Ação penal pública incondicionada

última modificação: 2023-12-15T09:54:39-03:00

Tema criado em 30/11/2023.

Doutrina  

“24.2.2.1. Ação pública incondicionada

É a regra no direito penal.

Nesta modalidade de ação penal, o exercício do direito de ação pelo Ministério Público não depende de qualquer condição especial. Basta que o crime investigado seja de ação pública e que existam indícios suficientes de autoria e materialidade para que o promotor esteja autorizado a oferecer a denúncia. 

Para que se conclua que determinado delito é de ação incondicionada basta verificar o próprio tipo penal. Caso a lei nada mencione, automaticamente a ação será pública incondicionada. Ao cuidar, por exemplo, dos crimes de homicídio doloso (art. 121 do CP), furto (art. 155 do CP), associação criminosa (art. 288) e corrupção passiva (art. 317 do CP), a lei nada menciona a respeito da modalidade de ação penal. Em consequência, tais delitos se apuram mediante ação pública incondicionada. 

É necessário lembrar, por fim, a regra contida no art. 24, § 2º, do Código de Processo Penal segundo a qual, qualquer que seja o crime, a ação será pública quando cometido em detrimento de patrimônio ou interesse da União, Estado ou Município.”

 (GONÇALVES, Victor Eduardo R. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1ª a 120). v.1 editora Saraiva, 2023. E-book. ISBN 9786553624726. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786553624726/.Acesso em: 4 dez. 2023.)

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“2. Princípios da ação pública incondicionada

A ação penal é pública, quando promovida e movimentada pelo Ministério Público, que é o dominus litis. Constitui, portanto, uma das funções institucionais privativas do Ministério Público (CF, art. 129, I).  

A ação penal pública é incondicionada porque, “para promovê-la, o órgão incumbido da persecutio criminis in judicio, independe de manifestação de vontade de quem quer que seja”. ( Fernando da Costa Tourinho Filho, Processo penal, 1972, v. 1, p. 262).  

A regra é esta: a ação penal é pública incondicionada. Em se tratando de ação pública condicionada, haverá menção expressa, na Parte Especial do Código.  

Constituem princípios informadores da ação pública incondicionada:  

a) A oficialidade – o Ministério Público é o órgão incumbido de promover a ação penal, devendo fazê-lo de ofício, ou seja, por iniciativa própria.  

b) A indisponibilidade: o Ministério Público, como titular da ação penal, poderá intentá-la e acompanhá-la em todos os seus trâmites legais. Não poderá, entretanto, dela dispor, declinando do seu exercício, transigindo, desistindo e acordando.  

c) A obrigatoriedade ou legalidade – o órgão do Ministério Público, presentes os elementos que autorizam a propositura da ação penal, deverá fazê-lo obrigatoriamente, sem sofrer injunções políticas, atuando de forma totalmente independente, sem sofrer qualquer ingerência: do Poder Executivo, do magistrado, do próprio procurador-geral. Tanto que este, quando dele divergir, entendendo de acordo com o juiz que é caso de denúncia, não pode ordenar do promotor que ofereça a denúncia, designando para tanto um outro promotor.  

d) A indivisibilidade – como corolário do princípio anterior, deriva o princípio da indivisibilidade, segundo o qual o Ministério Público haverá de proceder contra todos os autores e partícipes da infração criminal. Não será possível processar uns e poupar os demais. (Alberto Silva Franco, Código Penal e sua interpretação jurisprudencial, p. 1156.)  

Na ação pública incondicionada, a iniciativa de oferecer a denúncia é da competência exclusiva do Ministério Público. A peça inaugural haverá de conter a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado, a tipificação do delito e o rol de testemunhas a serem ouvidas durante a instrução.  

Com o advento da Lei n. 9.099, de 1995, que instituiu os Juizados Especiais Criminais, tem-se sustentado que o princípio da obrigatoriedade, na ação penal pública, foi mitigado pelo instituto da transação penal, que permite a aplicação de pena pecuniária ou restritiva de direitos de plano, sem instauração de processo penal, abstendo-se, nesse caso, o Ministério Público de oferecer a denúncia.  

Para tanto, a infração penal a ser apurada deverá ser de pequeno potencial ofensivo, ou seja, punida com pena não superior a um ano de prisão. Além disso, o autor do fato não poderá ter sofrido condenação a pena privativa de liberdade anteriormente, por sentença definitiva, nem ter-se utilizado de benefício da Lei n. 9.099, de 1995, nos últimos cinco anos. É necessário, ainda, que seus antecedentes, conduta social e personalidade indiquem que a medida adotada é necessária e suficiente.”  

(COSTA, Fernando José da; JÚNIOR, Paulo José da C. Código penal comentado. Editora Saraiva, 2011. E-book. ISBN 9788502133914. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788502133914/. Acesso em: 30 out. 2023).  

Jurisprudência

Denunciação caluniosa – crime de ação penal pública incondicionada

“II - O crime de denunciação caluniosa, previsto no art. 339 do CP é de ação penal pública incondicionada, ou seja, a legitimidade é privativa do Ministério Público e independe de representação do suposto ofendido.  III - A ação privada subsidiária da pública só é admitida quando houver inércia por parte do titular da ação penal."

Acórdão 1723295, 07394584220228070001, Relatora: NILSONI DE FREITAS CUSTODIO, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 29/6/2023, publicado no PJe: 7/7/2023.

Contravenção penal de vias de fato e ameaça – violência doméstica – ação penal pública incondicionada

“I - Conforme dispõe o art. 17 do Decreto-Lei nº 3.688/1941, a contravenção penal de vias de fato deve ser apurada mediante ação penal pública incondicionada, sendo prescindível a representação da vítima.   II - Nos crimes praticados em situação de violência doméstica e familiar contra a mulher, não se aplica a Lei nº 9.099/1995.  III - Iniciada a ação penal para apurar contravenção penal de vias de fato praticada no âmbito doméstico e familiar contra a mulher, não cabe dela desistir a ofendida, devendo ser cassada a decisão que rejeitou a denúncia por falta de justa causa para a persecução penal e sob o fundamento de se tratar de crime de menor potencial ofensivo.”  
Acórdão 1782278 00143865920168070016, Relator: NILSONI DE FREITAS CUSTODIO, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 8/11/2023, publicado no PJe: 23/11/2023.

Lesão corporal – violência doméstica – ação penal publica incondicionada – irrelevância do perdão da vítima

“2. A reconciliação da vítima com o agressor não enseja absolvição do réu, mormente considerando que o crime de lesão corporal, praticado no âmbito da violência doméstica, ainda que de natureza leve, é de ação penal pública incondicionada.”
Acórdão 1761686, 00013040720208070020, Relator: ARNALDO CORRÊA SILVA, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 21/9/2023, publicado no DJE: 3/10/2023.

Crime de racismo – ação penal pública incondicionada

“3. O fato de apenas uma aluna ter registrado ocorrência policial e comunicado o fato aos gestores da escola visando à tomada de providências não afasta o crime, na medida em que as condutas típicas descritas no art. 20 da Lei 7.716/89 não são direcionadas a vítima determinada, como ocorre na injúria racial, mas sim à coletividade, sendo exemplo de crime vago, definido pela doutrina como aqueles em que a ofensa é perpetrada contra a coletividade, sendo o sujeito passivo indeterminado. Além disso, o crime de racismo é de ação penal pública incondicionada, de modo que, a despeito da reação de quaisquer dos alunos presentes, caso o fato de outro modo se tornasse conhecido, sua apuração pelas autoridades competentes seria, igualmente, necessária. 4. O fato de o acusado ser negro não configura exculpante ou excludente do crime, sendo aspecto pessoal não influente para a caracterização do delito."

Acórdão 1764244, 00046776220188070005, Relator: JANSEN FIALHO DE ALMEIDA, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 28/9/2023, publicado no PJe: 5/10/2023.

Crimes contra a dignidade sexual contra menor –violência doméstica – ação penal pública incondicionada

“1. A natureza da ação penal em relação aos crimes de dignidade sexual contra menor e em contexto de violência doméstica e familiar é pública incondicionada, qualquer que seja a redação do art. 225, do Código Penal, ou seja, a originária (§ 1º, inciso II) ou as duas subsequentes (edição das Leis nº 12.015/2009 e 13.718/2018). Preliminar de decadência rejeitada. 2. Nos crimes praticados contra menor de 14 (catorze) anos de idade, os depoimentos harmônicos e seguros da vítima, corroborados pelos demais elementos dos autos, colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, formam lastro probatório suficiente ao juízo condenatório.”

Acórdão 174524107090324220218070014, Relator: JANSEN FIALHO DE ALMEIDA, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 17/8/2023, publicado no DJE: 28/8/2023.

Crime sexual contra vulnerável –ação penal pública incondicionada

“1. Nos termos do art. 225 do Código Penal, nos crimes definidos nos Capítulos I e II do Título VI (Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual), no qual está inserido o delito do art. 215 do CP, procede-se mediante ação penal pública incondicionada, razão pela qual prescindível a representação da ofendida para prosseguimento da demanda."

Acórdão 1758499, 07182332820208070003, Relator: SANDOVAL OLIVEIRA, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 14/9/2023, publicado no DJE: 27/9/2023. 

Lesão corporal grave – ação penal pública incondicionada

“3. É grave a lesão corporal cujas consequências impõem à vítima afastamento das atividades laborais por mais de trinta dias (art. 129, § 1º, I, CP). 4. A conduta de dano praticada pelo réu ocorreu na forma qualificada e nesses casos específicos, a ação penal é pública incondicionada. A legitimidade para iniciar a ação penal, portanto, cabe ao Ministério Público.”

Acórdão 172913807212290520208070001, Relator: JOSAPHA FRANCISCO DOS SANTOS, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 13/7/2023, publicado no PJe: 25/7/2023.

Crime de furto – desnecessidade de  registro de boletim de ocorrência – ação penal pública incondicionada

“Hipótese em que a autoria e a materialidade do crime de furto simples consumado restam suficientemente provadas pelo Auto de Prisão em Flagrante, Auto de Apresentação e Apreensão, Relatório Final da autoridade policial e pelo depoimento do policial militar responsável pela abordagem e da vítima. Tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não há necessidade de registro de boletim de ocorrência pela vítima do fato. O crime de furto se revela consumado com a prova de que houve clara inversão da posse dos bens ao acusado, ainda que brevemente.”

Acórdão 1697082, 07000108120218070006, Relator: ESDRAS NEVES, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 4/5/2023, publicado no PJe: 15/5/2023 .

Veja também  

Crime de lesão corporal - ação penal pública incondicionada 

Contravenção penal de vias de fato – ação penal pública incondicionada