Fertilização in vitro – cobertura
Tema atualizado em 9/2/2022.
“1. A inseminação artificial e, consequentemente, a fertilização in vitro não são tratamentos de fornecimento obrigatório pelas operadoras de planos de saúde, nos termos do inciso III do art. 10 da Lei 9.656/98, bem como do inciso III do §1° do art. 20 da Resolução Normativa 428/2017 da ANS - Agência Nacional de Saúde.
2. A Lei 11.935/09, ao incluir o inciso III no art. 35-C da Lei 9.656/98, não revogou o inciso III do art. 10 da mesma norma, devendo-se promover a interpretação conjunta dos dois dispositivos em comento, de modo a considerar a limitação quanto à inseminação artificial como exceção aos procedimentos que envolvem o planejamento familiar.”
Acórdão 1318181, 07116663120188070009, Relatora: NÍDIA CORRÊA LIMA, Oitava Turma Cível, data de julgamento: 11/2/2021, publicado no DJE: 2/3/2021.
Trecho de acórdão
“Inicialmente, da análise do acervo processual, não se vislumbra a cobertura do pretendido procedimento de reprodução assistida – fertilização in vitro – no contrato de assistência médica estabelecido entre as partes.
Noutro giro, a legislação aplicável também não ampara a pretensão da agravante. O inciso III e parágrafo único, do artigo 35-C, da Lei 9.656/98, a qual regulamenta os planos e seguros privados de assistência à saúde, determinou como cobertura obrigatória as hipóteses de planejamento familiar, cabendo à ANS a regulamentação do dispositivo legal .[1]
Contudo, na linha do disposto no artigo 10 da mesma Legislação mencionada, a inseminação artificial não é procedimento de cobertura obrigatória. Veja-se:
“Art.10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto: (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001)
(...)
III - inseminação artificial;
(...)”
Regulamentando o tema, a Resolução Normativa n. 387/15, editada pela Agência nacional de Saúde, definiu o que vem a ser planejamento familiar, estabelecendo limites de atendimento. Transcrevo:
“Art. 8º As ações de planejamento familiar de que trata o inciso III do art. 35-C da Lei nº 9.656, de 1998, devem envolver as atividades de educação, aconselhamento e atendimento clínico previstas nos Anexos desta RN, observando-se as seguintes definições:
I – planejamento familiar: conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal;”
Ademais, a mesma norma regulamentar consignou expressamente ser permitida a exclusão da obrigatoriedade de cobertura para outras técnicas de fertilização não natural.
A saber, confira-se o teor do artigo 20, §1º, III, da aludida norma:
"Art. 20. A cobertura assistencial de que trata o plano referência compreende todos os procedimentos clínicos, cirúrgicos, obstétricos e os atendimentos de urgência e emergência, na forma estabelecida no artigo 10 da Lei nº 9.656, de 1998. § 1º São permitidas as seguintes exclusões assistenciais:
[...]
III - inseminação artificial, entendida como técnica de reprodução assistida que inclui a manipulação de oócitos e esperma para alcançar a fertilização, por meio de injeções de esperma intracitoplasmáticas, transferência intrafalopiana de gameta, doação de oócitos, indução da ovulação, concepção póstuma, recuperação espermática ou transferência intratubária do zigoto, entre outras técnicas;".
A título elucidativo, o método da inseminação in vitro consiste na fertilização do óvulo em laboratório. Após a fecundação, o zigoto é colocado no útero materno para que se desenvolva. Portanto, enquadra-se como uma das “outras técnicas” de concepção artificial, não sendo o caso de cobertura obrigatória pelas operadoras de saúde.
Deveras, a obrigatoriedade de custeio de ações voltadas ao planejamento familiar deve ter sua interpretação restrita às hipóteses catalogadas nos anexos da Resolução Normativa 387/2015 da ANS, não sendo ampliada a qualquer procedimento, sob pena de repercutir negativamente no equilíbrio econômico-financeiro do sistema de assistência privada à saúde, de forma a comprometer a própria existência dos planos de saúde e acarretar inevitável prejuízo aos segurados.
(...)
Ainda sobre o assunto, trago à baila o Enunciado 20 da I Jornada de Direito da Saúde do Conselho Nacional de Justiça, verbis:
A inseminação artificial e a fertilização “in vitro” não são procedimentos de cobertura obrigatória pelas empresas operadoras de planos de saúde, salvo por expressa iniciativa prevista no contrato de assistência à saúde.” (grifos no original)
Acórdão 1292138, 07211745720208070000, Relator: SANDOVAL OLIVEIRA, Segunda Turma Cível, data de julgamento: 14/10/2020, publicado no DJE: 28/10/2020.
Enunciado
Enunciado 20 da I Jornada de Direito da Saúde do CNJ: “A inseminação artificial e a fertilização in vitro não são procedimentos de cobertura obrigatória pelas operadoras de planos de saúde, salvo por expressa previsão contratual.”
Recurso repetitivo
Tema 1067 – “Salvo disposição contratual expressa, os planos de saúde não são obrigados a custear o tratamento médico de fertilização in vitro.” Resp 1822420/SP
Acórdãos representativos
Acórdão 1283032, 07124036420198070020, Relator: EUSTÁQUIO DE CASTRO, Oitava Turma Cível, data de julgamento: 10/9/2020, publicado no DJE: 23/9/2020;
Acórdão 1238671, 07051871220198070001, Relator: FERNANDO HABIBE, Quarta Turma Cível, data de julgamento: 18/3/2020, publicado no DJE: 4/5/2020;
Acórdão 1210539, 07364751220188070001, Relator: TEÓFILO CAETANO, Primeira Turma Cível, data de julgamento: 16/10/2019, publicado no DJE: 4/11/2019;
Acórdão 1202164, 07330775720188070001, Relator: SÉRGIO ROCHA, Quarta Turma Cível, data de julgamento: 18/9/2019, publicado no DJE: 25/9/2019;
Acórdão 1198496, 07300965520188070001, Relator: ALVARO CIARLINI, Terceira Turma Cível, data de julgamento: 28/8/2019, publicado no DJE: 16/9/2019.
Destaques
- TJDFT
Transplante de medula óssea em favor da filha - única chance de cura – transfusão de medula óssea do irmão – fertilização in vitro – possibilidade
“1. A autora/agravada foi diagnosticada como portadora de anemia falciforme (CID D 57.0). Extrai-se dos relatórios médicos a definição de que o Transplante de Células Tronco Hematopoiéticas (TCTH) Alogênico é o único tratamento possível à autora/agravada, ressaltada a urgência para a realização da fertilização in vitro.
2. Como bem posto pela decisão agravada, questão que não diz respeito a exclusivo planejamento familiar, “mas sim como ultima ratio para tratamento da doença que atinge a menor I.C.G.”, mormente em razão do fato de que “tanto a autora como seu marido João possuem traços de anemia genética, razão pela qual qualquer tentativa de gravidez pelos métodos tradicionais poderá gerar outro filho com anemia falciforme.”
3. De se ver que a Lei Federal 9.656/1998 define no artigo 1º, inciso II, “Operadora de Plano de Assistência à Saúde” a pessoa jurídica constituída sob a modalidade de sociedade civil ou comercial, cooperativa, ou entidade de autogestão, que opere produto, serviço ou contrato de prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais a preço pré ou pós estabelecido, por prazo indeterminado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência à saúde, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica, hospitalar e odontológica, a ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor. 3.1. Por sua vez, o art. 10 da Lei 9.656/98 instituiu um plano-referência de assistência à saúde, com cobertura de tratamentos das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde. A norma legal foi regulamentada pela ANS, a qual estabeleceu um rol de procedimentos e diretrizes de utilização para cobertura de procedimentos na saúde suplementar (atual RN 465/2021), dentre os quais, obrigatoriamente, a comorbidade que atinge a autora/agravada.
4. Frente ao fundamento básico da dignidade da pessoa e dos direitos constitucionais à vida e à saúde, rol que significa listagem de referência básica para estabelecimento de uma cobertura mínima obrigatória. É dizer, deve ser tida por nula de pleno direito cláusula contratual que frustre, no todo ou em parte, tratamento completo e necessário e que indicado por médico especialista como única forma de cura possível da segurada. 4.1. E, no caso, como visto, único tratamento para anemia falciforme que acomete a autora/agravada consiste na fertilização “in vitro”de embrião que com ela seja compatível.
5. Diante da prova documental que evidencia a necessidade e a adequação do tratamento proposto pelos especialistas que acompanham as autoras/agravadas, não cabe à seguradora fazer juízo de valor acerca do tratamento prescrito pelo profissional médico, razão por que inviável acolher-se, na presente sede, o singelo argumento de que tratamento excluído do contrato ou não previsto em regulamentação da ANS”. (grifos no original)
Acórdão 1375336, 07229887020218070000, Relator: MARIA IVATÔNIA, Quinta Turma Cível, data de julgamento: 29/9/2021, publicado no PJe: 7/10/2021.
Congelamento de óvulos – etapa de inseminação artificial – necessidade em razão de tratamento quimioterápico – infertilidade – negativa de cobertura – legítima
“2. O art. 10, inciso III, da Lei nº 9.656/98, ao instituir o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, excluiu das exigências mínimas de cobertura pelos planos privados o tratamento de inseminação artificial.
3. E, ao regulamentar o art. 35-C, inciso III, da Lei nº 9.656/98, a Agência Nacional de Saúde Suplementar editou a Resolução Normativa nº 428 de 2017, que, no art. 20, autoriza a exclusão da cobertura de tratamento de inseminação artificial.
4.O tratamento pretendido pela Autora, de congelamento de óvulos, configura-se como uma das etapas do tratamento da inseminação artificial, que deverá ser concluída apenas depois de finalizada a utilização de medicamento quimioterápico que impede a gestação.
5. Afigura-se legítima a negativa de cobertura do plano de saúde ao custeio do tratamento de inseminação artificial expressamente excluído do contrato celebrado entre as partes (cláusula 12.1.9), estando de acordo com a legislação aplicável à hipótese e com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal de Justiça.”
Acórdão 1294027, 07013432020208070001, Relator: Robson Teixeira de Freitas, Oitava Turma Cível, data de julgamento: 28/10/2020, publicado no DJE: 5/11/2020.
Portador de HIV – fertilização in vitro – cobertura obrigatória
“1. A apelante é portadora de ovário policístico e o autor é portador de HIV, sendo que não se mostra viável a concepção natural para criação da prole, sendo indicado por médico especialista a concepção in vitro com lavagem de sêmen, a fim de permitir a fecundação dos óvulos de forma segura tanto para a autora como para o eventual feto, contra a infecção pelo vírus HIV. (...).
4. O planejamento familiar é um direito fundamental, previsto constitucionalmente no §7º do art. 226 da CF. Trazendo a consumação desse direito, a Lei 11.935/2009 acrescentou o art. 35-C na Lei 9.656/98, tornando obrigatória a cobertura de procedimentos médicos voltados ao planejamento familiar, como a fertilização In Vitro, que é uma forma de efetivação desse direito.
5. Nota-se claramente que a autora incluiu em seu planejamento familiar a geração de descendentes e, nos termos do art. 226, §7º, da Constituição Federal c/c o art. 35-C, inciso III, da Lei 9.656/98, cabe à operadora de plano de saúde ré, através dos meios necessários, atender à sua pretensão, não podendo limitar coercitivamente o exercício desse direito.” (grifos no original)
Acórdão 1180262, 07178953120188070001, Relator: ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO, Quinta Turma Cível, data de julgamento: 19/6/2019, publicado no DJE: 27/6/2019.
Veja também
Negativa de custeio de fertilização in vitro por plano de saúde