Desconsideração da personalidade jurídica – teoria maior

última modificação: 2024-03-18T10:06:19-03:00

Tema criado em 29/9/2021.

“1. A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica deve ser excepcional, sendo a regra a preservação da autonomia patrimonial, devendo ser deferida quando presentes os requisitos do Art. 50 do Código Civil. 2. O ordenamento jurídico adotou a teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica a qual exige prova do desvio de finalidade da sociedade ou a confusão patrimonial entre o patrimônio dos sócios e o da sociedade empresária.”

Acórdão 1369154, 07090171820218070000, Relator: ROBERTO FREITAS, Terceira Turma Cível, data de julgamento: 31/8/2021, publicado no DJE: 17/9/2021.

Trecho de acórdão

“Como se sabe, a desconsideração da personalidade jurídica, derivada da disregard doctrine, consiste no afastamento temporário, ocasional e excepcional da personalidade jurídica da sociedade empresarial, a fim de permitir, em caso de abuso ou de manipulação fraudulenta, que o credor lesado satisfaça, com o patrimônio pessoal dos sócios da empresa, a obrigação não cumprida.

Acerca da desconsideração da personalidade jurídica, nosso ordenamento consagra duas teorias básicas para a responsabilização dos sócios: teoria maior e teoria menor. A primeira aplica-se ao caso de desvirtuamento da personalidade jurídica, ao passo que a segunda se caracteriza pelo simples inadimplemento das obrigações da sociedade. A teoria maior, por sua vez, subdivide-se em subjetiva e objetiva. Pela primeira formulação, a desconsideração requer o elemento fraude, enquanto que, pela segunda, basta que se demonstre a confusão patrimonial.

A legislação civil adotou a teoria maior, nas suas duas vertentes, conforme dispõe o artigo 50, do Código Civil (com a redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019), abaixo transcrito, litteris:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.

In casu, em se tratando de relação jurídica de natureza civil-empresarial, incide a teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica. Os requisitos previstos no artigo 50, acima transcrito, são assim caracterizados: o desvio de finalidade, pelo ato intencional dos sócios de fraudar terceiros com o uso abusivo da personalidade jurídica; a confusão patrimonial, pela inexistência de separação entre o patrimônio da pessoa jurídica e os de seus sócios.

Ainda em relação aos requisitos necessários à desconsideração, o Colendo Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que o encerramento irregular da sociedade aliado à falta de bens capazes de satisfazer o crédito exequendo não constituem motivos suficientes para a desconsideração da personalidade jurídica.

(...)

No caso, as razões levantadas pelo recorrente se limitam a sustentar que, além da não localização de bens penhoráveis, houve o encerramento irregular da sociedade devedora, fatos que, isoladamente considerados, não se ajustam aos conceitos delineados nos §§ 1º e 2º, do artigo 50, do Código Civil.

Acórdão 1353814, 07089375420218070000, Relator: ESDRAS NEVES, Sexta Turma Cível, data de julgamento: 7/7/2021, publicado no DJE: 19/7/2021.

Enunciado

Enunciado 146 da III Jornada de Direito Civil: "Nas relações civis, interpretam-se restritivamente os parâmetros de desconsideração da personalidade jurídica previstos no art. 50 (desvio de finalidade social ou confusão patrimonial)."

Acórdãos representativos

Acórdão 1370981, 07109693220218070000, Relator: ALVARO CIARLINI, Terceira Turma Cível, data de julgamento: 8/9/2021, publicado no DJE: 22/9/2021;

Acórdão 1370077, 07217224820218070000, Relator: ROMULO DE ARAUJO MENDES, Primeira Turma Cível, data de julgamento: 8/9/2021, publicado no DJE: 21/9/2021;

Acórdão 1368565, 07080584720218070000, Relator: ARQUIBALDO CARNEIRO PORTELA, Sexta Turma Cível, data de julgamento: 25/8/2021, publicado no PJe: 21/9/2021;

Acórdão 1367448, 07184868820218070000, Relator: DIAULAS COSTA RIBEIRO, Oitava Turma Cível, data de julgamento: 26/8/2021, publicado no DJE: 9/9/2021;

Acórdão 1365346, 07152659720218070000, Relator: ALFEU MACHADO, Sexta Turma Cível, data de julgamento: 18/8/2021, publicado no DJE: 3/9/2021.

Destaques

  • TJDFT

Desconsideração da personalidade jurídica – existência de indícios necessários a instauração do incidente

"1. A regulamentação processual do incidente de desconsideração da personalidade jurídica determina que ele será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, observados os pressupostos previstos em lei (art. 133, caput e § 1º, do CPC), sendo cabível o requerimento em todas as fases do processo (art. 134 do CPC), devendo demonstrar o requerente o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica. 2. Para a análise inicial do preenchimento dos pressupostos legais específicos para a desconsideração da personalidade jurídica almejada e a instauração do incidente, embora devam ser consideradas as variáveis insculpidas no art. 50 do Código Civil (teoria maior), com as alterações promovidas pela Lei nº 13.784/2019 ("Lei da Liberdade Econômica"), é suficiente a plausibilidade da argumentação tendente a demonstrar o desvio de finalidade ou confusão patrimonial e não é devida a incursão meritória e aprofundada acerca da definitiva configuração do abuso da personalidade jurídica. 3. Postulada a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, quando não se tratar de hipótese de manifesta ausência de legitimidade ou de interesse na pretensão, o exame inicial do pedido deve ser feito conforme a teoria da asserção e o seu mérito deve ser apreciado após a devida instrução processual, com a perfectibilização do contraditório. Dessa forma, estando presentes indícios do abuso da personalidade jurídica, o incidente processual deverá ser instaurado, sob pena de se dar causa a error in procedendo, de sorte que o julgamento definitivo acerca da desconsideração seja feito após a devida instrução processual." 

Acórdão 1820955, 07348523720238070000, Relatora: LUCIMEIRE MARIA DA SILVA, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 22/2/2024, publicado no DJE: 8/3/2024. 

Código de Defesa do Consumidor – óbice ao ressarcimento de prejuízos – teoria menor

“6. Extrai-se do artigo 28, §5º, do Código de Defesa do Consumidor que a sistemática consumerista adotou a Teoria Menor, admitindo a desconsideração da personalidade sempre que ela for óbice ao ressarcimento dos prejuízos causados aos consumidores, de forma diversa da posição adotada pelo Código Civil no seu art. 50, onde prevalece a Teoria Maior da desconsideração, em que se faz necessária a comprovação do abuso da autonomia jurídica, consubstanciada pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.”

Acórdão 1366614, 07122762120218070000, Relator: SANDOVAL OLIVEIRA, Segunda Turma Cível, data de julgamento: 25/8/2021, publicado no DJE: 13/9/2021.

Ausência de bens passíveis de penhora – não configuração de desvio de finalidade – impossibilidade de desconsideração da personalidade jurídica

“3. Não configura desvio de finalidade justificador de desconsideração da personalidade jurídica e penhora de bens pessoais do sócio para a satisfação de obrigações contraídas em nome da pessoa jurídica o fato de não terem sido encontrados bens passíveis de penhora em nome da empresa devedora.”

Acórdão 1363294, 07027104820218070000, Relator: MARIA IVATÔNIA, Quinta Turma Cível, data de julgamento: 12/8/2021, publicado no DJE: 24/8/2021.

Instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica – impossibilidade de indeferimento liminar

“2. Depois de instaurado o incidente, deve o juiz citar o sócio ou a pessoa jurídica para se manifestar e exercer o contraditório e a ampla defesa e, somente quando finalizada a fase instrutória, é que o magistrado resolverá o incidente por decisão interlocutória, razão pela qual se mostra cabível o deferimento da instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, ante a impossibilidade de seu indeferimento liminar.”

Acórdão 1359689, 07155343920218070000, Relator: MARIA DE LOURDES ABREU, Terceira Turma Cível, data de julgamento: 28/7/2021, publicado no DJE: 13/8/2021.

  • STJ

Confusão patrimonial – grupo econômico – responsabilização de empresa por dívida de outra

“2. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, uma vez ‘reconhecido o grupo econômico e verificada confusão patrimonial, é possível desconsiderar a personalidade jurídica de uma empresa para responder por dívidas de outra, inclusive em cumprimento de sentença, sem ofensa à coisa julgada’ (AgRg no AREsp 441.465/PR, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/06/2015, DJe de 03/08/2015).” AgInt no AREsp 1635669 / SP

Instauração do procedimento de desconsideração da personalidade jurídica – inexigência de localização de bens

“2. A inexistência ou não localização de bens da pessoa jurídica não é condição para a instauração do procedimento que objetiva a desconsideração, por não ser sequer requisito para aquela declaração, já que imprescindível a demonstração específica da prática objetiva de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial.” AgInt no REsp 1812292 / RO

Veja também

Incidente de desconsideração da personalidade jurídica - procedimento

O encerramento irregular de sociedade empresária é, por si só, causa suficiente para a desconsideração da personalidade jurídica no tocante às obrigações de natureza civil?

Teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica 

Referência

Artigo 50 do Código Cívil.