O princípio da paternidade/maternidade responsável e a observância do melhor interesse do menor

última modificação: 2022-07-22T09:46:54-03:00

Tema criado em 28/6/2022.

Constituição Federal

“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...)

7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. (...)

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.   (...)

Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.”

Estatuto da Criança e do Adolescente (‎Lei 8.069/1990)

“Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. ”

Destaques

  • TJDFT

Revisão de alimentos – novo filho – irrelevância – princípio da paternidade responsável

“2. É dever dos pais assistir, educar e criar os filhos menores, conforme dispõe o art. 229 da CF/88, regulamentado pelo Código Civil, que impõe a ambos os genitores o dever de sustentar, guardar e educar os filhos menores (art. 1.566, IV), bem como define ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos filhos na proporção da capacidade financeira de cada um (art. 1.703).  (...)O quantum homologado por sentença encontra-se em estrita observância ao trinômio necessidade-possibilidade-razoabilidade, pois está de acordo com as peculiaridades do caso concreto. 4. O aumento da prole do alimentante não é capaz, por si só, de justificar a diminuição dos alimentos fixados, sendo necessária a comprovação da efetiva alteração de sua capacidade financeira, fato não percebido no caso em debate. 4.1. Pelo princípio da paternidade responsável, não se pode aceitar a transferência da responsabilidade financeira com os filhos já existentes para aqueles que sobrevierem.”  
Acórdão 1418474, 07077128720218070003, Relatora: DIVA LUCY DE FARIA PEREIRA, 1ª Turma Cível, data de julgamento: 4/5/2022, publicado no DJE: 12/5/2022.

Destituição do poder familiar –  abandono material, afetivo e intelectual – maternidade responsável – melhor interesse da criança

“2. O Estatuto da Criança e do Adolescente determina o dever dos pais em prestar o sustento, a guarda e educação dos filhos menores. Determina, ainda, a perda ou a suspensão do poder familiar, na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações para com os filhos menores, e a prevalência dos interesses do menor adotando caso haja conflito de interesses. 3. No caso dos autos, demonstrados o abandono afetivo e material do menor e a ausência de efetiva mudança comportamental da sua genitora, correta a sentença que determinou a destituição do poder familiar da mãe biológica em atenção ao melhor interesse da criança.”
Acórdão 1390796, 07057027420208070013, Relator: ROMULO DE ARAUJO MENDES, 1ª Turma Cível, data de julgamento: 1/12/2021, publicado no PJe: 14/12/2021.

Ação de guarda e regulamentação de visitas – condenação do genitor por estupro de vulnerável contra a sua filha mais velha – suspensão do direito de convivência – ponderação entre princípios – aplicação do princípio do melhor interesse da criança

“2. Em se tratando de interesse de incapaz, deve o julgador observar as diretrizes impostas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, em especial o princípio da proteção integral, em que a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contida no aludido Estatuto deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares (art. 100, parágrafo único, do ECA).  3. Caso concreto em que há gravidade de conduta imputada ao genitor, condenado pela prática do crime de estupro de vulnerável e contravenção penal de perturbação da tranquilidade contra a sua filha mais velha, irmã da criança cuja guarda compartilhada se discute.  4. Em casos dessa natureza, em que o bem discutido é a vida e integridade da menor, deve ser realizada uma ponderação de princípios, de modo que o direito do convívio, por parte do genitor, não se sobreponha ao princípio do melhor interesse da criança. Assim, embora seja exceção, é plenamente possível suspender o direito de convivência com um dos genitores, a fim de preservar a segurança e a integridade da criança.”  
Acórdão 1375675, 07098655520198070006, Relator: JOSAPHA FRANCISCO DOS SANTOS, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 29/9/2021, publicado no PJe: 12/10/2021. 

Manutenção de guarda compartilhada – mudança do lar materno para o exterior – menores em desenvolvimento pessoal, intelectual e afetivo – alternância bienal do lar de referência – preponderância do princípio do melhor interesse do menor

“2. Tratando-se de guarda de menores, deve ser observado o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, de extensão legal - arts. 3º, 4º e 5º do ECA - e constitucional - art. 227 da CF. O bem-estar da criança e adolescente se sobreleva às prerrogativas puramente formais do poder parental, devendo ser averiguada a melhor forma de convivência e integração socioafetiva para o fim de resguardar o pleno desenvolvimento.  (...) 3.1. Embora importante o contato das crianças com amigos e familiares residentes no Brasil, assim como com o pai, igualmente importante a convivência com a mãe, indispensável para o desenvolvimento psicológico e emocional dos filhos e para a preservação e fortalecimento do vínculo afetivo materno.  4. Argumento de que as crianças "estabilizaram" suas vidas em Brasília não deve ser preponderante ao direito de ambas ao convívio com a mãe, com a qual mantém laços fortes e indispensáveis ao seu desenvolvimento. Ademais, como consta dos autos, estudam na Escola das Nações, ensino bilíngue, período escolar diferenciado do nacional, formato que será mantido quando se mudarem para Pretória, África do Sul, escola bilíngue com mesmo calendário escolar, não se podendo, em princípio, presumir prejuízo às crianças. Acrescente-se que a mudança de país representará rica experiência cultural e social para os menores, que contarão com rede de apoio familiar (mãe e seu cônjuge) apto a contornar a normal dificuldade inicial de adaptação.  4.1. E no período em que as crianças estiverem residindo com um dos genitores, o outro poderá visitá-las livremente e com elas passar as férias escolares integralmente, além do direito ao contato diário com os filhos por meios de comunicação tecnológicos como Facetime, Whatsapp, plataforma Zoom, dentre outros, o que ajuda a reduzir o também normal sofrimento resultante da distância física.  5. A alternância bienal do lar referencial, ainda que em países diferentes, garantirá equidade na convivência das crianças com os genitores, possibilitará o fortalecimento do vínculo e a manutenção de ambos como referências de afeto, solução que melhor atende aos princípios do superior interesse da criança e do adolescente, da convivência familiar, da igualdade entre pai e mãe e da paternidade responsável. Ademais, caso ocorra alteração no contexto fático, regime de guarda que sempre poderá ser revisto.”
Acórdão 1322502, 07300675720188070016, Relatora: MARIA IVATÔNIA, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 10/3/2021, publicado no PJe: 13/3/2021.

Passe livre aos estudantes – possibilidade de extensão do benefício a acompanhante – aplicação dos princípios da proteção integral e do melhor interesse do incapaz

“1. A presente hipótese consiste em deliberar a respeito da possibilidade de extensão do benefício relativo ao transporte público gratuito aos genitores de estudante impúbere para acompanhá-lo no percurso até a escola.(...) No entanto, o mencionado diploma legal nada dispõe acerca da extensão do aludido benefício aos acompanhantes do estudante, independentemente da idade do beneficiário. 3. O interesse jurídico relativo à extensão do passe livre estudantil aos genitores do incapaz impúbere deve ser examinado de acordo com a doutrina da proteção integral, em consonância com o princípio do melhor interesse do incapaz, nos termos do art. 227, caput, da Constituição Federal. 3.1. De acordo a aludida doutrina, encampada pelo texto Constitucional e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, a criança é sujeito de direitos, razão pela qual deve haver a devida tutela de sua esfera jurídica incólume. 4. No presente caso atende ao princípio da proteção integral a possibilidade de extensão do benefício da gratuidade do transporte público a um acompanhante para a criança. Entendimento contrário resultaria, pragmaticamente, na negativa da utilidade efetiva do passe livre concedido ao infante, que necessita de acompanhamento por adulto plenamente capaz.”
Acórdão 1406753, 07342147220218070000, Relator: ALVARO CIARLINI, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 9/3/2022, publicado no PJe: 28/3/2022.

Guarda atribuída à tia paterna – ausência de vínculos com a genitora – melhor interesse da criança

“1. Em situações excepcionais, a guarda de filho menor pode ser atribuída a terceiro (33 ECA), a fim de atender ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. 2. A guarda deve ser concedida à tia paterna com quem a criança (7 anos de idade) já reside há pelo menos 3 anos, estando exclusivamente sob sua guarda fática após o falecimento do genitor, tendo suas necessidades atendidas. 3. Embora não haja nada nos autos que desabone a conduta da genitora, a mudança de vida exigida para que a criança deixe o lar em que vive e passe a residir em outro estado da federação (Goiás) com requerida, com quem não possui vínculos afetivos, pode ocasionar-lhe prejuízos. 4. Deu-se provimento aos apelos do MPDFT e da requerente/tia.”  
Acórdão 1422024, 07043449020198070019, Relator: SÉRGIO ROCHA, 4ª Turma Cível, data de julgamento: 5/5/2022, publicado no DJE: 18/5/2022.

Ação de guarda avoenga – convivência com avó paterna – melhor interesse do menor

“3. A Constituição Federal de 1988, consagrando a Doutrina da Proteção Integral, preconizou no artigo 227, com absoluta prioridade, que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente os direitos à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 4. O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, em seu art. 100, parágrafo único, ao dispor sobre o princípio da proteção integral, estabelece que "a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contida nesta Lei deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares". (...) 6.1. De acordo com ofício enviado pelo Conselho Tutelar de Ipaumirim - CE, foram informadas as viagens em companhia da avó paterna, autorizadas pela genitora e testemunhadas pelos membros do colegiado. 6.2. O menor manifestou, em audiência de instrução, o interesse em permanecer na companhia da avó paterna, com quem se sente protegido e acolhido. 6.3. O estudo psicossocial concluiu que, com o fito de se assegurar o melhor interesse da criança, avaliou-se que o menor se encontra assistido, dentro da realidade socioeconômica e cultural da família, em suas necessidades básicas de saúde, educação, afeto e proteção, sob a guarda da avó materna. 6.4. Tais elementos evidenciam inequivocadamente que o menor, atualmente com 11 anos, está sob os cuidados da avó paterna, e que a situação se encontra consolidada de modo a demonstrar que sua permanência com a avó paterna melhor atende seus interesses.”
Acórdão 1428081, 07112330220198070006, Relator: JOÃO EGMONT, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 1/6/2022, publicado no PJe: 11/6/2022.

Violência doméstica e familiar – indícios de situação de risco para a criança – proteção estatal necessária – adoção de medida protetiva

“1. As medidas protetivas de urgência são requerimento de proteção à vítima, diante de uma situação de risco. Elas se fundamentam não em prova cabal de um crime, mas em indícios suficientes de uma situação de risco. Assim, elas se guiam pelo princípio da precaução, da proteção integral e do melhor interesse do menor e pela máxima efetividade dos direitos fundamentais. (...) 4. Ainda que tenham sido deferidas, pelo Juízo Cível, as medidas de guarda unilateral provisória em desfavor do suposto ofensor e a suspensão de seu convívio com a infante, se evidenciada situação de risco e de eventual ilícito penal, as medidas protetivas de urgência devem ser deferidas até que se elucide, por completo, a questão criminal, ou até que a situação de risco não reste mais caracterizada, momento em que outras questões envolvendo a menor ficarão a cargo apenas do Juízo Cível. 5. RECLAMAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA para deferir medida protetiva de urgência de proibição de aproximação e contato do suposto ofensor (genitor) para com a vítima (filha), até conclusão de eventual processo criminal contra o genitor ou posterior decisão do Juízo Cível ou de Família, ou enquanto persistir a situação de risco.”
Acórdão 1423697, 07421756420218070000, Relator: ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 19/5/2022, publicado no PJe: 25/5/2022.

Consentimento paterno para matrícula escolar – possibilidade de suprimento – melhor interesse da criança

“2. No caso, o agravante insurge-se da tutela de urgência deferida, conferindo à agravada o suprimento do consentimento paterno para matrícula escolar do filho, cuja guarda é compartilhada com lar de referência o materno, conforme acordo judicial. 2.1. Diante da falta de entendimento entre os pais sobre a mudança de escola do menor, a solução deve guiar-se pelo princípio do melhor interesse da criança. A definição de um lar de referência atrai a fixação do lugar das atividades da criança o mais próximo possível de sua residência habitual, a fim de não prejudicar o infante com os constantes deslocamentos de longas distâncias para frequentar a escola, por exemplo. Daí, escorreita a decisão combatida ao autorizar a matrícula do menor em escola próxima de sua residência, a qual, inclusive pode atender às necessidades especiais da criança diagnosticada com TEA (transtorno do aspecto autista).”
Acórdão 1420478, 07353942620218070000, Relator: FÁBIO EDUARDO MARQUES, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 4/5/2022, publicado no PJe: 23/5/2022. 

  • STF

Vacinação obrigatória de crianças e adolescentes – ilegitimidade da recusa dos pais em vacinarem os filhos por motivo de convicção filosófica – genitores veganos

“1. Recurso contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) que determinou que pais veganos submetessem o filho menor às vacinações definidas como obrigatórias pelo Ministério da Saúde, a despeito de suas convicções filosóficas. (...) 3. A liberdade de consciência é protegida constitucionalmente (art. 5º, VI e VIII) e se expressa no direito que toda pessoa tem de fazer suas escolhas existenciais e de viver o seu próprio ideal de vida boa. É senso comum, porém, que nenhum direito é absoluto, encontrando seus limites em outros direitos e valores constitucionais. No caso em exame, a liberdade de consciência precisa ser ponderada com a defesa da vida e da saúde de todos (arts. 5º e 196), bem como com a proteção prioritária da criança e do adolescente (art. 227). 4. De longa data, o Direito brasileiro prevê a obrigatoriedade da vacinação. Atualmente, ela está prevista em diversas leis vigentes, como, por exemplo, a Lei nº 6.259/1975 (Programa Nacional de Imunizações) e a Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Tal previsão jamais foi reputada inconstitucional. Mais recentemente, a Lei nº 13.979/2020 (referente às medidas de enfrentamento da pandemia da Covid-19), de iniciativa do Poder Executivo, instituiu comando na mesma linha. 5. É legítimo impor o caráter compulsório de vacinas que tenha registro em órgão de vigilância sanitária e em relação à qual exista consenso médico-científico. Diversos fundamentos justificam a medida, entre os quais: a) o Estado pode, em situações excepcionais, proteger as pessoas mesmo contra a sua vontade (dignidade como valor comunitário); b) a vacinação é importante para a proteção de toda a sociedade, não sendo legítimas escolhas individuais que afetem gravemente direitos de terceiros (necessidade de imunização coletiva); e c) o poder familiar não autoriza que os pais, invocando convicção filosófica, coloquem em risco a saúde dos filhos (CF/1988, arts. 196, 227 e 229) (melhor interesse da criança). 6. Desprovimento do recurso extraordinário, com a fixação da seguinte tese: “É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, (i) tenha sido incluída no Programa Nacional de Imunizações, ou (ii) tenha sua aplicação obrigatória determinada em lei ou (iii) seja objeto de determinação da União, Estado, Distrito Federal ou Município, com base em consenso médico-científico. Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar”.” (grifamos)ARE 1267879/SP