Abandono afetivo no âmbito das relações familiares

última modificação: 2023-02-03T14:49:06-03:00

Tema criado em 19/12/22.

Constituição Federal 

“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (...)  

Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.”

Destaques

  • TJDFT 

Indenização por danos morais – abandono afetivo por ausência paterna – pressupostos não comprovados

"1. 'Quanto ao abandono moral, trata-se de negligência com os filhos na seara emocional e intelectual, que desatende diretamente os deveres de criação e educação (arts. 229, CR, e 1.634, I, CC). É a conduta dos pais que deixam de promover o amparo e o cuidado com os filhos.' (TEPEDINO, Gustavo; TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Fundamentos do Direito Civil, vol. 6: Direito de Família. 2. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2021. p. 310). 2. A Terceira Turma do STJ tem se posicionado pela possibilidade de responsabilização civil dos pais que desamparam sua prole nos aspectos mental, psíquico e de personalidade, desde que suficientemente comprovada a relevância da ação ou da omissão parental, o efetivo dano moral e o nexo causal entre este e aquela, bem definido o caráter de excepcionalidade de referido reconhecimento (REsp 1.887.697/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/9/2021, DJe 23/9/2021 RSDF vol. 129 p. 53 RT vol. 1036 p. 251). 3. '(  ) 2. Para a configuração do dano moral passível de reparação oriundo de abandono afetivo pelo genitor não basta apenas o mero distanciamento afetivo entre pai e filho, sendo necessário, ainda, comprovar-se que a ausência paterna acarretou efetivo e correspondente trauma psicológico no filho, em substancial prejuízo à sua formação humana. (  )' (TJDFT. Acórdão 12522233, APC07080217920198070003, Relatora: ANA CANTARINO, 5ª Turma Cível, julgado em 27/5/2020, DJe 8/6/2020). 3.1. As provas constantes dos autos não evidenciam dano moral decorrente da ausência paterna, não havendo se falar em violação aos direitos de personalidade do autor/apelante."  

Acórdão 1625781, 07204460720208070003, Relatora: MARIA IVATÔNIA, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 5/10/2022, publicado no DJE: 19/10/2022.

Responsabilidade civil – abandono afetivo – requisitos estruturantes

"1. A configuração da obrigação de reparar dano moral no direito de família deve observar a mesma forma da responsabilidade civil em geral, ou seja, deve decorrer da demonstração dos seguintes requisitos estruturantes: conduta (comissiva ou omissiva), nexo de causalidade e dano por violação aos direitos da personalidade. 2. O dever de cuidado está relacionado ao sustento, à guarda e à educação dos filhos. O amor e o afeto não podem ser impostos pelo Estado e não consubstanciam deveres jurídicos. A manutenção dos laços afetivos depende da vontade das partes e não pode ser imposta pelo julgador. 3. O abandono afetivo, sem que descumprido o dever de cuidado dos genitores, não constitui ato ilícito, o que obsta a imposição de reparação por dano moral." Grifamos

Acórdão 1614649, 00342599020168070001, Relator: HECTOR VALVERDE SANTANNA, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 14/9/2022, publicado no DJE: 20/9/2022.

Indenização por abandono afetivo – prescrição – prazo trienal – termo a quo – paternidade conhecida ou maioridade

"1. Nas ações de indenização por abandono afetivo a prescrição é trienal e o termo inicial é a data em que o interessado atinge a maioridade civil. 2. Os danos requeridos somente poderão abranger os fatos existentes ao período em que o genitor tem o dever de cuidado e vigilância para com o seu filho.  3. Consabido que entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar, não corre a prescrição, nos termos do art. 197, inciso II, do CC, o termo a quo se dá com o atingimento da maioridade ou reconhecimento da paternidade."          

Acórdão 1609891, 07027226520228070020, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 24/8/2022, publicado no DJE: 9/9/2022.

Abandono afetivo – inocorrência de prescrição – violação continuada de direitos, inclusive após a maioridade – impossibilidade de fixação de termo a quo – compensação por danos morais devida

"1. 'Se a violação do direito é continuada, de tal forma que os atos se sucedam em sequência, a prescrição ocorre do último deles' (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 25 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 585).  2. O abandono afetivo não se caracteriza por um só ato. Dessa forma, não é possível fixar a data específica em que ele se consuma. 4. Nos casos de violação continuada de direitos, o marco do início da prescrição não é o primeiro ato executado; mas, sim, o último. Isso é especialmente relevante quando a própria ilicitude só se configura com a habitualidade da conduta, como bem trabalhado na doutrina penal sobre relação entre prescrição e crimes habituais, permanentes e continuados. 5. A família é instituição social que precede e extrapola o Direito. Como em regra acontece, o ordenamento jurídico não criou uma categoria, mas regulamentou um fenômeno já existente, em razão de sua importância para o desenvolvimento humano e relevância patrimonial. 6. A maioria das normas concernentes ao cuidado intrínseco às relações familiares refere-se a crianças, adolescentes e idosos, porquanto são as pessoas mais expostas e vulneráveis. Todavia, isso não significa que as obrigações familiares se esgotem no lapso dos 0 aos 18 anos e após os 60 anos, com um intervalo de tempo em que não há deveres recíprocos 7. Os deveres familiares não se restringem aos cuidados com crianças e adolescentes. É possível praticar condutas ativas e omissivas que configurem continuação do abandono afetivo ainda na vida adulta do filho. Logo, afasta-se o entendimento que fixa o início do prazo prescricional na data em que atingida a maioridade, para as ações de compensação por danos morais decorrentes de abandono afetivo.   8. A partir da Emenda Constitucional nº 65/2010, a absoluta prioridade foi estendida ao jovem, reconhecido o seu direito à convivência familiar e à proteção contra a negligência. (...)  12. Na hipótese, é cabível a compensação por dano moral em razão do abandono afetivo longo e intenso ao qual a apelada foi exposta, pois viola os seus direitos da personalidade, sobretudo no que se refere à sua integridade psíquica."  Grifamos 

Acórdão 1415218, 07348151220208070001, Relator: LEONARDO ROSCOE BESSA, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 6/4/2022, publicado no DJE: 3/5/2022.

Destituição do poder familiar da mãe biológica – abandono material, afetivo e intelectual – menor em situação de vulnerabilidade

"2.O Estatuto da Criança e do Adolescente determina o dever dos pais em prestar o sustento, a guarda e educação dos filhos menores. Determina, ainda, a perda ou a suspensão do poder familiar, na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações para com os filhos menores, e a prevalência dos interesses do menor adotando caso haja conflito de interesses. 3. No caso dos autos, demonstrados o abandono afetivo e material do menor e a ausência de efetiva mudança comportamental da sua genitora, correta a sentença que determinou a destituição do poder familiar da mãe biológica em atenção ao melhor interesse da criança."

Acórdão 1390796, 07057027420208070013, Relator: ROMULO DE ARAUJO MENDES, 1ª Turma Cível, data de julgamento: 1/12/2021, publicado no PJe: 14/12/2021.

Reparação civil por abandono afetivo – alegação de pouco convívio com o genitor – não caracterização de ato ilícito

"1. A configuração da responsabilidade civil do genitor, para compensação, por abandono afetivo, exige a presença dos requisitos caracterizadores: a conduta omissiva ou comissiva do genitor (ato ilícito); o trauma ou prejuízo psicológico sofrido pelo filho (dano); e o nexo de causalidade entre o ato ilícito e o dano; e, ainda, a prova do elemento volitivo caracterizado pelo dolo ou a culpa. 2. O fato de existir pouco convívio com o genitor não é suficiente, por si só, a caracterizar o abandono afetivo a legitimar a correlata pretensão indenizatória. Para tanto, é preciso evidências robustas de que o comportamento de descaso, rejeição e desprezo acarretou danos psicológicos irreversíveis ao filho. 3. Os sentimentos de tristeza e saudades do filho, em relação à ausência de contato mais amiúde com o pai, não caracteriza situação de abandono afetivo."   

Acórdão 1379642, 00053551220168070017, Relatora: SONÍRIA ROCHA CAMPOS D'ASSUNÇÃO, 4ª Turma Cível, data de julgamento: 14/10/2021, publicado no DJE: 27/10/2021.

Crime de abandono de idoso em hospital – maus tratos praticados por filho em relação a sua genitora – dever de solidariedade parental

"Demonstrado pelas provas colhidas nos autos que o acusado abandonou sua genitora durante internação hospitalar (art. 98 do Estatuto do Idoso), a condenação é medida que se impõe."

Acórdão 1406856, 00015487820208070005, Relator: WALDIR LEÔNCIO LOPES JÚNIOR, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 10/3/2022, publicado no PJe: 21/3/2022.

  • STJ

Responsabilidade civil – desistência de adoção depois de longo período de convivência – ruptura abrupta do vínculo afetivo – dano moral configurado

"1. Controvérsia acerca do cabimento da responsabilização civil de casal de adotantes que desistiram da adoção no curso do estágio de convivência pelo dano moral causado ao adotando. (...) 5. Hipótese dos autos em que o adotando passou a conviver com os pretensos adotantes aos quatro anos de idade, permanecendo sob a guarda destes por quase oito anos, quando foi devolvido a uma instituição acolhedora. 6. Indubitável constituição, a partir do longo período de convivência, de sólido vínculo afetivo, há muito tempo reconhecido como valor jurídico pelo ordenamento. 7. Possibilidade de desistência da adoção durante o estágio de convivência, prevista no art. 46, da Lei n.º 8.069/90, que não exime os adotantes de agirem em conformidade com a finalidade social deste direito subjetivo, sob pena de restar configurado o abuso, uma vez que assumiram voluntariamente os riscos e as dificuldades inerentes à adoção. 8. Desistência tardia que causou ao adotando dor, angústia e sentimento de abandono, sobretudo porque já havia construído uma identidade em relação ao casal de adotantes e estava bem adaptado ao ambiente familiar, possuindo a legítima expectativa de que não haveria ruptura da convivência com estes, como reconhecido no acórdão recorrido. 9. Conduta dos adotantes que faz consubstanciado o dano moral indenizável, com respaldo na orientação jurisprudencial desta Corte Superior, que tem reconhecido o direito a indenização nos casos de abandono afetivo. 10. Razoabilidade do montante indenizatório arbitrado em 50 salários mínimos, ante as peculiaridades da causa, que a diferenciam dos casos semelhantes que costumam ser jugados por esta Corte, notadamente em razão de o adolescente ter sido abandonado por ambos os pais socioafetivos."

REsp 1.981.131/MS, Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 8/11/2022, DJe de 16/11/2022.