Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios

O olhar dos atores jurídicos sobre adoção

por LF e LC/SECOM-VIJ/DF — publicado 01/06/2017

Na reportagem de hoje da série “Os vários olhares sobre adoção”, o leitor conhecerá os olhares daqueles que, investidos como agentes do Sistema Jurídico Infantojuvenil, são peças-chaves para representar, impulsionar e decidir processos de destituição do poder familiar e de adoção. Magistratura, Ministério Público e Defensoria Pública, cada qual na sua função jurisdicional e essencial à Justiça, conduzem o feito até o seu desfecho, com vistas a definir a situação da criança e do adolescente, de acordo com seu superior interesse.

Assuntos como demora no processo de adoção, devolução de crianças e adolescentes pelas famílias adotivas, casos marcantes e sentimento de gratidão na atuação profissional são alguns dos temas abordados pelo defensor público Sérgio Domingos, do Núcleo da Infância e da Juventude da Defensoria Pública do DF; pela promotora Isabel Falcão Durães, titular da 2ª Promotoria de Justiça Cível e de Defesa dos Direitos Individuais, Difusos e Coletivos da Infância e da Juventude do DF; e pelo juiz de direito Renato Rodovalho Scussel, titular da Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal (VIJ-DF) e coordenador da Infância e da Juventude do DF. O magistrado concedeu uma entrevista exclusiva à Seção de Comunicação Institucional da VIJ-DF que se encontra na íntegra no final desta reportagem.

Hipossuficiência mitigada

Uma das portas de entrada dos processos relativos à adoção no DF é a Defensoria Pública do Núcleo da Infância e da Juventude. Desempenhando função essencial à Justiça, o defensor Sérgio Domingos diz que o Núcleo pode atuar em todas as causas que tramitam na VIJ-DF, independentemente da renda das partes, pois o requisito de hipossuficiência é mitigado, em face da prioridade absoluta conferida à infância e à juventude pela Constituição Federal, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e por tratados internacionais.

Conforme Domingos, a quase totalidade dos processos que envolvem adoção está vinculada ao Núcleo. As famílias que desejam se habilitar para adotar, mesmo podendo pagar advogados, costumam preferir a Defensoria, por reconhecerem no órgão a competência para atuar nas especificidades do processo, o que pode evitar atrasos.

Devolução pelas famílias adotivas

Uma das situações espinhosas com que a Defensoria lida é a devolução de crianças e adolescentes pelos adotantes, que acontece antes de transitar em julgado o processo de adoção. Apesar de serem raros os casos no Distrito Federal, segundo Domingos, as devoluções existem, especialmente nas adoções tardias, e confirmam a intenção dos postulantes de fazer uma espécie de “teste drive” com as crianças. “Isso, para mim, é uma frustração enquanto pessoa, pois percebo a falta de vinculação dos pais, que resolvem devolver o adotando com a justificativa da não submissão do adolescente a regras literais dos adotantes, por exemplo. Eles devolvem sob o álibi da não adaptação”, afirma.

Para a promotora Isabel Falcão, trata-se de uma triste realidade, em que todos os envolvidos sofrem intensamente, em especial, os adotandos, que vivenciaram as mais diversas violações de direitos em sua trajetória de vida. “A adoção frustrada representa confirmação da rejeição, da incapacidade para ser amado, com profundo impacto ao seu desenvolvimento emocional”, reflete.

Conforme a promotora, é preciso compreender que construir o vínculo de filiação não é fácil e nem se conclui com a finalização do processo judicial. “É longo o caminho a ser percorrido, e exige dos adultos que se dispõem a adotar preparo específico para adoção, maturidade emocional, superação das próprias carências afetivas e intensa disponibilidade emocional para aceitação e compreensão do outro, respeitando sua história”, afirma.

Para o defensor, o juiz e a promotora, a devolução impõe a necessidade de reflexão por parte do sistema de justiça e da sociedade. “Quando casos assim batem à porta, é momento de avaliar se houve falhas por parte dos envolvidos no processo, considerar o conjunto de fatores e rever procedimentos, com a finalidade de evitar novos abandonos, que são tão traumáticos para crianças e adolescentes já fragilizados”, pondera o juiz Renato Scussel.

Isabel propõe repensar os critérios para definição dos perfis pretendidos pelos adotantes e a consequente dificuldade para alcançá-los; método de identificação de famílias adequadas aos perfis das crianças e adolescentes; preparo das famílias e dos adotandos antes da apresentação; entre outras questões. A promotora entende ser fundamental que os requerentes à adoção participem de cursos preparatórios e de grupos de apoio pós-adoção.

Grupo de irmãos

Além da devolução, há outras mazelas no processo de adoção. É quase sempre dolorida a separação dos filhos de seus pais biológicos. São muitos os motivos que levam a essa ruptura familiar, como abordados nas reportagens anteriores desta série. Outra questão se apresenta igualmente sofrida: se para ter uma família adotiva é preciso separar grupo de irmãos. Opinar e decidir sobre essa demanda é tarefa que exige a conversão de olhares psicossocial e jurídico acerca dos elementos de cada situação.

Nas palavras do juiz e da promotora, é possível a separação, desde que atendido o superior interesse da criança e do adolescente. A promotora diz que, se no grupo há muitos irmãos ou há um ou mais adolescentes, se torna difícil a inserção de todos em um único núcleo familiar adotivo, diante da realidade do perfil desejado pelas famílias cadastradas. “Nesses casos, é possível a separação da fratria para que os irmãos possam ser inseridos em famílias diversas ou para que, ao menos, alguns exerçam o direito à convivência familiar, buscando sempre preparar os adotantes para manter o convívio e o vínculo afetivo entre os irmãos”, explica.

Demora no processo de adoção

O sistema de justiça, por vezes, sofre críticas pela demora nos processos de adoção. O juiz Renato Scussel fala acerca do tema em sua entrevista ao final desta reportagem. Sobre o assunto, a promotora Isabel Falcão levanta algumas questões. Ela diz que a percepção da demora pelos envolvidos é natural, pois há uma expectativa em concretizar seu projeto de vida rapidamente. Porém, Isabel alerta que a adoção pressupõe a destituição do poder familiar, e as normas processuais garantem o contraditório, a ampla defesa e o duplo grau de jurisdição. Assim, segundo ela, quando há contencioso, o trâmite processual exige mais tempo.

Isabel pontua que, sendo a adoção uma medida excepcional na impossibilidade da manutenção da criança ou adolescente na família natural ou extensa, a lei prevê oitiva dos genitores em audiência, inclusive quando estes não estão de acordo com o pedido. “Essa garantia torna o processo mais lento, em especial, quando é necessário expedir cartas precatórias para a citação e oitiva em outras comarcas ou os pais estão presos”, diz. Nesse último caso, reiteradas remarcações de audiências são realizadas quando há falta de escolta policial.

Ela também traz à tona a escassez de recursos humanos que permeia as varas da infância e da juventude de todo o País e impacta na celeridade processual. “É necessário fortalecer as equipes técnicas da VIJ-DF, com lotação de maior número de servidores. Tanto o processo de adoção quanto o de destituição do poder familiar dependem muito da atuação dessas equipes, as quais dispõem de número reduzido de servidores e inúmeras atribuições”, pontua.

Casos de adoção e gratidão

O defensor Sérgio Domingos está prestes a se aposentar, em dezembro próximo. Com 17 anos atuando na Justiça Infantojuvenil, quase completando a “maioridade” na área, ele conserva um olhar poético, mas não menos realista, sobre o instituto da adoção. Costuma dizer que “a adoção é o registro na lapela da alma da existência do amor”.

Nesse longo trajeto, o defensor relembra um caso de adoção em que atuou quando chegou ao Núcleo. Imbuído de seu dever constitucional de oferecer a prestação jurisdicional, ele envidou esforços para o sucesso da adoção de uma criança de 1 ano de idade por uma senhora. A despeito de entendimentos contrários, ele diz que acreditou na história e empregou forças para vencer as etapas processuais de habilitação e de cadastramento para adoção. No ano passado, a mãe o procurou na Defensoria Pública para mostrar a foto da filha e contar que ela já estava com 18 anos e acabara de ser aprovada no curso de Medicina. “Foi demais!”, comemora.

Domingos afirma perceber esse sentimento de gratidão na sua experiência diária, pois, segundo ele, o processo de adoção é muito intenso e traz vínculos irrevogáveis entre pais e filhos. “Talvez seja por isso que algumas pessoas sintam reconhecimento pelo sistema de justiça”, considera.

A mesma percepção é compartilhada pela promotora Isabel Falcão: “As famílias envolvidas no processo de adoção, em sua maioria, demonstram gratidão por estarem concretizando o sonho da paternidade ou da maternidade”.

A promotora conta uma dessas histórias marcantes:

“Um dos casos marcantes de adoção que acompanhei foi o da adoção tardia de dois irmãos, crianças próximas à adolescência, sem perspectiva de adoção por parte de famílias cadastradas para adoção e que apresentavam comportamento difícil na instituição em que se encontravam acolhidos. Os irmãos evadiam da casa frequentemente e geravam conflitos com a comunidade. Um de seus cuidadores, entretanto, olhou as crianças para além de seus problemas comportamentais e desenvolveu com elas profunda relação de afeto, vindo a pleitear sua adoção. Emocionei-me ao ler os relatórios das equipes técnicas envolvidas, descrevendo a construção dos vínculos de paternidade e filiação durante o estágio de convivência, com imensos desafios para pai, avó e filhos, mas permeados de afeto, compreensão e, principalmente, aceitação”.

O juiz Renato Scussel diz que muitas famílias externam sua gratidão por meio de palavras, cartas ou, até mesmo, presentes simbólicos. Ele conta que, há alguns anos, recebeu de um casal um quadro em reconhecimento ao seu trabalho e de sua equipe e o afixou na parede de sua casa.

Em seu gabinete, ele recebe algumas famílias que o procuram para dar notícias sobre a criança adotada anos atrás ou, após a finalização do processo de adoção, alguns pais querem agradecê-lo pela acertada atuação do Judiciário, que lhes permitiu vivenciar o exercício da parentalidade com todo amor e comprometimento. “A decisão mexe com a vida das pessoas. É gratificante ver que a pessoa aproveitou um momento diferente da vida dela e conseguiu construir outra história”, diz o magistrado.

Há espaço para essas alegrias nesse cenário de muito trabalho, comprometimento e inquietude, mesmo no intenso dia a dia do juiz. De segunda a sexta-feira, passam diariamente por sua mesa dezenas de processos que o impelem a decidir sobre o destino de crianças e adolescentes do DF. Vale dizer que tramitam na VIJ-DF quase oito mil feitos das áreas cível e infracional.

Desde que assumiu a titularidade da VIJ-DF, há 15 anos, Scussel já passou por várias mudanças de toda ordem, como novas rotinas de trabalho, decisões inovadoras e difíceis, desmembramento e criação de novas serventias infantojuvenis. Nas suas decisões, ele afirma que costuma formar seu convencimento com olhar atento ao comportamento atual da sociedade. Nos processos de adoção, por exemplo, ele foi um dos primeiros magistrados brasileiros a deferir adoção a família homoafetiva, reconhecendo o direito à filiação livre de qualquer preconceito.

Sobre essas e outras questões relacionadas à temática da adoção, o juiz Renato Scussel fala na entrevista a seguir.

ENTREVISTA COM O JUIZ TITULAR DA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DO DISTRITO FEDERAL

 

 

 

 

"Todos devem olhar para o tempo da criança antes de se concentrar no tempo do processo ou do adulto, pois aquele é urgente e é prioridade absoluta."

               

 

 

 

 

 

Como é o olhar do juiz da infância e da juventude para a adoção?

Diante dos olhares de todos os atores que participam do processo de adoção – Defensoria Pública, Ministério Público, equipe psicossocial, requerentes, criança, técnicos de entidades –, posso dizer que nós temos o olhar privilegiado porque conseguimos capitalizar todas essas visões sobre o processo.

Contudo, se por um lado ele é privilegiado, por outro é um dos olhares mais doloridos também, pois é o ponto de vista de quem dará uma definição a determinado processo, repercutindo na vida dos requerentes e, especialmente, da criança. É dolorido em face do distanciamento existente entre a família, os pretendentes à adoção, o processo e a criança, pois cada qual tem o seu compasso. E fazer com que caminhem com o mesmo objetivo, em um prazo razoável, para que todas as situações se adequem, é muito difícil.

É preciso seguir um ritual dentro do processo para levar a justiça a todos, seguindo todos os passos, como a necessidade de realizar estudos psicossociais, do preparo psicológico da criança, da preparação psicossocial e jurídica dos pretendentes e da destituição do poder familiar. A maior dificuldade é orquestrar toda a dinâmica de atos processuais com os sentimentos de expectativa e de ansiedade e com o respeito ao tempo e ao interesse da criança e do adolescente.

Até essa criança passar a conviver com uma família substituta, um longo caminho foi percorrido. Assim, embora o afeto já possa estar consolidado nos pais adotivos, a angústia é muito grande, pois eles querem uma definição da parte processual, e o tempo tem que correr.

Há críticas em relação à demora do processo de adoção. Vossa Excelência atribui a quê?

Em certa medida, essa crítica tem uma razão de ser, mas está destorcida e equivocada, pois o processo de adoção não é demorado. O que demora é o processo de destituição do poder familiar, ou seja, a definição jurídica da situação da criança. Até a criança chegar a esse ponto, um caminho foi trilhado, pois a legislação estabelece que ela deve ficar no seio de sua família biológica, com pais ou parentes mais próximos. A própria família extensa demora a se mobilizar para ficar com a criança, e as entidades de acolhimento têm grande dificuldade, de ordem estrutural, para acompanhar cada caso ou se posicionar de uma forma adequada, a fim de dizer se a criança está apta a retornar à família ou não. Com essa demora, a criança acaba penalizada e se torna vulnerável aos riscos de abuso, de maus-tratos, de abandono, e a infância vai passando.

O senhor acha que a escolha do perfil é também um fator que aumenta o tempo de espera para concretizar a adoção?

Eu entendo que todo interessado em adotar tem o direito a querer uma criança menor ou maior para iniciar o seu vínculo afetivo. Entretanto, é preciso que ele esteja ciente de que, quanto menor a idade da criança, mais difícil e demorado será para concretizar a adoção, pois a maioria das pessoas também compartilham do mesmo desejo. Então, o processo atrasa porque aumenta o prazo de espera na fila do cadastro até que chegue aquela criança com o perfil desejado.

As mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente propostas pelo Projeto de Lei 5.850/2016, em trâmite na Câmara dos Deputados, ajudarão a acelerar o processo de adoção? 

Ajudará um pouco, ao estabelecer prazos e parâmetros. Mas já temos um prazo para o processo de destituição do poder familiar, que é de 120 dias. Entretanto, a estrutura do Poder Judiciário, na maioria das varas da infância, não possibilita que isso aconteça dentro do prazo, o que se deve, em grande parte, à carência de servidores ou de magistrados para conduzir o processo. São determinações ainda não atendidas, mas já existem algumas balizas para nos orientar, como, por exemplo, a de que a criança só deve ficar acolhida institucionalmente por no máximo dois anos.

Aqui na VIJ-DF, por exemplo, estamos com um fluxo de trabalho diferenciado com as instituições. Ao invés de realizarmos a audiência de reavaliação a cada seis meses, eu designo a audiência de apresentação do Plano Individual de Atendimento já no começo do processo de acolhimento, estabelecendo parâmetros. Se vislumbramos o retorno da criança à família, nós iremos trabalhar essa possibilidade em prazo já previamente determinado. Caso contrário, vamos trabalhar para encaminhar à adoção.

Com essa dinâmica, observamos que, na audiência de apresentação, a equipe técnica da instituição de acolhimento já se reuniu com a rede de atendimento (conselhos tutelares, CREAS, família). A rede está toda mobilizada. Isso representa um plano de voo para traçar o atendimento daquela criança. Se tudo sair como planejado, então, em seis meses, já teremos uma definição a respeito daquela criança: se ela vai para adoção ou não. Evidente que há exceções, mas esse fluxo dá o compasso ao processo.

Quando uma criança é acolhida, é obrigação de sua família se mobilizar o máximo possível para que ela retorne ao seu convívio. No entanto, vemos crianças que sequer são visitadas por seus familiares. Não é a questão de miserabilidade que causa o abandono da criança. Há outras questões intrínsecas.

O aprimoramento do Cadastro Nacional de Adoção (CNA) pelo grupo de trabalho do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é fator apto a acelerar as adoções no País?

O CNA é uma peça informativa de troca de informações entre os juízes e entre os requerentes. É interessante para o juiz que essa ferramenta esteja em plena operacionalidade, pois pode auxiliar muito no seu trabalho.

Porém, não se resolve problemas de adoção com o cadastro, como alguns podem pensar. Trata-se de um instrumento para facilitar os processos, informar e servir de base para a atuação judicial.

Pode-se dizer que o grande problema da adoção não é cadastro, mas a demora do processo de destituição familiar, a demora em definir a situação jurídica da criança: se ela vai retornar à família biológica ou se será disponibilizada para adoção. Até chegar a esse ponto, há muitos recursos e posicionamentos diversos.

Como se forma o convencimento de Vossa Excelência ao decidir um processo de habilitação de uma família para ingressar no cadastro?

Primeiro eu levo em conta os pareceres legais, observando os requisitos que a lei estabelece. Depois passo aos pareceres psicossociais, que é o olhar sobre a dinâmica dos requerentes, da família, e a possibilidade ou não da inserção de uma criança no contexto familiar dos pretendentes à adoção.

É preciso sempre olhar para frente, para os costumes da sociedade, para o nosso dia a dia; observar como a sociedade está se comportando e como as pessoas estão se relacionando. Além dos costumes, o bom senso também é essencial. Então não há um padrão fixo de comportamento, de conduta ou relacionado ao perfil da pessoa.

Como é decidir sobre a separação de grupos de irmãos para fins de adoção?

Antes de tudo, o critério é o superior interesse das crianças. O juiz deve focar sua decisão nesse princípio. A dificuldade maior é saber qual é o interesse de cada criança ou adolescente: ficar com o irmão ou ter uma família? Tem que sopesar os vínculos fraternos e considerar a opinião deles também.

É preciso coletar elementos no processo para formar o convencimento da decisão. Pode ser um depoimento ou uma entrevista com a equipe psicossocial, um histórico das crianças dentro da entidade de acolhimento e, sendo possível, a realização da oitiva pessoal das crianças, sempre vislumbrando seu interesse.

Por outro lado, deve-se ter a convicção de estar fazendo o melhor por aquele menino ou menina. Cercar-se de confiança e fé de que aquela decisão é a melhor, pois sempre haverá um contraponto. Nós não definimos o futuro da criança, mas as suas possibilidades de futuro.

Vossa Excelência está à frente da VIJ há 15 anos. Nesse tempo, o seu olhar para a adoção modificou?

Mudou bastante, especialmente no que diz respeito ao olhar psicossocial dentro do processo, sempre no sentido de observar se houve a formação de vínculos afetivos da criança com a família. Há campanhas nesse sentido, inclusive do Conselho Nacional de Justiça, que vem trazendo esse tema em mídia nacional, a fim de esclarecer quanto aos dados de crianças acolhidas em entidades e o número de crianças disponíveis para adoção. Aos poucos, foi-se desmistificando o sonho da adoção romantizada para explicar aos pretendentes que adotar é, antes de tudo, formar vínculo afetivo de filiação. São filhos do coração. Esse é o requisito básico que procuro seguir na minha atuação.

Em uma visão nacional do senhor, como presidente da Associação Brasileira dos Magistrados da Infância e da Juventude – Abraminj, e já tendo sido presidente do Colégio de Coordenadores da Infância e da Juventude, o que precisa melhorar em termos de processo de adoção?

Diminuir o tempo do processo – com desburocratização, virtualização –, cumprir prazos, aumentar o efetivo das varas da infância e da juventude – tanto de juízes como de servidores –, estruturar melhor as entidades de acolhimento para que se adequem à elaboração de estudos psicossociais, pois, quanto mais cedo detectamos a situação da criança, melhor é para a sua definição jurídica.

Por fim, eu entendo que todos devem olhar para o tempo da criança antes de se concentrar no tempo do processo ou do adulto, pois aquele é urgente e é prioridade absoluta. Quando todos nós tivermos essa visão conjunta e conseguirmos decidir a situação jurídica da criança dentro do tempo dela, serão solucionados, em grande parte, os problemas da adoção. 

Saiba mais

Para ler as outras matérias da série, clique nos títulos:

O desejo de adotar e a realidade do cadastro de adoção

Reintegração familiar ou adoção: alternativas e desafios nas instituições de acolhimento

Adoção internacional garante o direito de mais uma criança à convivência familiar