VIJ/DF orienta como realizar denúncias de violência sexual, respeitando o sigilo de crianças e adolescentes

por Daphne Arvellos Dias - ACS — publicado 2020-08-25T14:05:31-03:00
Ação conjunta da sociedade e da rede de proteção infantojuvenil combate situações de violência sexual contra crianças e adolescentes que continuam ocorrendo no país. É necessário denunciar os possíveis casos ao órgão competente mantendo o sigilo a terceiros para resguardar a criança. “Se estamos vendo alguma situação suspeita de violência, então temos o dever de notificar. A violência prospera e funciona por meio do silêncio. Para romper com o ciclo de violência, é necessário dar voz e visibilidade a esse problema”, explica Reginaldo Torres, supervisor do Centro de Referência em Violência Sexual da Vara da Infância e da Juventude do DF (CEREVS/VIJ-DF). 

Violencia sexual - denuncieA primeira providência é fazer com que a ameaça pare e a criança ou o adolescente seja protegido. Denúncias podem ser feitas diretamente ao Conselho Tutelar da região de moradia (clique aqui para acessar a lista com e-mails e telefones de plantão) ou à Coordenação de Denúncias de Violação dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cisdeca) – de segunda a sexta, plantão das 18h às 8h; sábado, domingo e feriados, 24 horas – por meio dos números (61) 3213-0657, 3213-0763 ou 3213-0766, ou ainda pelo e-mail cisdeca@sejus.df.gov.br. Há também os canais Disque 100 e Disque 180, que acolhem notificações de violações de direitos de públicos mais vulneráveis, como crianças, adolescentes e idosos, entre outros grupos. As notificações podem ser anônimas.

Como identificar a violência 

Os efeitos da violência se manifestam em indícios físicos, emocionais e comportamentais. Um olhar atento a crianças e adolescentes ao nosso redor é uma forma de ajudar no enfrentamento da violência contra eles. “Para ter acesso a essas evidências, é preciso que estejamos mais próximos (afetivamente) e genuinamente interessados em sua proteção. Isso porque as vítimas de violência são pressionadas a manter em segredo as violações”, explica Reginaldo. Apesar de o cenário atual limitar a proximidade física, ele reforça a importância da proximidade emocional, mediada pelas novas tecnologias. “Em um contexto de distanciamento social, os recursos tecnológicos devem ser usados a este favor: telefonar para as famílias que podem precisar de ajuda, fazer videochamadas, usar aplicativos de mensagens”, sugere.

Reginaldo Torres indica que a violência pode se manifestar por meio de marcas físicas; falas que indiquem que a criança ou o adolescente esteja mais triste, com medo e ansioso, além do usual; comportamentos sexualizados não próprios da idade. “É importante lembrar que um sinal preocupante para a violência é a recusa de adultos em deixar que outras pessoas, às vezes da própria família, tenham acesso a alguma criança ou adolescente em risco. Isso para evitar que a situação seja revelada”, completa Reginaldo.

Sigilo

“Quando a criança ou adolescente revela a situação para alguém, espera que a violência pare, conta com o apoio dessa pessoa. Se a situação passa a ser do conhecimento de outras pessoas, sua vida é exposta, é muito prejudicial. Por isso o sigilo é fundamental”, pondera Reginaldo Torres. O servidor explica a importância de apenas a pessoa a quem foi confidenciado o abuso ou violência e os atores do sistema de proteção terem acesso aos fatos. “Só quem deve ter conhecimento do conteúdo dessa narrativa são as pessoas necessariamente implicadas no processo de proteção da criança e de responsabilização do autor da violência”, esclarece.

Para compartilhar a violência com alguém em busca de ajuda, primeiro a criança deve se sentir segura, já que a maioria das situações partem do abuso de uma outra relação de confiança, por vezes intrafamiliar. “A situação de abuso normalmente começa de forma lenta e progressiva, com base na confiança que a criança tem em relação ao adulto. Quando essas situações vão se desenvolvendo, prolongando no tempo, é que a criança começa a perceber aquele relacionamento como algo estranho”, diz Torres. Além da relação anterior de confiança, os abusos por vezes são acompanhados de ameaças para garantir que a situação não seja revelada. “Ela vai ficando no estado de ambivalência, não consegue imaginar como sair da situação. Nem sempre o único sentimento em relação ao agressor é de medo”, completa. Com isso, a criança entra em um estado de aprisionamento por meio do silêncio.

Proteger em sentido amplo implica também se preocupar com os efeitos sofridos após a situação de violência. A partir da denúncia, o caso chega à rede de proteção da criança, quando também deve ser eivado de sigilo. Além disso, a Resolução CNJ n. 299/2019 garante condições especiais para que as crianças e os adolescentes vítimas ou testemunhas de violência possam ser ouvidos nos feitos judiciais em locais apropriados, devidamente assistidos por profissionais especializados. O objetivo é resguardar a intimidade do depoente e evitar a reiteração de depoimentos que aumentem o seu sofrimento.

Para escutá-los e chegar a informações que fundamentem uma decisão sobre os possíveis causadores dos danos sem revitimização, a narrativa é colhida por meio do depoimento especial, técnica humanizada para oitiva de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência e abuso sexual. Um método de entrevista semiestruturado, flexível e adaptável ao nível do desenvolvimento da criança e do adolescente, o Protocolo Brasileiro de Entrevista Forense (PBEF), foi lançado em julho deste ano para facilitar essa escuta protegida. A testagem para validação do protocolo foi realizada no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), no Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) e no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). A pesquisa de adaptação e validação do PBEF contou com a consultoria científica do supervisor do CEREVS. Apesar de obrigatório a partir de 2017, o depoimento especial é uma realidade no TJDFT desde 2010, quando ainda era uma recomendação do CNJ. Saiba mais aqui.