 1255275, 00259118320168070001, Relatora Desª. NÍDIA CORRÊA LIMA, 8ª Turma Cível, data de julgamento: 17/6/2020, publicado no DJe: 9/7/2020.

Direito do Consumidor 

Acidente em razão de cabeamento irregular de telefonia – responsabilidade objetiva da operadora

As operadoras de telefonia são responsáveis pela devida e necessária manutenção do cabeamento instalado nos postes de iluminação para a prestação do serviço, motivo pelo qual devem indenizar transeunte que se acidenta em razão da altura irregular dos cabos e emaranhado de fios em via pública. A requerente ingressou com pedido de danos morais contra quatro operadoras de telefonia em razão de acidente sofrido em via pública quando, pilotando motocicleta, fora surpreendida por cabo de telefonia baixo e solto, proveniente de emaranhado de fios fixados em poste de iluminação pública, que causou lesões no pescoço da condutora. O Juízo de primeiro grau condenou as operadoras ao pagamento de danos morais, reconhecendo a responsabilidade objetiva das requeridas por defeito do serviço (artigo 6º, III, VI e VIII, c/c artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor). Em grau de recurso, o Magistrado asseverou que não houve a apresentação pelas companhias telefônicas de análise técnica contundente apta a demonstrar que o cabo solto ou a fiação irregular não pertencia a cada uma das empresas recorrentes. Nesse sentido, a Turma considerou insuficiente a mera negativa de propriedade baseada em superficial parecer técnico e fotos do emaranhado de fios e entendeu serem as prestadoras de serviço telefônico responsáveis pela falta de regularidade da manutenção e da altura do mencionado cabeamento. Assim, o Colegiado reconheceu a negligência das operadoras, o nexo causal e as lesões corporais sofridas pela motociclista, e manteve a condenação por danos morais.

Acórdão 1257691, 07183530820198070003, Relator Juiz FERNANDO ANTONIO TAVERNARD LIMA, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, data de julgamento: 23/6/2020, publicado no DJe: 2/7/2020.

Intoxicação de criança por manuseio de caixa de papelão em supermercado – grave falha na prestação do serviço – dano moral

Supermercado atacadista tem o dever de indenizar família por ferimento e intoxicação causada em criança após brincar com embalagens deixadas no corredor do estabelecimento, com fundamento na responsabilidade objetiva do fornecedor por falha na segurança do serviço prestado aos clientes. Na origem, um casal ingressou com pedido de reparação de danos contra um supermercado atacadista porque o filho deles sofreu intoxicação severa por contato com soda cáustica após brincar com uma caixa de papelão colocada à disposição dos clientes para acondicionamento das compras. O pedido foi julgado procedente em primeira instância. Ambas as partes apelaram: os autores pleitearam a elevação do valor da condenação por danos morais, e o réu pediu a improcedência da pretensão, por entender que houve culpa exclusiva dos pais na observação do menino. No exame dos recursos, a Turma assentou que houve falha grave na segurança do serviço prestado, decorrente da ausência de cuidado do estabelecimento com a guarda e a vigilância de produto tóxico. Interpretou que a possibilidade de ainda restarem resíduos nas caixas era “notória”, de forma que os objetos não deveriam ficar em local de livre acesso e ao alcance de crianças. Ponderou que os genitores são, de fato, responsáveis pelo cuidado dos filhos menores (artigos 1.630 e 1.634 do Código Civil), mas que, nas circunstâncias, não poderiam imaginar que os recipientes deixados no chão poderiam colocar em risco a vida de quem os manuseasse. A par disso, o Colegiado aduziu que o dever de vigilância dos autores não afastaria a obrigação do fornecedor de zelar pela segurança em suas instalações. Nesse contexto, alertou que o atacadista não deveria sequer permitir a reutilização desse tipo de embalagem. Por fim, os Desembargadores concluíram pela responsabilidade objetiva do réu pelos danos causados ao menor e aos requerentes, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Assim, deram provimento ao recurso dos autores para elevar o valor da indenização para 30 mil reais em favor da criança e 5 mil reais para cada um dos genitores, e desproveram a apelação do réu.

Acórdão 1260603, 07073967920188070003, Relator Des. LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, 4ª Turma Cível, data de julgamento: 8/7/2020, publicado no DJe: 14/7/2020.

Direito Empresarial

Marca mista – uso de nome idêntico – registro válido e conjugação de elementos distintivos – individualidade empresarial preservada

As pessoas jurídicas titulares de marca mista que possuem registro válido no INPI podem exercer o direito de uso simultâneo do signo com outras sociedades, desde que preservem elementos distintivos inerentes à individualidade empresarial. Uma sociedade do ramo de atacado e de varejo interpôs apelação contra sentença que julgou improcedente pedido para proibição do uso da marca “atacadão” por outra empresa do mesmo segmento. Alegou possuir direito exclusivo ao uso do signo comercial, pois efetuou o depósito no Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI em 1986 e lhe foi concedida garantia de fruição até 2028. Ao analisarem o recurso, os Desembargadores consignaram que o uso da marca industrial é assegurado tanto pela Constituição Federal (artigo 5º) quanto pela lei de regência (artigos 123, 124 e 129 da Lei 9.279/1996) e cabe ao INPI o exame das pretensões e a concessão do direito de uso exclusivo. Salientaram que a marca mista se distingue da forma singular porque envolve a conjugação de nome e símbolo para compor a identidade mesclada, formando um conjunto estético de características distintivas e próprias de cada ente privado. Assim, em razão da mistura que garante a individualidade, é possível que o órgão responsável faça o registro, ainda que o requerimento incorpore nome ou logotipo de outra marca já constante de seus assentamentos. Para o Colegiado, não há impedimento para que a sociedade apelada reproduza, no nome fantasia, o termo “atacadão”, uma vez que também possui registro válido no INPI, e porque sua identidade visual se distingue da utilizada pela autora em cores, símbolos, grafia e expressão linguística. Nesse contexto, acrescentou que tal elemento nominativo já existe, inclusive, em outros registros concedidos pelo órgão, circunstância que confirma a não exclusividade. Desse modo, os Desembargadores entenderam que não houve conduta ilícita praticada pela empresa apelada pois promoveu registro de acordo com a lei e utiliza ícone próprio regularmente. Asseveraram, também, não ter sido comprovada conduta voltada para induzir consumidores ao erro ou confundi-los, nem intenção de gerar prejuízos à imagem publicitária da empresa apelante. Com tais considerações, a Turma negou provimento ao recurso.

Acórdão 1252636, 07306741820188070001, Relator Des. JAMES EDUARDO OLIVEIRA, 4ª Turma Cível, data de julgamento: 3/6/2020, publicado no DJe: 9/7/2020.

Direito Penal e Processual Penal

Ato obsceno – ausência de exibição do órgão sexual – atipicidade

O gesto grosseiro de manipular o órgão genital, por cima da calça, em contexto de discussão no interior de estabelecimento comercial franqueado ao público, embora reprovável e fora dos padrões de comportamento esperados em sociedade, não configura crime de ato obsceno. O Ministério Público ofereceu denúncia pela prática de ato obsceno (artigo 233 do Código Penal) contra um homem que simulou o ato de se masturbar, por cima da calça, durante discussão no interior de um restaurante, na presença de seguranças que trabalhavam no local. A defesa alegou atipicidade da conduta. O Sentenciante acolheu a pretensão ministerial e condenou o réu, por entender que ficou comprovada a intenção de ofender o pudor das pessoas que frequentavam o lugar. Em análise do recurso interposto pelo autor do fato, os Desembargadores explicaram que os bens jurídicos tutelados pelo crime de ato obsceno são a moralidade e o pudor público, sob a ótica sexual, uma vez que o tipo penal se encontra no título que disciplina os crimes contra os costumes. Nesse contexto, destacaram que a conduta descrita na peça acusatória não passou de gesto indecoroso, incapaz de violar o bem jurídico protegido. Para os Magistrados, o movimento de levar a mão ao órgão genital sobre a roupa não tem o poder de afetar o pudor ou a vergonha, pois não é capaz de causar o sentimento de humilhação e de repulsa com base na conduta despudorada. Reforçaram que, muito embora tenha sido prática grosseira e fora dos padrões do bom comportamento social, é certo que o tipo penal em apreço não contempla gestos imorais, que se assemelham a meros xingamentos. Com isso, a Turma reconheceu a atipicidade da conduta e reformou a sentença para absolver o réu.

Acórdão 1257883, 00007233820198070016, Relator Juiz EDILSON ENEDINO DAS CHAGAS, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, data de julgamento: 15/6/2020, publicado no PJe: 2/7/2020.

Direito Penal Militar e Processual Penal Militar

Atuação investigativa do Ministério Público – suficiência de elementos probatórios – denúncia de crime militar

O Ministério Público possui atuação investigativa e pode promover diligências durante a tramitação do inquérito policial que, a depender do resultado alcançado, são aptas a sustentar a inicial acusatória de per si. Eventuais vícios constantes do procedimento não têm aptidão para macular a ação penal, por se tratar de peça meramente informativa. O impetrante de um habeas corpus requereu o trancamento de ação penal militar, por considerar teratológica a decisão que recebeu a denúncia. Argumentou que a peça acusatória se baseou em inquérito cujas provas foram posteriormente consideradas ilícitas e desentranhadas do procedimento por determinação judicial, de modo que não haveria justa causa para a persecução. Ao examinar a pretensão, os Desembargadores esclareceram que o recebimento da exordial não se lastreou exclusivamente na repetição de termos ou descrições de conduta colhidos na fase pré-processual, mas incluiu outros meios de prova igualmente colacionados aos autos. Explicaram que o inquérito é peça meramente informativa, produzida sem a observância do contraditório, e, por isso, eventual nulidade que dele advenha não tem o poder de macular posterior ação penal. Nesse contexto, salientaram que alguns elementos probatórios colacionados resultaram da atuação investigativa do Ministério Público, a qual faz parte das funções institucionais do Parquet, e que, a depender do resultado das diligências, pode ser o suficiente para sustentar a inicial acusatória. Acrescentaram que o trancamento da ação penal só pode ocorrer nos casos excepcionais em que se constatar a ausência de materialidade ou autoria, ficar evidenciada a atipicidade da conduta, ou sobrevier causa extintiva de punibilidade. Por fim, a Turma concluiu que a denúncia preencheu os requisitos legais, inexistindo constrangimento ilegal à liberdade do paciente, razão pela qual denegou a ordem.

Acórdão 1261657, 07161660220208070000, Relator Des. ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 9/7/2020, publicado no DJe: 14/7/2020.

Direito Tributário

Taxa de Limpeza Pública (TLP) – grandes geradores de resíduos sólidos – tratamento diferenciado – princípios da isonomia material e do poluidor-pagador

O gerenciamento privado de resíduos sólidos pelos grandes poluidores não os isenta da obrigação de pagar a TLP pois, além de ser um encargo compulsório, o cenário atual exige compromisso ainda maior com a destinação adequada do lixo produzido por agentes que causem danos mais relevantes ao meio ambiente. Na origem, o condomínio de um shopping center requereu a declaração de inexistência de relação jurídico-tributária com o Distrito Federal para obstar a cobrança da taxa de limpeza pública, ao argumento de promover, sozinho, o gerenciamento adequado do refugo que produz; além de pleitear a repetição do indébito. O Juízo sentenciante julgou procedentes os pedidos e declarou a ilegalidade da cobrança. A sentença foi submetida a reexame necessário, e o Distrito Federal interpôs apelação. Na análise da remessa e do recurso, os Desembargadores consignaram que a espécie tributária em questão tem natureza de taxa e que o fato gerador corresponde a uma atividade estatal específica e divisível, de caráter compulsório, por ocasião da utilização efetiva ou potencial do serviço. A TLP, in casu, abrange tanto a retirada periódica do lixo quanto a destinação sanitária dos detritos coletados. Destacaram que, ao contrário do que argumentou o apelante, a Lei Distrital 5.610/2016 não conferiu dispensa do recolhimento tributário, mas atribuiu aos grandes poluidores apenas o gerenciamento dos resíduos não recicláveis. Desse modo, o serviço público continuou responsável pelos rejeitos perigosos, inertes (que não sofrem modificação com o tempo), industriais, oriundos da saúde, provenientes de demolição; além dos recicláveis, cujo material coletado é encaminhado a cooperativas ou associações de catadores. Acrescentaram que a exação integral da referida taxa já se justificaria pelo elemento da compulsoriedade, mas se impõe de forma mais veemente pelo cenário legislativo atual, que exige deveres e sujeições mais amplos dos grandes geradores de resíduos sólidos, sobre quem também recai o ônus da maior retribuição social (Lei Federal 12.305/2010). Nesse contexto, o Colegiado entendeu que não houve esvaziamento do fato gerador do tributo, o que legitima a cobrança do Fisco. Pontuou, também, que o panorama mundial requer a adequação dos países quanto à destinação ambientalmente correta do lixo, mediante tratamento normativo mais rigoroso aos grandes agentes poluidores, como forma de concretização dos princípios da isonomia, em seu aspecto material, e do poluidor-pagador. Com isso, a Turma deu provimento à remessa e ao recurso para julgar improcedente a pretensão autoral.

Acórdão 1257174, 07049981720188070018, Relator Des. ANGELO PASSARELI, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 24/6/2020, publicado no DJe: 1º/7/2020.

Informativo

1ª Vice-Presidência

Desembargadora Primeira Vice-Presidente: Ana Maria Duarte Amarante Brito

Secretária de Jurisprudência e Biblioteca: Camila Lucas Porto

Subsecretária de Doutrina e Jurisprudência: Amanda Lopes de Araújo Soares

Redação: Alessandro Soares Machado, Ana Paula Gama, Andrea Djanira Santos de Paula, Mônica Maria Oliveira Fonseca, Susana Moura Macedo e Tiago de Carvalho Resende Rodrigues

Colaboradores: Eliane Torres Gonçalves, Letícia Vasco Mota, Paulo Gustavo Barbosa Caldas, Risoneis Alvares Barros Rodrigo Bruno Bezerra Pereira 

Conversão do texto em áudio: Alexandre da Silva Lacerda

E-mail: jurisprudencia.nupijur@tjdft.jus.br

Este Informativo é produzido pelo Núcleo de Pesquisa e Informativo de Jurisprudência – NUPIJUR

As notas aqui divulgadas foram elaboradas a partir de acórdãos selecionados pelo Núcleo de Pesquisa e Informativo de Jurisprudência da SUDJU e não constituem, portanto, repositório oficial da jurisprudência deste Tribunal.

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Direitos fundamentais na visão do TJDFT

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Entendimentos Divergentes no TJDFT

Inconstitucionalidades

Jurisprudência Administrativa Interna

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