A Tecnologia da Informação e Comunicação – TIC no Âmbito do Poder Judiciário – Atividade-Fim ou Atividade-Meio - Mauro Brant Heringer

por ACS — publicado 2013-03-18T09:15:00-03:00

Artigo publicado no site do TJDFT, página da Imprensa em Artigos, em 18/3/2013.

 
Mauro Brant Heringer*

A cada dia, somos mais complexos e tecnológicos em nossas atividades contemporâneas, que prescindem cada vez mais da tecnologia da informação e comunicação, as chamadas TICs. Somos, como nunca fomos antes, incorporados aos avanços desse campo do conhecimento humano, que faz parte da nossa vida doméstica e profissional.

Comumente escutamos expressões ou frases de impacto que dizem sermos dependentes laborais da tecnologia da informação, que precisamos dela para conseguir mais eficiência no nosso dia a dia e que é quase impossível não estarmos conectados a uma determinada tecnologia ou mesmo dependentes dela.

Uma pergunta que surge é:  se uma coisa é tão importante para nossas vidas e para nossas profissões, torna-se ela nossa atividade-fim ou o meio pelo qual alcançaremos o nosso objetivo? Se a tecnologia da informação e comunicação é tão imprescindível para nosso dia a dia doméstico e também laboral, podemos inferir que a tecnologia da informação é a atividade-fim ou não? Ou ela é e sempre será um importante suporte para conseguirmos melhorar a eficiência humana?

Diante dessa mistura que permeia quase todos os campos da vida humana, dos hábitos tecnológicos, das facilidades que nos trazem uma boa tecnologia da informação e comunicação, somos tendentes a dizer que sim: ela – a TIC é uma atividade finalística, pois está em nosso fim último.

Uma tendência que surge em recente tempo é aquela que sugere que nos órgãos públicos e, especificamente, nos Tribunais e CNJ, as TICs devem se situar na esfera de atividade-fim. Observam-se sugestões no sentido de que as TICs deveriam estar ligadas estruturalmente à Presidência dos Tribunais de Justiça.

Este fenômeno recente deve ser debatido, pois é importante para a administração judiciária. Infere-se, portanto, conceituar o que é atividade-fim e atividade-meio para fins da administração pública, e nela inserida a administração judiciária.

As expressões atividade-fim e atividade meio originaram-se no âmbito do Direito do Trabalho[1] para distinguir as atividades diretamente relacionadas às finalidades institucionais de uma determinada empresa, o seu objeto social, daquelas que lhes fossem instrumentais, acessórias, auxiliares à sua persecução.[2]

O mestre Hely Lopes Meirelles já dizia há muito tempo que as competências da Administração Pública podem ser classificadas como:

“serviços públicos próprios ou impróprios, enquanto aqueles consubstanciam atividades típicas de Estado, e, por isso, absolutamente indelegáveis (ex.: poder de polícia, definição de políticas públicas, etc.); estes caracterizam serviços de interesse comum, que, embora relevantes, podem ser prestados diretamente pelo Estado, ou, indiretamente, mediante concessão, permissão ou autorização(ex.: serviços de telecomunicações, energia elétrica, transporte, etc.), mas não por meio de terceirização”

Tendo em vista a modernização do aparato administrativo, sobretudo após o advento da Reforma Administrativa do Estado, esses conceitos passaram a ser afetos à Administração Pública.

Os Tribunais de Contas que se debruçam rotineiramente sobre o tema já se manifestaram que[3]:

— atividades-fim são aquelas constitucionalmente atribuídas aos poderes constituídos e legalmente distribuídas e cometidas a cargos existentes na estrutura de seus entes, impassíveis, portanto de atribuição a particulares (salvo aquelas delegáveis, nos termos das Leis n. 8.666/93 e 8.987/95);

— atividades-meio são aquelas instrumentais, acessórias, concebidas e perpetradas única e exclusivamente para concretizar as finalidades institucionais do ente — atividades-fim.

Desta forma, não podemos substituir ou terceirizar a atividade jurisdicional que é de reponsabilidade do Poder Judiciário e  de todos seus órgãos componentes incluindo o Conselho Nacional de Justiça, uma vez que os entes federativos têm as suas competências materiais estabelecidas na própria Constituição da República.

Ao contrário, mesmo sendo relevantes para o Estado, as atividades relacionadas às TICs podem ser prestadas indiretamente e serão uma faculdade a ser exercida com mais ênfase ou não, conforme as  características administrativas e as variáveis financeiras de cada Órgão do Poder Judiciário, aferindo-se, portanto, que as TICs compõem o grupo de atividades-fim para efeito conceitual no campo da administração judiciária.

Balizado o problema inicial, é importante indagar também qual é o melhor lugar de uma determinada estrutura organizacional administrativa judiciária para se inserirem unidades de tecnologias da informação e comunicação, se no bojo das unidades técnico-administrativas ou no âmbito da presidência dos Tribunais, nas áreas táticas e operacionais ou nas áreas estratégicas.

 Creio que neste particular não interessa muito a discussão de onde no organograma do órgão judiciário estarão ligados os setores administrativos que cuidam das TICs, ou qual será o melhor lugar para estarem inseridos. O ponto nodal desse segundo problema está muito mais afeto à eficiência administrativa no gerenciamento das TICs, no saber fazer bem feito, de ter competências e no contínuo investimento em treinamentos/capacitações, do que em aspectos burocráticos e políticos que são discutidos bienalmente no Poder Judiciário.[4]

Encontramos em literaturas técnicas da administração, distinções mais claras de como organizar setores internos de uma empresa ou organizações, apontando que a sua organização deve-se dar, em princípio, sob a égide finalística e a de suporte que são caracterizadas caso a caso.

O certo é que tanto nos setores privados como públicos, o importante mesmo é que cada vez que os dirigentes ou responsáveis diretos pela empresa ou organização olharem diretamente a sua Gestão, para o seu negócio ou para as suas responsabilidades administrativas, preocupando-se com o cotidiano da administração que lhes é afeto e participando efetivamente dos desafios do seu tempo, mais conhecerão as soluções possíveis para os problemas que surgirão e assim  se resguardarão da necessidade contínua de delegações de competências, em confiar passivamente no que é simplesmente dito e que muitas vezes não é explicado.

Destarte, por todo o exposto, impõe-se afirmar que os setores competentes para desempenhar atividades relacionadas às tecnologias da informação e comunicação são unidades que desempenham em sua essência uma atividades-meio.  Estes setores podem estar inseridos em estruturas orgânicas conforme a posição política institucional e isso não é o que fará o diferencial de um bom ou mal serviço prestado. Estando o setor responsável pela TIC presente na esfera tática e operacional ou na esfera estratégica da Organização, o que importa ao final é que os tomadores de serviços – usuários internos ou externos recebam com efetividade o que foi proposto realizar.

 

[1] Martins, Sérgio Pinto. A terceirização e o Direito do Trabalho. 4. ed. são Paulo: atlas, 2000, p. 13.

[2] Técnica aplicada das abordagens contemporâneas da Administração voltada a eliminar a burocracia corporativa desnecessária e focada no centro da pirâmide hierárquica, a área de recursos humanos. PEREIRA, Maria Isabel; FERREIRA, Ademir Antônio; REIS, 
Ana Carla Fonseca. Gestão empresarial: de Taylor aos nossos dias. são Paulo: Pioneira, 2001.

[3] revista do tribunal de contas do estado de minas gerais abril | maio | junho 2010 | v. 75 — n. 2 — ano XXVIII

[4] Prazo temporal da Gestão dos dirigentes (autoridades) nos Tribunais – dois anos.

 

*Servidor do TJDFT, Mestre em Poder Judiciário, Especialista em Gestão da Informação, Analista Judiciário do TJDFT e Coordenador Acadêmico de Pós-Graduações em Direito, na modalidade EAD.