Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios

Informativo de Jurisprudência n. 507

Período: 16 a 31 de julho de 2024

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Publicação: 14 de agosto de 2024

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Destaques desta edição

Direito Administrativo 

  • Alienação de veículo automotor – responsabilidade solidária por débitos – Tema 1118 do STJ

    Cabe ao novo proprietário tomar as providências para a emissão do Certificado de Registro de Veículo – CRV. Todavia, expirado o prazo legal, compete ao antigo dono encaminhar cópia do comprovante de transferência de propriedade do automóvel ao órgão de trânsito, sob pena de ser responsabilizado solidariamente pelas penalidades impostas. Leia mais...

Direito Civil e Processual Civil

  • Desconsideração da personalidade jurídica – imprescindibilidade de fundamentação concreta 

    O incidente de desconsideração da personalidade jurídica requer a demonstração de fatos que atestem a prática de conduta dolosa de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial, de modo que a mera ausência de localização de bens do devedor para satisfazer a execução não é suficiente para deferimento do pedido. Leia mais...

Direito da Criança e do Adolescente  

  • Envio de mensagens eletrônicas e fotos para criança – intuito libidinoso – delito previsto no ECA 

    A conduta de enviar mensagens e imagens impróprias para menor por meio de aplicativo de celular, com evidente intuito lascivo, configura o crime de aliciar, assediar, instigar ou constranger criança para prática de ato libidinoso, tipificado no Estatuto da Criança e do Adolescente. Leia mais...

Direito do Consumidor

  • Compra de apartamento na planta – previsão de vaga de garagem privativa descumprida – dano material 

    A venda de imóvel na planta com previsão de vaga de garagem cria legítima expectativa no consumidor de que esta é privativa, de modo que, sendo o empreendimento entregue com vagas rotativas e em quantidade insuficiente para o total de apartamentos, cabível indenização ao adquirente por danos materiais equivalente à metragem faltante. Leia mais...

  • Revisão contratual – tarifas bancárias – Temas 952 e 958 do STJ – abusividade não demonstrada  

    As cobranças bancárias simultâneas de tarifas de cadastro e de avaliação de bem dado em garantia, de juros no valor médio de mercado e de seguro prestamista não configuram prática abusiva da instituição financeira, desde que ajustadas previamente e inexistente onerosidade excessiva. Leia mais...

Direito Empresarial 

  • Cessão de cotas societárias – responsabilidade do sócio retirante por até dois anos contados da averbação da resolução da empresa

    A questão da legitimidade passiva de pessoa jurídica é apreciada à luz da teoria da asserção, conforme alegações constantes da petição inicial. A par disso, o sócio retirante continua responsável pelas obrigações sociais até dois anos após a averbação da resolução empresarial, ressalvado direito de regresso previsto em contrato. Leia mais...

Direito Penal e Processual Penal

  • Descumprimento de medida protetiva de urgência – anuência da vítima 

    Nos casos de deferimento de medida protetiva no contexto de violência doméstica, ainda que ocorra a anuência da vítima, a aproximação do ofensor caracteriza o crime de descumprimento da medida de urgência. Na mesma circunstância, xingamentos preconceituosos contra o novo companheiro da vítima, em razão da cor da pele e da religião, extrapolam o cenário de meras ofensas recíprocas, fato suficiente para configurar a injúria qualificada. Leia mais...

  • Direção perigosa na condução de motocicleta – desnecessidade de radar para comprovação da velocidade incompatível com a segurança  

    Incorre no crime de direção perigosa o condutor de motocicleta que empreende fuga em alta velocidade na contramão de via de grande movimentação de pessoas, colocando em risco a incolumidade de pedestres e outros motoristas. Dessa forma, revela-se desnecessária a existência de radar para comprovar a alta velocidade, uma vez uníssonos os depoimentos de policiais que atuaram na abordagem e perseguição do motociclista. Leia mais...

Direito Previdenciário

  • Pensão por morte – necessidade de prova especializada acerca da invalidez permanente para o trabalho 

    Filho inválido de ex-servidor público falecido é presumidamente considerado dependente econômico para fins de recebimento de benefício previdenciário. Contudo, para a concessão de pensão por morte do segurado, necessária a comprovação, por profissional especializado, da condição de invalidez permanente para o trabalho, sob pena de indeferimento do benefício. Leia mais...

Direito Tributário 

  • Arrendamento mercantil – responsabilidade solidária por tributo – baixa de gravame não realizada  

    A companhia de arrendamento mercantil, na qualidade de proprietária e possuidora indireta, responde solidariamente com o arrendatário pelo pagamento do imposto sobre a propriedade de veículos automotores, até que o gravame seja baixado no órgão executivo de trânsito. Leia mais...

Direito Administrativo

Alienação de veículo automotor – responsabilidade solidária por débitos – Tema 1118 do STJ

Cabe ao novo proprietário tomar as providências para a emissão do Certificado de Registro de Veículo – CRV. Todavia, expirado o prazo legal, compete ao antigo dono encaminhar cópia do comprovante de transferência de propriedade do automóvel ao órgão de trânsito, sob pena de ser responsabilizado solidariamente pelas penalidades impostas. Na origem, vendedor de veículo automotor ajuizou ação de obrigação de fazer contra o Departamento de Trânsito do Distrito Federal e o terceiro adquirente, com intuito de transferir o referido bem, as multas de trânsito e o imposto devido. Deferida a tutela de urgência, o juízo singular rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pelo Detran/DF e julgou procedente o pedido inicial para condenar o segundo requerido a transferir o automóvel, multas, pontuações administrativas e o débito de licenciamento. Determinou ainda que o órgão de trânsito transfira todas as penalidades financeiras e administrativas para o adquirente. Na análise do recurso inominado interposto pela autarquia, os magistrados inicialmente a consideraram parte ilegítima para responder pela transferência das infrações expedidas por outros órgãos emissores. Além disso, afastaram a alegação de prescrição, uma vez que não constataram débitos anteriores aos cinco anos do ajuizamento da ação, de modo a impedir a transferência das infrações ao condutor de fato, após o decurso do quinquênio. Em relação ao mérito, os julgadores constataram que o autor recorrido alienou o veículo ao segundo réu, mas não realizou a comunicação de venda ao Detran no prazo legal de sessenta dias. Nesse contexto, reconheceram a responsabilidade solidária dos negociantes para quitação de débitos tributários e não tributários vinculados ao veículo após a entrega e a data de transferência de propriedade ou de comunicação de venda ao órgão de trânsito, nos termos do art. 134 do Código de Trânsito Brasileiro; do art. 1º, § 8º, da Lei 7.431/1985; e do Tema 1118 do STJ. Por outro lado, entenderam que as infrações cometidas após a tradição do bem devem ser atribuídas ao adquirente do carro.  Desse modo, destacaram que, uma vez quitada a dívida, o autor poderá requerer o crédito e ajuizar ação para obter o devido ressarcimento. Em acréscimo, ordenaram a expedição de ofício ao Detran/DF para que providencie apenas a transferência das pontuações das infrações cometidas após a tradição do bem para o prontuário do adquirente do automóvel, em atenção ao disposto no art. 257, § 3º, do CTB. Com isso, o colegiado deu parcial provimento ao recurso. 

Acórdão 1890044, 07417612320188070016, Relator: Juiz LUIS EDUARDO YATSUDA ARIMA, Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, data de julgamento: 12/7/2024, publicado no DJe: 26/7/2024.

Direito Civil e Processual Civil

Desconsideração da personalidade jurídica – imprescindibilidade de fundamentação concreta

O incidente de desconsideração da personalidade jurídica requer a demonstração de fatos que atestem a prática de conduta dolosa de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial, de modo que a mera ausência de localização de bens do devedor para satisfazer a execução não é suficiente para deferimento do pedido. Empresa de representação comercial requereu a desconsideração da personalidade jurídica de sociedade do ramo atacadista, sob alegação de que teriam sido esgotadas as possibilidades de localização de bens para satisfação de crédito em execução. O juízo de primeira instância indeferiu o pedido. Ao analisar o recurso contra a decisão, os desembargadores explicaram que a autonomia patrimonial da sociedade constitui instrumento para separar os riscos derivados da atividade comercial e o patrimônio particular dos sócios, como forma de estimular a geração de empregos, rendas e inovação, além da arrecadação de tributos para benefício da sociedade (art. 49-A do Código Civil). Segundo os magistrados, a desconsideração é medida excepcional, voltada para afastar a proteção conferida à empresa, com a finalidade de atingir os bens privados dos sócios. Nesse contexto, aduziram ser necessária a comprovação da existência de confusão patrimonial – definida como a falta de separação entre o patrimônio societário e o do particular – ou o desvio de finalidade, com a utilização dolosa da empresa para lesar credores ou praticar atos ilícitos, à luz da teoria maior da desconsideração (art. 50, §§ 1º e 2º do CC). Assim, o colegiado aduziu que a mera ausência de pagamento espontâneo, de localização de bens ou de qualquer outro entrave para o recebimento de créditos, sem a comprovação concreta dos fatos que demonstrem os requisitos legais, não justifica o deferimento do pedido. Por fim, negou-se provimento ao recurso. 

Acórdão 1865632, 07305437020238070000, Relator: Des. JAMES EDUARDO OLIVEIRA, Quarta Turma Cível, data de julgamento: 16/5/2024, publicado no DJe: 17/7/2024. 

Direito da Criança e do Adolescente

Envio de mensagens eletrônicas e fotos para criança – intuito libidinoso – delito previsto no ECA

A conduta de enviar mensagens e imagens impróprias para menor por meio de aplicativo de celular, com evidente intuito lascivo, configura o crime de aliciar, assediar, instigar ou constranger criança para prática de ato libidinoso, tipificado no Estatuto da Criança e do Adolescente. O Ministério Público denunciou homem pelo delito previsto no art. 241-D da Lei 8.069/1990 – ECA, em razão de ter assediado e constrangido criança de onze anos, por meio de aplicativo de mensagem, a praticar ato libidinoso. Alegou que o denunciado obteve o número de telefone da vítima por meio da lista de contatos da ex-companheira, tia da menor. O sentenciante absolveu o réu, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, decisão contra a qual o órgão ministerial interpôs apelação. Na análise do recurso, os desembargadores consignaram que a materialidade e autoria dos fatos relatados na peça inicial foram confirmados tanto na fase de inquérito quanto em juízo. Acrescentaram que a vítima fora ouvida em duas oportunidades, tendo sido firme e coerente nas declarações quanto ao recebimento de mensagens e fotos do réu mostrando a virilha, deitado em uma cama e no banheiro. O colegiado destacou que a versão apresentada pela defesa – envio de mensagens para conversar sobre suposto abuso sexual pelo padrasto – não é verossímil, pois, de acordo com as provas, em momento algum o denunciado indagou a menina sobre a prática delituosa que esta estaria sofrendo no âmbito familiar. Além disso, aduziu que, em crimes contra a dignidade sexual, o relato da vítima detém especial credibilidade. Ressaltou ainda a forma sorrateira pela qual o réu teve acesso ao contato telefônico da menor, bem como a tentativa de suborno da vítima para evitar que os fatos chegassem ao conhecimento da mãe. Nesse cenário, os julgadores entenderam que, ao encaminhar fotos impróprias e destacar a beleza da garota, o réu agiu com claro intento de assediá-la para fins libidinosos. Assim, a turma deu provimento ao recurso ministerial para julgar procedente a pretensão punitiva pela prática do delito tipificado no art. 241-D do ECA 

Acórdão 1890633, 07042590620208070008, Relator: Des. ESDRAS NEVES, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 11/7/2024, publicado no PJe: 19/7/2024.

Direito do Consumidor

Compra de apartamento na planta – previsão de vaga de garagem privativa descumprida – dano material

A venda de imóvel na planta com previsão de vaga de garagem cria legítima expectativa no consumidor de que esta é privativa, de modo que, sendo o empreendimento entregue com vagas rotativas e em quantidade insuficiente para o total de apartamentos, cabível indenização ao adquirente por danos materiais equivalente à metragem faltante. Consumidora ajuizou ação pleiteando indenização por danos morais e materiais contra empresa do ramo imobiliário e construtora de empreendimento, sob a alegação de ter recebido o apartamento adquirido na planta sem a vaga de garagem privativa prevista no contrato de promessa de compra e venda. Os pedidos foram julgados parcialmente procedentes para condenar as empresas a repararem a autora o valor da vaga não recebida, correspondente a doze metros quadrados, calculados com base no valor do imóvel. Ao analisar os recursos interpostos por ambas as partes, o colegiado aduziu que, de acordo com a convenção do condomínio, o empreendimento possui apenas 207 vagas para veículos, número inferior à quantidade de apartamentos. Acrescentou que a utilização do estacionamento se dá por ordem de chegada e de acordo com a disponibilidade, motivo pelo qual haveria possibilidade de algum condômino ficar sem local para estacionar o carro quando a lotação estivesse completa. Os desembargadores destacaram ainda que o contrato assinado pela requerente descreve a compra de um apartamento com uma unidade de vaga de garagem, sem qualquer detalhamento quanto ao fato de ser privativa ou rotativa, bem como sem informar a possibilidade de ausência de local para estacionar. Nesse contexto, explicaram que, de acordo com o art. 54 do Código de Defesa do Consumidor, as cláusulas que restrinjam direitos dos consumidores devem ser redigidas com destaque. Assim, a turma entendeu que a menção de vaga de garagem no empreendimento, sem especificação das condições de uso, criou no consumidor a legítima expectativa de ser privativa, configurando omissão relevante no contrato capaz de ocasionar erro na percepção dos fatos e dos direitos pela autora. Por fim, os julgadores afastaram o pedido de indenização por danos morais, pois não comprovada lesão aos direitos da personalidade, e mantiveram a sentença quanto à indenização por danos materiais.  

Acórdão 1888534, 07113978020238070020, Relatora: Des.ª MARIA IVATÔNIA, Quinta Turma Cível, data de julgamento: 4/7/2024, publicado no DJe: 18/7/2024.

Revisão contratual – tarifas bancárias – Temas 952 e 958 do STJ – abusividade não demonstrada

As cobranças bancárias simultâneas de tarifas de cadastro e de avaliação de bem dado em garantia, de juros no valor médio de mercado e de seguro prestamista não configuram prática abusiva da instituição financeira, desde que ajustadas previamente e inexistente onerosidade excessiva. Cliente de banco propôs ação revisional em contrato de cédula de crédito bancário com objetivo de afastar a cobrança de seguro prestamista e de tarifas de registro de contrato, de cadastro e de avaliação de bem. Pleiteou o recálculo do custo efetivo total da operação e a repetição de indébito dos valores que acreditou terem sido cobrados indevidamente. O juízo sentenciante julgou os pedidos improcedentes. Na análise do recurso interposto pelo autor, os desembargadores consignaram que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação de juros remuneratórios estipulada pela Lei de Usura (Decreto 22.626/1933). Aduziram que a fixação de patamar superior a 12% ao ano, por si só, não caracteriza abusividade, conforme Súmula 382 do Superior Tribunal de Justiça - STJ. Esclareceram que a jurisprudência admite a revisão de taxas de juros remuneratórios apenas em situações excepcionais: se configurada a relação de consumo e se demonstrado o abuso, por meio de comparação de operações similares em outras instituições. No caso, o fato de a taxa mensal praticada ser superior àquela demarcada pelo Banco Central, mas sem grandes distorções, não demonstra abusividade, pois trata-se de número referencial, e não de limite obrigatório. Quanto ao seguro prestamista, o colegiado ressaltou que o Tema 972 do STJ dispõe que o consumidor não pode ser compelido a contratá-lo, mas, no caso concreto, não foi verificado vício de consentimento ou hipótese de venda casada. Em relação às tarifas cobradas, os julgadores destacaram que o Tema 958 do STJ prevê a legalidade da taxação para registro do contrato e avaliação do bem, desde que o serviço tenha sido realmente prestado e sem onerosidade excessiva, como comprovado pelo registro do contrato no órgão de trânsito. Entenderam ainda que a avaliação foi necessária por se tratar de bem oferecido em garantia com mais de dez anos de uso. Por último, concluíram que a tarifa de cadastro encontra amparo na Súmula 566 do STJ, inexistindo ilegalidade. Com isso, a turma negou provimento ao recurso.   

Acórdão 1889179, 07382187520238070003, Relator: Des. DIAULAS COSTA RIBEIRO, Oitava Turma Cível, data de julgamento: 9/7/2024, publicado no DJe: 19/7/2024. 

Direito Empresarial

Cessão de cotas societárias – responsabilidade do sócio retirante por até dois anos contados da averbação da resolução da empresa

A questão da legitimidade passiva de pessoa jurídica é apreciada à luz da teoria da asserção, conforme alegações constantes da petição inicial. A par disso, o sócio retirante continua responsável pelas obrigações sociais até dois anos após a averbação da resolução empresarial, ressalvado direito de regresso previsto em contrato. Empresa e sócia interpuseram apelação contra sentença que as condenou ao pagamento de pouco mais de R$ 288 mil reais, em razão de inadimplemento contratual com instituição financeira. Sustentaram, em síntese, ilegitimidade passiva, porquanto a sociedade teria sido alienada a terceiro em data anterior à propositura da demanda, motivo pelo qual incumbiria àquele a quitação do débito. Inicialmente, os desembargadores afastaram a questão preliminar, à luz da teoria da asserção, que reconhece as condições da ação com base nas alegações constantes da inicial. No exame do mérito, assinalaram que as apelantes permanecem responsáveis pelas obrigações sociais anteriores, ainda que retirantes do quadro societário, até dois anos após a averbação da resolução da empresa, tudo conforme o art. 1.003, parágrafo único, e o art. 1.032 do Código Civil. Em retrospecto, observaram que o contrato gerador da dívida foi firmado em novembro de 2019, data em que ambas as autoras ainda compunham a sociedade que, por sua vez, só foi alienada no final de 2022. Assim, aduziram os magistrados, as recorrentes continuam obrigadas pela quitação do débito até o mês de novembro de 2024. Por fim, observaram que a corresponsabilidade no biênio não afasta direito de regresso, fundamentado em acordo de vontade previsto em cláusula contratual. Com esses fundamentos, o colegiado negou provimento ao recurso.

Acórdão 1887530, 07161156220238070007, Relator: Des. FERNANDO ANTONIO TAVERNARD LIMA, Segunda Turma Cível, data de julgamento: 3/7/2024, publicado no DJe: 16/7/2024.

Direito Penal e Processual Penal

Descumprimento de medida protetiva de urgência – anuência da vítima

Nos casos de deferimento de medida protetiva no contexto de violência doméstica, ainda que ocorra a anuência da vítima, a aproximação do ofensor caracteriza o crime de descumprimento da medida de urgência. Na mesma circunstância, xingamentos preconceituosos contra o novo companheiro da vítima, em razão da cor da pele e da religião, extrapolam o cenário de meras ofensas recíprocas, fato suficiente para configurar a injúria qualificada. Na origem, um homem foi denunciado pelo Ministério Público pela prática dos crimes de descumprimento de medidas protetivas e injúria qualificada no contexto de violência doméstica (art. 24-A da Lei 11.340/2024; e art. 140, § 3º, do Código Penal) contra a ex-companheira. O órgão ministerial alegou que o réu transgrediu ordem judicial ao buscar o filho na casa da vítima – quando deveria tê-lo buscado na escola, oportunidade em que proferiu diversos xingamentos contra a mãe e o namorado dela, pai de santo em centro de umbanda, valendo-se contra o rapaz de elementos concernentes à sua cor de pele e religião. Ao verificar a materialidade e a autoria dos crimes, o juízo singular condenou o réu à pena privativa de liberdade, bem como ao pagamento de danos morais no importe de quinhentos reais para cada uma das vítimas. No exame da apelação interposta pelo ex-companheiro, os desembargadores consignaram que o descumprimento de medidas protetivas pressupõe a transgressão e a desobediência dolosa à decisão judicial, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para buscar o filho em sua residência, uma vez que o bem jurídico tutelado pelo tipo penal é indisponível, pois refere-se à integridade da Administração da Justiça e apenas secundariamente à proteção da ofendida. Em relação ao crime de injúria qualificada, os julgadores asseveraram que as ofensas foram proferidas com o intuito de desvalorizar, menosprezar e humilhar o namorado da ex-companheira em razão da raça, da cor de pele e da orientação religiosa, traduzindo expressões de nítido racismo estrutural preconceituoso situação que ultrapassa mero cenário de embates ou troca de ofensas recíprocas. Em consequência, a turma ponderou que o juízo criminal tem competência para fixar o valor mínimo de reparação por danos morais nos casos de violência doméstica, desde que haja pedido expresso na denúncia reconhecendo-se a legitimidade do Ministério Público para formular a pretensão, ainda que não estipulada a quantia, e sem necessidade de instrução probatória específica para esse fim, bastando a comprovação do ato criminoso (art. 387, IV, do Código de Processo Penal; e Tema 983 do Superior Tribunal de Justiça). Assim, caracterizada a ofensa à honra subjetiva das vítimas e a transgressão à medida protetiva, o colegiado negou provimento ao recurso. 

Acórdão 1888287, 07043143120238070014, Relatora: Des.ª SIMONE LUCINDO, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 4/7/2024, publicado no PJe: 17/7/2024.

Direção perigosa na condução de motocicleta – desnecessidade de radar para comprovação da velocidade incompatível com a segurança

Incorre no crime de direção perigosa o condutor de motocicleta que empreende fuga em alta velocidade na contramão de via de grande movimentação de pessoas, colocando em risco a incolumidade de pedestres e outros motoristas. Dessa forma, revela-se desnecessária a existência de radar para comprovar a alta velocidade, uma vez uníssonos os depoimentos de policiais que atuaram na abordagem e perseguição do motociclista. Na origem, condutor de veículo fora denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime de direção perigosa (art. 311 do Código de Trânsito Brasileiro) e desobediência (art. 330 do Código Penal), em razão de abordagem policial em que o flagrou em alta velocidade na contramão da via. Segundo o órgão ministerial, o acusado desobedecera à ordem de parada emanada por policiais militares, empreendendo fuga em velocidade incompatível com a rua, nas proximidades de escolas e estações de embarque de transporte coletivo, gerando perigo de dano. O juízo singular condenou o réu pela prática do crime de trânsito à pena de dez dias-multa (à razão unitária de 40 reais), absolvendo-o, entretanto, da acusação da infração de desobediência, por vislumbrar a inexistência de ordem de parada, por pessoa de autoridade, antes da perseguição. O denunciado interpôs recurso. Na análise da apelação, os magistrados consignaram que a direção perigosa se caracteriza quando o condutor trafega em velocidade incompatível com a segurança, próximo de escolas, hospitais ou em locais de grande movimento, gerando perigo de dano. Nesse sentido, os julgadores verificaram que o acusado trafegou na contramão de vias, adentrando em quadras residenciais em alta velocidade, passando por lugares de grande concentração de pessoas, inclusive em frente a paradas de ônibus, até a sua captura. Com efeito, reconheceram o perigo de dano concreto, não havendo de se falar em atipicidade ou insuficiência de prova, em razão da inexistência de radar apto para atestar a velocidade durante a abordagem. Além disso, a turma destacou que o fato de as testemunhas serem policiais não macula o processo, sobretudo quando não há elemento suficiente para desmerecer a credibilidade dos depoimentos, uma vez que os atos dos agentes de segurança se revestem dos requisitos imanentes aos atos administrativos, quais sejam, a veracidade e a legitimidade (fé pública), as quais não foram infirmadas. Dessa forma, por reconhecer a direção perigosa que gerou risco à incolumidade de outros condutores e pedestres, o colegiado negou provimento ao recurso.  

Acórdão 1885726, 07002704820238070020, Relator: Juiz ANTONIO FERNANDES DA LUZ, Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, data de julgamento: 28/6/2024, publicado no PJe: 19/7/2024.

Direito Previdenciário

Pensão por morte – necessidade de prova especializada acerca da invalidez permanente para o trabalho

Filho inválido de ex-servidor público falecido é presumidamente considerado dependente econômico para fins de recebimento de benefício previdenciário. Contudo, para a concessão de pensão por morte do segurado, necessária a comprovação, por profissional especializado, da condição de invalidez permanente para o trabalho, sob pena de indeferimento do benefício. Filha de ex-servidora falecida interpôs apelação contra sentença que julgou improcedente pedido de pensão por morte da genitora, requerendo a declaração de incapacidade laborativa e sua inclusão como beneficiária da pensão. Ao analisarem o recurso, os desembargadores asseveraram que, de acordo com o rol de beneficiários do regime privado de previdência social do Distrito Federal, fixado pelo inciso IV e § 1º do art. 12 da Lei Complementar 769/2008, o filho inválido é considerado dependente do segurado, sendo relativamente presumida sua dependência econômica, haja vista a necessidade de comprovação da sua incapacidade para o trabalho. Nesse cenário, entenderam ser indispensável, para a concessão da pensão por morte, prova pericial especializada apta a demonstrar à alegada invalidez. No caso, os julgadores consignaram que a autora, atualmente com 67 anos de idade, é graduada em música com especialização em piano, recebe pensão por morte do genitor e se autodeclarou aposentada. Com efeito, a turma verificou que, a partir do laudo pericial realizado, apesar de a apelante padecer das enfermidades alegadas (degeneração corneana pelúcida, depressão crônica, fibromialgia e osteoartrose severa com dores intensas na coluna cervical), ela apresenta quadro clínico tratável, não gerador de incapacidade permanente para o trabalho. Alfim, em razão da não demonstração da invalidez laboral necessária para a concessão do benefício pleiteado, o colegiado negou provimento ao recurso. 

Acórdão 1880739, 00226124720168070018, Relator: Des. ALVARO CIARLINI, Segunda Turma Cível, data de julgamento: 19/6/2024, publicado no PJe: 19/7/2024.

Direito Tributário

Arrendamento mercantil – responsabilidade solidária por tributo – baixa de gravame não realizada

A companhia de arrendamento mercantil, na qualidade de proprietária e possuidora indireta, responde solidariamente com o arrendatário pelo pagamento do imposto sobre a propriedade de veículos automotores, até que o gravame seja baixado no órgão executivo de trânsito. Na origem, instituição financeira opôs embargos à ação ajuizada pelo Distrito Federal, com objetivo de extinguir execução fiscal referente ao imposto sobre a propriedade de veículos automotores. Para tanto, alegou, em resumo, ilegitimidade para figurar no polo passivo da obrigação tributária. O juízo singular julgou os pedidos improcedentes. Na análise da apelação interposta pelo embargante, os desembargadores asseveraram que o IPVA tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse legítima de veículos automotores, nos termos do art. 155, III, da Constituição Federal; art. 1º, caput, da Lei Distrital 7.431/1985 e art. 1º do Decreto Distrital 1.6099/1994. Ressaltaram que, no tipo de negócio jurídico em exame, a companhia de arrendamento mercantil conserva a propriedade e a posse indireta do bem, até que o arrendatário exerça a opção de compra e ocorra a respectiva exclusão do gravame nos registros do órgão de trânsito. Desse modo, a empresa de arrendamento responde solidariamente pelo pagamento do imposto, na qualidade de proprietária e possuidora indireta, conforme o art. 124, II, do Código Tributário Nacional; art. 1º, §7º e 8º, da Lei 7.431/1985. Na espécie, como o apelante não comprovou a baixa do veículo no Departamento de Trânsito do Distrito Federal – Detran/DF, os magistrados entenderam que o banco arrendador do automóvel responde pelo pagamento do encargo na administração tributária. Sobre a questão, o colegiado destacou jurisprudência segundo a qual é solidária a responsabilidade do arrendante e do arrendatário quanto ao pagamento do IPVA. Reconheceram ainda que, na hipótese, o banco figura como encarregado pelo pagamento do tributo, por ser possuidor indireto do veículo, conservando a propriedade, até a transferência do domínio. Por fim, esclareceram que, sem a devida baixa, permanece a solidariedade, mesmo após o encerramento do contrato de arrendamento mercantil e a exclusão no Sistema Nacional de Gravames – SNG. Dessa forma, não demonstrada a devida transferência do veículo, os julgadores confirmaram que permanece a responsabilidade solidária tributária entre os contratantes. Com isso, a turma negou provimento ao recurso.

Acórdão 1888471, 07351897520238070016, Relatora: Des.ª ANA MARIA FERREIRA DA SILVA, Terceira Turma Cível, data de julgamento: 4/7/2024, publicado no PJe: 19/7/2024.

Informativo

Primeira-Vice-Presidência

Desembargador Primeiro-Vice-Presidente: Roberval Casemiro Belinati

Desembargadores integrantes da Comissão de Jurisprudência: Sandoval Gomes de Oliveira - Presidente; Álvaro Ciarlini, Héctor Valverde Santanna, Maria Ivatônia Barbosa dos Santos e Roberto Freitas Filho – membros efetivos e José Firmo Reis Soub - membro suplente

Juíz Auxiliar da Primeira-Vice-Presidência: Luis Martius Holanda Bezerra Junior

Coordenadoria de Doutrina e Jurisprudência: Paulo Gustavo Barbosa Caldas 

Redação: Alessandro Soares Machado, Ana Paula Gama, Andrea Djanira Santos de Paula, Cleber Alves Ribeiro Braz, Ricardo Machado de Aguiar, Susana Moura Macedo e Tiago de Carvalho Resende Rodrigues

Colaboradores: Cristiana Costa Freitas, Letícia Vasco Mota e Maria Celina Fernandes de Souza

Revisão: José Adilson Rodrigues

Conversão do texto em áudio: Alexandre da Silva Lacerda

E-mail: jurisprudencia.nupijur@tjdft.jus.br 

Este Informativo é produzido pelo Núcleo de Pesquisa e Informativo de Jurisprudência – NUPIJUR.

Os textos aqui divulgados foram elaborados a partir de acórdãos selecionados pelo Núcleo de Pesquisa e Informativo de Jurisprudência da CODJU e não constituem, portanto, repositório oficial da jurisprudência deste Tribunal. 

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