Limites à liberdade de expressão – "fake news"

última modificação: 2023-04-26T11:03:21-03:00

Tema disponibilizado em 19/4/2023.

As “fake news” – expressão utilizada para definir a propagação de informações inverídicas, notícias fabricadas sem compromisso com a verdade, discursos mentirosos, agressivos e de ódio –, desde que devidamente comprovado o conteúdo falso ou enganoso, configuram dano moral indenizável, por abuso do direito à liberdade de manifestação do pensamento. 

Trecho de acórdão

"(...) A imagem e o som contidos no vídeo com mensagem ofensiva não deixam dúvidas de que foi gravado com o intuito de tornar público o seu conteúdo para fins de dissuasão e de persuasão políticas, inexistindo a alegada culpa exclusiva de terceiro pela sua produção e/ou divulgação... 6. 'liberdade de expressão é não só uma componente essencial dos regimes democráticos, como o grau de democraticidade de um Estado pode ser razoavelmente aferido através do grau efetivo de liberdade de expressão de que gozam seus cidadãos.' 7. 'Liberdade de expressão não é liberdade de agressão! Liberdade de expressão não é liberdade de destruição da democracia, das instituições e da dignidade e honra alheias! Liberdade de expressão não é liberdade de propagação de discursos mentirosos, agressivos, de ódio e preconceituosos!' (...) 8. A liberdade de expressão não se estende à divulgação de notícias inverídicas... 10. O direito de criação e de expressão da atividade artística comporta a 'invenção da verdade' e tem proteção constitucional (CF, art. 5º, IX). Fora das Artes, a invenção e divulgação de fatos falsos não tem proteção constitucional. No Brasil, nunca teve. É o que se chama fake news. 11. Imputar fato falso que ofende a dignidade, o decoro, a honra subjetiva e objetiva de outrem, é crime há, pelo menos, quinhentos anos. Mudaram, nesses cinco séculos, detalhes da tipologia, mantendo-se a essência' (...). 12. Fake news é uma praga tão nociva quanto o vírus da covid-19. Identificar e combater notícia falsa é um compromisso da humanidade para o qual o Poder Judiciário é ator relevantíssimo e indispensável, cabendo-lhe separar o que é direito do que é simulacro de direito ou abuso de direito. 13. Cabe ao Poder Judiciário punir e reprimir aquele que cria e/ou divulga notícia falsa (fake news); aquele que, 'sem saber o que é Direito, faz as suas próprias leis' (...). 14. 'Na colisão de direitos fundamentais, após a análise do caso concreto, deve-se resolver o conflito com a aplicação do princípio da concordância prática, também denominado de princípio da ponderação dos valores em jogo.' Precedente. 15. Quando são rompidos os parâmetros de civilidade, que diferenciam a sociedade civilizada de uma alcateia, cabe ao Poder Judiciário, por natureza uma conquista e uma garantia contínua do processo civilizacional, impedir que o homem seja o lobo do próprio homem (Lupus est homo homini lupus). Fake news é uma violação dos padrões de civilidade. (...)  8. 'O valor da indenização por dano moral pode variar bastante. É que o bem violado é imaterial (direito da personalidade) e, portanto, insuscetível de uma reparação integral. O valor pecuniário da indenização apenas se destina a atenuar a lesão extrapatrimonial. O arbitramento não pode ser tão alto a ponto de expor o causador do dano a um 'inferno de severidade' nem tão baixo de tal modo a estimular reincidências. (...) A função punitiva e preventiva da indenização por dano moral é levada em conta no exame da culpabilidade do agente e da situação econômica do ofensor: quanto mais reprovável a conduta do agente e quanto maior a sua condição econômica, maior deve ser o valor da indenização por dano moral." (grifamos)

Acórdão 1652372, 07384518320208070001, Relator: DIAULAS COSTA RIBEIRO, Oitava Turma Cível, data de julgamento: 15/12/2022, publicado no DJe: 25/1/2023.

Acórdãos representativos

Acórdão 1332118, 07092443020208070004, Relator: FERNANDO ANTONIO TAVERNARD LIMA, Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, data de julgamento: 14/4/2021, publicado no DJe: 22/4/2021;

Acórdão 1304779, 07159967920208070016, Relator: GILMAR TADEU SORIANO, Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, data de julgamento: 1º /12/2020, publicado no DJe: 11/12/2020;

Acórdão 1300429, 07272390220198070001, Relatora: DIVA LUCY DE FARIA PEREIRA, Primeira Turma Cível, data de julgamento: 18/11/2020, publicado no DJe: 24/11/2020;

Acórdão 1269103, 07062212220198070001, Relatora: GISLENE PINHEIRO, Sétima Turma Cível, data de julgamento: 5/8/2020, publicado no DJe: 12/8/2020.

Destaques

  • TJDFT

Alegação de "fake news" em matéria jornalística – animus narrandi – dano moral inexistente

"(...) A liberdade de informação possui relevante papel na Democracia, devendo ser prestigiada e fortalecida, notadamente quando verificados o animus narrandi, a ausência de excessos e o relevante interesse social da notícia. Nesse passo, apenas as publicações que desbordem dos limites da liberdade de informação, de crítica, da livre discussão dos fatos, afrontando a honra, são passíveis de indenização, por dano moral. 3. Sobressai dos documentos colacionados aos autos que a ré/recorrida limitou-se a publicar a informação de que a autora/recorrente havia dito que a morte de um homem por estouro de pneu em Recife foi contabilizada pela Secretaria de Saúde por coronavírus, e, com isso, inflado 'fake news' sobre fraude na contagem de casos por COVID-19, já que a Secretaria não havia contabilizado o referido óbito como COVID-19. A ré/recorrida demonstrou que a notícia publicada pela autora/recorrente foi desmentida pela Secretaria de Saúde Pernambuco, (...), e o óbito daquele homem  nunca constou das estatisticas de mortes por Covid-19, divulgadas pela Secretaria Estadual de Saude. Desse modo, a referência, na matéria publicada pelo ré/recorrente, à 'fake news' não se dirigia à causa do óbito, objeto da postagem da autora/recorrente, mas à contabilização como COVID-19, pelo Estado de Pernambuco. 4. Assim, ausente qualquer ato ilícito, não se há de falar em retirada da matéria do site, ou indenização, por dano moral." (grifamos)

Acórdão 1332892, 07160054120208070016, Relatora: SONÍRIA ROCHA CAMPOS D'ASSUNÇÃO, Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, data de julgamento: 9/4/2021, publicado no DJe: 27/4/2021.

  • STJ

Propagação de "fake news" em rede social – postagens ofensivas – dano moral

"(...) Hipótese nos autos em que o réu postou em seu Twitter uma montagem de uma imagem da autora vestindo uma camiseta preta com os dizeres falsos 'Jesus Travesti' e com mensagens ofensivas, chamando-a de 'anticristo'. Fato inexistente. Falsificação grosseira. Caso que envolve a análise de conflito de bens jurídicos constitucionalmente protegidos: a liberdade de expressão e de pensamento versus a inviolabilidade da honra e da imagem e a consequente indenização pelos danos decorrentes de sua violação. Figuras públicas têm a privacidade relativizada devido à atividade que desempenham e devem ser mais tolerantes às críticas considerando seu grau de exposição social. Estas críticas, quando proferidas a gestores de cargos públicos, devem ser proferidas em face das ideias e condutas do adversário político, sem inverdades ou calúnias. Ainda que autora e réu sejam adversários políticos, críticas, ainda que ácidas e severas, fazem parte da disputa eleitoral e não justificam a intervenção do Poder Judiciário; entretanto, tal liberdade não pode servir de salvaguarda para a disseminação de discursos de ofensa à imagem de uma das partes. A ampla circulação de imagens fraudulentas propulsiona notícias falsas - fake news - com nítido potencial de enganar os cidadãos que as visualizaram e de produzir discursos de ódio. Dever de indenizar configurado. Observando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sopesando a capacidade econômica de ambas as partes e considerando as circunstâncias do caso concreto, a amplitude da ofensa operada por uma pessoa pública em face de outra pessoa pública em período eleitoral, majoro a indenização para R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Retratação pública mantida pelo tempo determinado em sentença, ou seja, período mínimo de três meses, eis que o direito de resposta busca inibir os abusos cometidos à liberdade de expressão e garantir ao ofendido que seguidores do ofensor terão acesso à verdade dos fatos.(...) . Na espécie, o recorrente postou em rede social duas mensagens, acompanhadas da falsificação da imagem da autora, com nítido objetivo de ferir a honra de pessoa pública e interferir em processo eleitoral - contexto que, por si só, impõe a fixação da indenização em valor mais elevado, ante a gravidade do ato ilícito." (grifamos)  AREsp 2027149/RS

Veja também

Abuso no exercício da liberdade de informação – imputação falsa – reparação por dano moral 

Liberdade de expressão e a livre manifestação do pensamento

Referências

Art. 5º, IX, e art. 220, § 2º,da CF.