Livro personalizado de adoção internacional ganha tradução para o italiano

por LC/SECOM/VIJ-DF — publicado 2017-02-13T12:55:00-03:00

 

Livros CDJA

O livro “Matemática do amor” traz em português e em italiano a história de quatro irmãos adotados por italianos

Toda pessoa tem uma história de vida a ser contada, seja ela triste ou feliz. Essa história é repassada de forma oral por pai, mãe e irmãos ou por registros documentais, como fotos e objetos significativos que revelam a biografia do núcleo familiar em que o indivíduo está inserido.

Mas a realidade de crianças e adolescentes vinculados às instituições de acolhimento (antigos abrigos) é diferente e repleta de lacunas. Dificilmente há possibilidade do resgate oral dessas histórias, e há ausência de objetos significativos e de espaços individualizados, o que acaba por inibir o autoconhecimento e a percepção dessas crianças perante os outros.

Para dar a esses meninos e meninas a chance de conhecerem melhor seu passado, a Comissão Distrital Judiciária de Adoção (CDJA), órgão ligado à Corregedoria do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), publica, desde 2012, livros personalizados que permitem às crianças e aos adolescentes em processo de adoção internacional fazerem o resgate individualizado de suas histórias de vida e prepará-los para a nova vida lá fora. Os livros fazem parte do projeto “Era uma vez...O recontar de uma história”, desenvolvido pela CDJA, e são entregues às crianças e às suas novas famílias estrangeiras, bem como às pessoas ligadas ao processo adotivo.

A grande novidade do projeto é que o último livro, “Matemática do amor”, lançado em dezembro último, trouxe em português e em italiano a história de quatro irmãos, com idades entre 3 e 13 anos, que foram adotados por dois casais do norte da Itália. A tradução foi feita pela voluntária Vitoria Agostini, que também atuou como intérprete em um outro processo adotivo. A secretária executiva da CDJA, Thaís Botelho, acredita que a versão em italiano permitiu eternizar a memória dessa família e facilitar a vida dos pais.

“Os pais em processo de adoção internacional geralmente se empenham em aprender o português, de maneira que a tradução não foi solicitada diretamente por eles. Mas já tivemos o depoimento de alguns que disseram que iriam traduzir o livro, com a ajuda dos filhos, para garantir que a história não se perdesse com o esquecimento gradativo que terão da língua materna”, destaca Thaís.

O processo de confecção do livro ajuda os meninos na compreensão de suas histórias de vida, já que a publicação é construída a partir do relato das vivências do próprio infante ou jovem, o qual compartilha com os técnicos seus sentimentos, suas lembranças da família biológica, as experiências na instituição de acolhimento, seus sonhos e projetos futuros. “Na CDJA, trabalhamos com o intuito de construir vínculos com os pequenos para ajudá-los na compreensão de suas trajetórias de vida. O cuidado com o quê se diz ou a forma como se diz também é reflexo da afetividade compartilhada. Precisamos falar uma linguagem que seja acessível a eles, e o livro narrativo, em formato de contos, nos ajuda a resgatar esse passado”, relata.

Para Thaís, o grande benefício do projeto é propiciar à criança ou ao adolescente um registro cuidadoso e afetuoso da sua vida pregressa e o anúncio do seu futuro, como a inserção em uma nova família e a mudança de país. “É a memória documentada, um arquivo que poderá ser acionado a qualquer tempo e de forma lúdica, prazerosa e, sobretudo, valorativa, que imprime relevo às experiências compartilhadas durante os encontros de preparação para adoção internacional”, afirma.

Thaís afirma que o projeto teve início de forma espontânea em 2012 quando, ao trabalhar com um grupo de quatro irmãos, percebeu que eles tinham dificuldades em falar sobre o seu passado. “Resolvemos escrever para eles na tentativa de que pudessem ouvir de outra forma alguns acontecimentos que viveram. Quando a história ficou pronta, uma das colegas sugeriu que fosse formatado um livro, com a possibilidade de inserir gravuras, tendo em vista a excelente qualidade do material. O resultado foi muito positivo. Os irmãos gostaram da surpresa e, de forma espontânea, presentearam os futuros pais. A partir daí, resolvemos experimentar com outras crianças”, conta.

De lá para cá, já são 11 livros publicados, sendo que os quatro últimos foram produzidos integralmente pelo TJDFT (ilustração e texto). A secretária diz que no início as figuras eram buscadas no Google, mas em 2015 foi realizada uma parceria com o Núcleo de Editoração e Reprografia do Tribunal (NUER), que se propôs a ilustrar o material, fato que enriqueceu sobremaneira a publicação.

Processo criativo

Como um fio de linha que vai bordando a história de cada uma dessas crianças, o processo de criação dos livros fica a cargo de toda a equipe da CDJA. Thaís diz que, por se tratar de um trabalho criativo, não tem como declinar um profissional específico para a atividade. Segundo ela, tudo vai depender do cotidiano dos atendimentos e da empatia estabelecida entre as crianças e os técnicos no período de cerca de oito meses, tempo que dura em média o processo de adoção internacional.

“No trabalho diário com as crianças é que surge, voluntariamente, o servidor que irá escrever. Alguns têm ideias a partir das intervenções. As crianças são surpreendentes e trazem histórias belíssimas. Basta registrar”, assegura.

Gratidão e reconhecimento

Ter a história do seu filho eternizada em um livro é motivo de gratidão por parte dos pais. Geralmente, a CDJA recebe elogios vindos não só deles mas também de parceiros e de autoridades. Todas essas pessoas reconhecem na publicação uma forma delicada e única de contar a história desses meninos. Há o caso recente de um pai que se propôs a “comprar” exemplares para enviar a pessoas que fizeram parte da sua história de adoção. Os livros são distribuídos gratuitamente para pais, crianças e autoridades vinculadas ao processo adotivo, não havendo possibilidade de compra.

Houve também a solicitação do material para a capacitação de pais pretendentes à adoção de crianças brasileiras, mas não foi possível disponibilizá-lo na época, tendo em vista que as ilustrações não eram do TJDFT.

Novas traduções

Enquanto novas publicações não ficam prontas – há um projeto em andamento e um estágio de convivência a ser iniciado em abril –, Thaís Botelho ressalta que, para dar continuidade a esse formato, precisará da ajuda de voluntários para os próximos livros, pois a tradução tornou-se um diferencial que enriqueceu o produto.

“Considerando que a criança passará a usar a nova língua como seu principal idioma, bem como em respeito aos pais que desejam se apropriar do conteúdo do livro, pretendemos contar com a ajuda de voluntários para as futuras publicações, assim como conseguimos da professora Vitoria, que fez a tradução com muito empenho e dedicação”, conclui.

Estatística e prevalência de adoção por italianos

Segundo dados da CDJA, o perfil de adotados por estrangeiros no Distrito Federal é constituído de crianças e adolescentes com idade média de 9 anos e pertencentes a grupo de irmãos. As famílias são casais acima de 40 anos, sem filhos e predominantemente italianos. Entre 2000 e 2016, a CDJA realizou 37 adoções internacionais, sendo 4 em 2015 e 7 em 2016. Os estrangeiros que se habilitam para adotar crianças no país sabem que o perfil é de crianças mais velhas e de grupos de irmãos.

Em 2015, houve adoções de três crianças por casais franceses. As demais foram realizadas predominantemente por casais italianos. Quanto à prevalência de italianos, a CDJA acredita que isso se deve ao fato de a maioria dos organismos internacionais credenciados no Brasil para atuar em adoções internacionais serem italianos (13 dentre 22 organismos).

Sobre a escolha do Brasil como o país de origem da criança, muitos representantes dos organismos italianos afirmam haver proximidade cultural entre os dois países e também segurança jurídica no processo de adoção no Brasil.