Competência relativa – escolha abusiva ou aleatória de foro
Tema atualizado em 16/8/2023.
“4. A situação de abusividade produz como eficácia não apenas a ocorrência de eventuais consequências danosas ao alter do processo, mas é causa também de interferência no próprio ‘sistema de administração da justiça’. A abusividade pode ser configurada a partir da transgressão a um desses três dados axiológicos, ou seja: a) ao fim econômico ou social do direito envolvido; ou b) à boa fé; ou ainda c) aos bons costumes. 4.1. O que interessa ao exame do caso é o fim econômico ou social do direito subjetivo ou da pretensão exercida pela parte ao direcionar sua demanda à Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. 4.2. O denominado ‘fim econômico ou social’ da escolha da parte revela que deve ser observada também sua repercussão ‘coletiva’, ou metaindividual, ou seja, não só a dimensão individual e privatística dos interesses vislumbrados. 4.3. Os interesses legítimos juridicamente atribuídos às partes que têm seus domicílios em outras unidades da federação e escolhem causalmente, por meio da definição consensual do foro de eleição, a Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, podem sofrer, nesse ponto, o devido controle de funcionalidade, com a deliberação a respeito de sua ineficácia, sob o fundamento da eventual ocorrência de abuso de direito, à luz da regra prevista no art. 63, § 3º, do CPC. 5. Surge o caráter disfuncional, nesse caso, em virtude das várias peculiaridades que cercam a Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, devidamente articuladas na Nota Técnica CIJDF nº 8/2022. A nota técnica aludida evidencia o impacto ocasionado pela quantidade de ações ajuizadas nos últimos 5 anos (julho/2017 a julho/2022) envolvendo exclusivamente o Banco do Brasil, que é o segundo maior demandante no âmbito da Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.”
Acórdão 1739310, 07214378420238070000, Relator: ALVARO CIARLINI, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 2/8/2023, publicado no PJe: 15/8/2023.
Trecho de acórdão
“Não há nenhuma dúvida de que o critério de competência pelo domicílio é relativo. Todavia, como visto, esse fundamento, há muito é insuficiente para determinar, lógica e necessariamente, a impossibilidade de se declinar da competência relativa de ofício, ainda que antes da citação.
Por consequência, as Súmulas 33 do STJ e a Súmula 23 do TJDFT devem ser afastadas.
A Súmula 33 do Superior Tribunal de Justiça – STJ (‘A incompetência relativa não pode ser declarada de ofício.’), embora válida, é genérica, e, atualmente, na vigência do novo CPC, só se presta a ratificar a regra geral sobre a fixação da competência.
Na linha de raciocínio aqui exposta, também a Súmula 23 do TJDFT (‘Em ação proposta por consumidor, o juiz não pode declinar de ofício da competência territorial.’) deve ser afastada. Essa orientação não considerou a possibilidade de exercício abusivo de direito: escolha aleatória de foro sem qualquer vinculação jurídica com o pedido ou a causa de pedir do autor, ainda que consumidor.
Em juízo de ponderação das normas constitucionais e processuais aplicáveis à determinação da competência, conclui-se que a natureza relativa do critério de determinação da competência não autoriza a escolha aleatória de foro por parte do autor, seja ele consumidor ou não, quando tal procedimento implica indevido forum shopping.
O abuso de direito processual é matéria de ordem pública e, por isso, a possibilidade de declínio da competência de ofício, ainda que antes da citação, é medida essencial para o devido exercício da jurisdição.
O exercício abusivo de direito de escolha do foro, viola os critérios norteadores da fixação da competência no processo civil. Por isso, a competência, ainda que relativa, está sujeita ao controle jurisdicional.”
Acórdão 1736584, 07205015920238070000, Relator: LEONARDO ROSCOE BESSA, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 26/7/2023, publicado no PJe: 10/8/2023.
IRDR
IRDR 17 - Nas ações propostas contra o consumidor, é cabível a declinação da competência de ofício.
Enunciado
ENUNCIADO 89 da FONAJE – A incompetência territorial pode ser reconhecida de ofício no sistema de juizados especiais cíveis (XVI Encontro – Rio de Janeiro/RJ).
Nota técnica
Nota técnica 8/2022 do CIJDF - Incompetência territorial nas ações em que não há fator de ligação entre a causa e o foro local.
Acórdãos representativos
Acórdão 1739693, 07243472120228070000, Relatora: DIVA LUCY DE FARIA PEREIRA, 1ª Turma Cível, data de julgamento: 2/8/2023, publicado no PJe: 15/8/2023;
Acórdão 1738325, 07164068320238070000, Relatora: CARMEN BITTENCOURT, 8ª Turma Cível, data de julgamento: 1/8/2023, publicado no PJe: 15/8/2023;
Acórdão 1737885, 07189565120238070000, Relator: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, 1ª Câmara Cível, data de julgamento: 31/7/2023, publicado no DJE: 14/8/2023;
Acórdão 1737348, 07160490620238070000, Relatora: FÁTIMA RAFAEL, 3ª Turma Cível, data de julgamento: 27/7/2023, publicado no PJe: 11/8/2023;
Acórdão 1734573, 07400404520228070000, Relator: MARIO-ZAM BELMIRO, 4ª Turma Cível, data de julgamento: 20/7/2023, publicado no DJE: 4/8/2023;
Acórdão 1733379, 07154238420238070000, Relatora: SANDRA REVES, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 19/7/2023, publicado no DJE: 3/8/2023;
Acórdão 1730197, 07058139220238070000, Relator: ALFEU MACHADO, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 12/7/2023, publicado no DJE: 4/8/2023.
Destaques
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TJDFT
Foro da sede da pessoa jurídica – previsão legal – impossibilidade de declaração de ofício – entendimento divergente
“1. Diante de demanda de natureza pessoal, resta configurada a competência territorial relativa, que não admite o controle de ofício pelo juiz, nos termos do art. 65 do CPC e do Enunciado da Súmula n. 33 do STJ. 2. Em que pese domiciliado o Autor-Agravante em outro Estado da Federação, onde se concretizou o negócio jurídico, a parte optou pelo ajuizamento da ação no foro da sede da pessoa jurídica Ré, nesta Capital, em consonância com os arts. 46 e 53, III, ‘a’, do CPC. 3. A escolha da parte pela Justiça do Distrito Federal encontra amparo na Lei, logo não pode ser considerada ilegal ou aleatória. Precedente do Superior Tribunal de Justiça.”
Acórdão 1739133, 07170165120238070000, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 2/8/2023, publicado no DJE: 16/8/2023.
Validade da eleição de foro – inocorrência de abusividade
“II - O art. 63, §3º, do CPC disciplina que a incompetência relativa resultante de cláusula abusiva de eleição de foro pode ser conhecida de ofício pelo Juiz. III - A abusividade da cláusula de eleição de foro no contrato que embasa a execução não está manifestamente demonstrada nem há escolha aleatória de foro, razão pela qual é insuscetível de ser reputada ineficaz de ofício.”
Acórdão 1725004, 07208462520238070000, Relatora: VERA ANDRIGHI, 2ª Câmara Cível, data de julgamento: 3/7/2023, publicado no DJE: 14/8/2023.
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STJ
Cláusula de eleição de foro – reconhecimento de abusividade
“2. Este Tribunal Superior tem entendimento no sentido de que a cláusula do foro de eleição é válida e somente pode ser afastada quando, segundo entendimento pretoriano, seja reconhecida a sua abusividade, a inviabilidade ou especial dificuldade de acesso ao Poder Judiciário.”
AgInt no AgInt no REsp n. 1.294.929/SP, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 8/11/2018, DJe de 14/11/2018.
Veja também
Competência territorial – impossibilidade de declaração de ofício
Organização da Justiça – pacto federativo – competência absoluta
Referências
Artigos 53, III, 63, §§ 1ª, 3º 4º e 5º e 190 parágrafo único do Código de Processo Civil.
Artigos 6º, VIII, 51, XV e 101, I, do Código de Defesa do Consumidor.