A Legitimidade para propositura da transação penal nas ações de iniciativa privada no âmbito dos Juizados Especiais Criminais - Parte III - Monaliza Costa de Souza

por ACS — publicado 2006-10-05T00:00:00-03:00
1.2.2.3 AÇÃO PENAL PRIVADA EXCLUSIVA

Parte III

Ação penal privada exclusiva é aquela promovida por meio de queixa-crime proposta pela vítima (ofendido) ou seu representante legal , conforme os casos descritos no Código de Processo Penal: morte do ofendido, estar o ofendido declarado ausente por decisão judicial, for menor de 18 (dezoito) anos, mentalmente enfermo, retardado mental, como expresso nos artigos 31 e 33.

Além disso, o Rogério Greco muito bem coloca que ?[...] Embora o Estado sempre sofra com a prática de uma infração penal [qualquer que seja], pois que o seu cometimento abala a ordem jurídica e coloca em risco a paz social, existem situações que interessam mais intimamente ao particular [...]? , e é, por isso que existem as ações de iniciativa privada.

O interesse particular, então, prevalece nos institutos que irão definir, contextualizar, e regrar, a condução deste tipo de ação.

1.2.2.4 AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA AÇÃO PENAL PÚBLICA

A ação penal privada subsidiária da pública, por sua vez, trata-se da ação intentada pelo particular ofendido cuja lesão ou ameaça a direito encontrava-se no rol daquelas cujo Estado é responsável por intentar ação penal pública, e que, dentro do prazo legal não o fez (artigos 100, § 3º, do Código Penal, e 29 do Código de Processo Penal).

A Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LIX diz que ?será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal?. Esta norma vem socorrer o particular, dando-lhe a possibilidade de manifestar-se ante a omissão do Estado/Ministério Público, o que, simplificadamente, é uma garantia de que se faça justiça sobre o fato ocorrido.

Ainda nesse sentido, o artigo 29 do Código de Processo Penal vem esclarecer que, ocorrendo ação penal privada subsidiária da pública, cabe ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia substitutiva. A intervenção do Ministério Público durante todo o processo, fornecendo provas, interpondo recurso e tomando a frente como parte principal no processo, em decorrência de negligência do querelante, reflete o que já foi anteriormente dito, sobre serem as ações penais públicas de interesse eminentemente público e merecem, portanto, constante preocupação do Estado. A ação penal, que por sua origem, é de iniciativa pública, quando iniciada por um particular, como é o caso, passa a orientar-se pelos princípios que regem a ação privada, por isto, neste caso o Ministério Público atua fiscalizando suas ações .

O prazo para o particular oferecer queixa-crime, em substituição à denúncia, só começa a correr caso haja desídia, inércia do Ministério Público, e, a partir desse momento segue as regras das ações privadas, tal como expresso nos artigos 103 do Código Penal, e 38 do Código de Processo Penal.

Além disso, só é dada a oportunidade ao particular de se manifestar caso o Ministério Público nada tenha feito para levar o fato à análise jurisdicional. Não se considera como causa para intentar ação privada subsidiária da pública, nas palavras de Rogério Greco, quando o Ministério Público: solicitar o arquivamento do inquérito policial; requerer diligências importante para esclarecer questões indispensáveis ao oferecimento da denúncia, e, para isto, retornar os autos à delegacia de polícia. Porque desta forma o Ministério Público estará sim dando continuidade a questão, não estará inerte, podendo arquivar autos que não tenham indícios suficientes de autoria ou materialidade ou pode requerer diligências caso entenda que haja indícios de autoria e materialidade, mas sejam necessários esclarecimentos a cerca do fato para prosseguir com a ação.

1.2.2.5 AÇÃO PENAL PRIVADA PERSONALÍSSIMA

Na ação penal privada personalíssima a proposta de queixa cabe apenas ao ofendido, ou seja, é intransferível, não sendo possível nem mesmo a intervenção de representante legal, ou sucessão no caso de morte (quando resta extinta a punibilidade do ofensor) ou ausência. Resta, então, aos incapazes, que em outros tipos de ação são representados, aguardar a cessação da incapacidade e, por isso, a decadência para eles não corre, uma vez que estão impedidos de exercer seu direito .

Com o advento da Lei nº 11.106, de 28 de março de 2005, operou-se a revogação do artigo 240 do Código Penal, que definia o crime de adultério. Atualmente, apenas é cabível a ação penal privada personalíssima para o crime de induzimento a erro essencial ou ocultação de impedimento para casamento, constante do artigo 236 do Código Penal, que em seu caput descreve o crime como ?Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe impedimento que não seja casamento anterior?.

Neste tipo de ação, a queixa depende exclusivamente do contraente enganado, e só pode ser intentada após o trânsito em julgado da sentença que por motivo de erro ou impedimento anulou o casamento (parágrafo único, do artigo 236, do Código Penal). É este, portanto, o momento em que começa a correr o prazo para a propositura da ação.

Neste contexto, conforme visto, as ações penais, apesar de constituírem em várias formas, em regra têm como titular do direito de agir o Ministério Público, na figura do Promotor de Justiça, excepcionalmente o conferindo à parte lesada no que tange às questões cujo mal maior possa vir a ser o mal do processo, ao invés do mal do crime, pelo que, então, nomeia-se tal ação peculiar com o nome de ação penal de iniciativa privada. Após iniciado o curso da ação privada, mesmo assim, há dependência da tutela jurisdicional, e, por isso, nos atos realizados não há que se excluir por completo a atuação do Ministério Público. Destaque-se a relevância de se ter em mente tal conclusão, uma vez que permeará os demais capítulos deste.

Estas ações também são utilizadas não só no processo comum/ordinário como nos Juizados Especiais. Por isso, a seguir, para dar os contornos do tema, faz-se necessário compreender o que venha a ser os Juizados Especiais Criminais, âmbito em que se encontra focalizado o presente trabalho.

2 JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS

Na sociedade brasileira já houveram críticas vorazes ao Poder Judiciário. Uns diziam, e ainda dizem, que a Justiça é lenta, que os processos caminham vagarosamente, que nada se resolve, e se perdem em críticas à justiça.

Com o passar do tempo houve um aumento considerável no volume da população brasileira, o que resultou em proporcional aumento dos problemas sociais, e, consequentemente, nas demandas do Poder Judiciário. Não só isto, mas a quantidade de atos processuais conjugada à quantidade de autos acabaram tornando a justiça morosa, com Varas abarrotadas de processos dos mais diversos. O modelo clássico de Judiciário, então, passou, nas palavras de Luís Flávio Gomes, a caracterizar-se por ser ?moroso, custoso e complicado? .

Preocupado em obter resultados mais palpáveis, o Desembargador Antônio Guilherme Tanger Jardim, em 1982, enquanto Juiz de Direito da Comarca de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, instituiu pela primeira vez o Juizado de Pequenas Causas. Logo em seguida, em decorrência da experiência ter sido bem sucedida, pois atendia aos interesses dos mais carentes, e questões de pequena monta, foi publicada a Lei n. 7.244, de 07 de novembro de 1984, que criou oficialmente os Juizados de Pequenas Causas.

Percebendo que os Juizados mencionados atendiam bem à população, contribuíam para o bom andamento da Justiça Brasileira e descongestionavam o Judiciário, o constituinte originário consolidou o instituto na Constituição Federal de 1988, que prevê:

Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:

I - juizados especiais, providos por juizes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juizes de primeiro grau; (grifo nosso)

A constituição dos Juizados Especiais encontra, portanto, bases sólidas na Constituição Federal de 1988, e tem respaldo não só no seu artigo 98, mas também no artigo 5º, inciso XXXV, em que ?a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito? . Ou seja, o constituinte originário viabilizou, numa combinação da leitura dos artigos citados, a criação de lei que permitisse um maior acesso à justiça, na proteção e garantia dos direitos fundamentais.

Em seqüência, em 1995, o legislador estrutura e solidifica os Juizados Especiais Cíveis e Criminais com a Lei n. 9.099, de 26 de setembro, a qual diz que tais Juizados serão criados no território brasileiro pela União e pelos Estados, com o objetivo de realizar conciliações, processar, julgar e executar, nas causas definidas como de sua competência (artigo 1º da Lei n. 9.099/95). E revoga em seu artigo 97 a Lei dos Juizados de Pequenas Causas.

Com o advento dos Juizados Especiais, este meio tão benéfico à sociedade passa a ter maior abrangência. Isto porque, antes, os Juizados de Pequenas Causas cuidavam apenas de questões cíveis de até 20 (vinte) salários mínimos, e o juiz somente homologava os acordos entre as partes. Atualmente os Juizados Especiais abrangem causas civis e criminais, aquelas de até 40 (quarenta) salários mínimos, e estas relativas a infrações de menor potencial ofensivo. O juiz, agora, não está restrito à homologação de acordos já estabelecidos entre as partes, e atua como um mediador, também tendo o auxílio dos conciliadores e do Ministério Público.

A efetividade da Justiça é vislumbrada na introdução da Lei que criou os Juizados Especiais, quando esta se preocupa, lantentemente, com a pacificação social. Esta lei optou por trazer ao Judiciário uma maior praticidade, e, assim, representa uma revolução processual.

Sendo assim, a Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, teve um papel muito importante no avanço do Poder Judiciário, e seus princípios norteadores revelam muito do que foi e está sendo esse avanço: oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade (artigo 2º da Lei n. 9.099/1995) .

Saliente-se que os Juizados Especiais atuam tanto na área Cível quanto na Criminal, mas pela delimitação deste trabalho discorrer-se-á sobre o âmbito Criminal, apenas.

2.1 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS

Permeia a Lei n. 9.099/1995 o princípio da dignidade humana que é de extrema relevância porque se encontra inerente à pessoa, revelando seus valores e repercutindo na própria condução da vida, no momento em que ao se constituir o ordenamento jurídico deve-se assegurar garantias e direitos fundamentais, e só excepcionalmente é que é possível limitar direitos. Desse modo, os efeitos deste princípio são sentidos em todos as normas e princípios existentes, e o Estado é, neste caso, o responsável por cuidar das necessidades básicas do indivíduo para que este tenha, por sua vez, uma existência digna.

Nesse contexto, o processo nos Juizados Especiais trouxe uma nova forma de cuidar dos interesses jurídicos da sociedade, com vistas a garantir seus direitos de uma forma mais efetiva, e rápida, que não fosse dispendiosa e que gerasse a paz social almejada por todos. Por esse motivo, quando o legislador criou a Lei dos Juizados Especiais se orientou, como já dito, por alguns princípios, constantes em seu artigo 62 , sejam eles:

a) Da Oralidade ? é a prevalência da palavra falada sobre a escrita, restringindo-se os documentos ao estritamente necessário. Há aqui, como exemplo, a concessão de mandato (de procurador) oral, feito pelo juiz à parte que comparece em juízo sem a companhia de um advogado.

b) Da Simplicidade ? corolário do princípio da instrumentalidade das formas, está bem explicitado no artigo 244 do Código de Processo Civil que diz que ?Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominação de nulidade, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, Ihe alcançar a finalidade? . Isto posto, depreende-se que a ação se desenvolve sob olhos voltados à garantia constitucional do acesso à justiça.

Este princípio não consta no rol dos princípios do âmbito criminal, citados no artigo 62 da Lei dos Juizados Especiais, entretanto também encontra acolhida como na área cível, conforme o artigo 2º. Isto porque, apesar de poder ter o legislador o omitido, em decorrência da maior formalidade do âmbito criminal, num panorama geral esse princípio apenas confirma a realidade de um rito que busca atender às necessidades imediatas da sociedade de uma forma eficiente, atendendo aos demais critérios aqui descritos, que podem acabar sendo dificultados caso não haja a simplicidade.

A exemplo, é possível citar o inciso II, do artigo 18, da Lei n. 9.099/95, que estabelece que em se tratando de pessoa jurídica, até mesmo um recepcionista pode receber a citação , o que facilita o trabalho do oficial de justiça, e reduz o tempo na condução do processo.

c) Da Informalidade ? também corolário do princípio da instrumentalidade das formas, nos termos ditos no item anterior, a informalidade é a dispensa de formalidades excessivas, devendo somente as essenciais e indispensáveis serem seguidas. Prima-se pela resolução da lide, em face até mesmo do processo.

d) Da Economia Processual ou Da Economicidade ? Trata-se da racionalização, do enxugamento dos atos processuais vislumbrando a ?[...] eficácia
máxima da prestação jurisdicional tal qual pretendida pela Lei [Lei n. 9.099/95].? .

Como exemplo, cita-se o § 3º, do artigo 81, da Lei n. 9.099/95 que dispensa o relatório na sentença, deixando o juiz livre para apenas mencionar os elementos de sua convicção .

e) Da Celeridade ? este princípio revela a busca, nos Juizados Especiais, pela rapidez na solução dos litígios, com audiências unas, em que as partes dali já saem com uma sentença. Além disso, é importante lembrar que a celeridade é auxiliada, e, consequentemente alcançada, com a observação dos princípios anteriormente expostos. Mas, este princípio é ilustrado no artigo 64 da Lei n. 9.099/95, em que há a facilidade dos atos processuais poderem ocorrer inclusive durante a noite, e em qualquer dia da semana .

Conforme visto, cada um dos itens acima colabora para que os Juizados Especiais sejam uma revolução processual, como já dito.

A Justiça consensual, ou coexistêncial, como também podemos denominá-la, surgiu para solucionar, gratuitamente, causas consideradas simples. Para melhor compreensão desta via judicial, no item seguinte será estudada a Lei n. 9.099/95, no que diz respeito ao âmbito criminal.


2.2 JUIDADOS ESPECIAIS CRIMINAIS (JECRIM) - A LEI N. 9.099, DE 26 DE SETEMBRO DE 1995 ? ESTUDO DOS ARTIGOS 60 E SEGUINTES

Compete ao JECRIM a conciliação, processo, julgamento e execução de infrações de menor potencial ofensivo, sejam elas: as contravenções penais Decreto-Lei n. 3.688, de 3 de outubro de 1941) e os crimes que tenham pena máxima não superior a 2 (dois) anos , exceto nos casos em que a lei preveja procedimento especial (artigos 60, e 61 combinado com o artigo 2º da Lei dos Juizados Especiais Federais).

A praticidade desta via judicial tem início no que concerne à sua competência, mas transcende quando se observa os seus princípios norteadores, pois lhe concede uma maior liberdade, visando a facilitação do alcance do objetivo mor, que é a paz social, seja por meio da reparação do dano sofrido pela vítima, seja pela aplicação de pena não privativa de liberdade (artigo 62); e dos objetivos secundários, que são a ampliação do acesso e racionalização dos serviços do Judiciário.

Os Juizados têm competência para julgar lides ocorridas dentro de sua região territorial de abrangência (artigo 63), é a competência territorial. No geral, neste contexto ocorrem infrações comuns, que decorrem das relações sociais diárias: injúria, ameaça, lesão corporal leve, violência doméstica, infrações de trânsito, perturbação de tranqüilidade, uso de substâncias entorpecentes, dentre outras. Embora devessem ser objeto de projetos, para que ocorresse a diminuição das ocorrências retromencionadas, é visível que a vinda dos JECRIMs simplesmente reflete uma adequação do Judiciário à realidade da sociedade dos dias de hoje, para que também tenham acesso pessoas carentes.

Os atos processuais nos JECRIMs caracterizam-se por serem públicos e válidos sempre que atingirem sua finalidade, observados os critérios (princípios) definidos no artigo 62 (artigos 64 e 65). Cabendo lembrar que, somente se pronuncia uma nulidade nesta via caso ocorra algum prejuízo (§ 1º do artigo 65).

A citação será pessoal, em alguns casos ocorrendo na própria delegacia, outros no juizados, sempre que possível. A intimação, contudo, pode ocorrer por carta, com AR (aviso de recebimento), ou, como ocorre em muitos casos na prática dos Juizados, por telefone, e, quando se tratar de pessoa jurídica, poderá ser encaminhada via oficial de justiça e recebida, por qualquer funcionário, ainda sendo possível o uso de qualquer outro meio idôneo de comunicação, como por exemplo via e-mail, em que se saiba que a pessoa o recebeu, isto tudo para facilitar ao máximo o trabalho da justiça gratuita (artigos 66 e 67). Garantindo-se, também, que se considerem cientes aqueles que comparecerem em audiência, no que se refere a todos os atos ali realizados (parágrafo único do artigo 67).

Ao ocorrer um fato, a vítima, ou envolvido, o noticia à polícia, ou seja, se dirige à delegacia de polícia e registra uma ocorrência, em seguida, a autoridade policial lavra o termo circunstanciado e o encaminha ao Juizado, bem como as partes. Também a autoridade policial pode requisitar exames periciais, caso sejam necessários (artigo 69). No caso de o autor do fato não aceitar comparecer ao Juizado ou não prestar o compromisso de comparecer, será preso em flagrante delito (parágrafo único do artigo 69).

Caso alguma das partes falte ao comparecimento nos Juizados será providenciada a sua intimação, ou de seu responsável legal, conforme o caso, pela Secretaria do Cartório do Juizado a que deveria estar presente (artigo 71).

Abra-se um parênteses nesse momento para compreender-se que, à exceção dos presos, qualquer pessoa física, maior de 18 (dezoito) anos, ou, menor devidamente representado, pode noticiar uma ocorrência.

Após o registro da ocorrência, configurada ela no âmbito dos delitos de competência dos Juizados, é marcada a primeira audiência, que pode ser conciliatória (para os crimes de ação penal privada ou de ação penal pública condicionada) ou preliminar (para os crimes de ação penal pública condicionada). Em ambas há a tentativa de um acordo para que haja, a princípio, a reparação do dano sofrido pela vítima, seja através de uma acordo de cavalheiros (damas) ? que se trata do compromisso de não cometer mais aquele ato - ou pela composição dos danos cíveis ? em pecúnia, no geral, para reparar algum dano material ou moral sofrido, conforme o caso. A diferença maior nesses dois tipos de audiência é que a Preliminar ocorre na presença do Ministério Público, titular da ação, e do Juiz, e a Conciliatória ocorre na presença do Conciliador, bacharel ou estudante de Direito, habilitado para isto e investido no cargo pelo Presidente do Tribunal de Justiça do Estado em que atue (artigo 73).

Como dito, na audiência preliminar devem estar presentes o Promotor de Justiça (representante do Ministério Público), o Juiz de Direito e os envolvidos (vítima e autor do fato), devidamente acompanhados de seus advogados e representantes legais, conforme o caso (artigo 72). Neste momento o juiz esclarece sobre a possibilidade de composição ou outro tipo de acordo, conforme o fato objeto de discussão, tentando fazer as partes realizarem uma conciliação, com o objetivo de dar fim ao processo antes mesmo que ocorra a denúncia.

Feito o acordo ou a composição dos danos, suas disposições são reduzidas a termo, homologando o Juiz por sentença, que transitará em julgado por ocasião da assinatura do termo pelas partes (artigo 74). Nas ações privadas e nas públicas condicionadas, feito o acordo, ocorre a renúncia ao direito de queixa ou representação, e, assim há o arquivamento dos autos por falta de condições de prossedibilidade (artigo 74 e artigo 43, inciso III, do Código de Processo Penal).

Não havendo conciliação o ofendido tem um prazo decadencial de 6 (seis) meses, da data do conhecimento do autor do fato, para apresentar queixa ou representação, que pode ser feita oralmente, e reduzida a termo na própria audiência em que restou infrutífera a tentativa de acordo (artigo 75).

Tendo a vítima representado, ou sendo a ação pública incondicionada, não estando presentes características que determinem o arquivamento, o Ministério Público está apto, então, a propor pena não privativa de liberdade ou multa, denominada transação penal, que é proposta, observadas as especificidades da situação, e alguns requisitos, e caso haja aceitação do ofendido aplicada nos termos legalmente definidos na sentença (artigo 76).

O procedimento sumaríssimo é o que conduz os processos nos Juizados Especiais. Caracterizado por ser mais simples, porque nele se tramitam questões de menor lesividade. Passam por esta via judicial tanto ações públicas, que têm como titular o Ministério Público, como ações privadas, cujo titular é o particular, conforme visto no capítulo anterior.

Neste rito em especial, a denúncia, tal qual a queixa, somente se procede mediante os requisitos determinados na Lei n. 9.099/95, em consonância, também, com os Códigos Penal e de Processo Penal. Lembrando que a primeira e principal tentativa nos Juizados é a conciliação, ou não havendo acordo, a transação penal.

O Ministério Público é obrigado a proceder à denúncia nas seguintes situações (artigo 77):

? não tendo ocorrido acordo;
? não tendo sido aplicada transação penal, preenchidos os requisitos do artigo 76, § 2º da Lei n. 9.099/1995;
? não tendo sido aplicada a suspensão informal do processo ou o sursis processual;
? tendo o ofendido representado, no caso de ação pública condicionada; e
? na ausência do autor do fato em audiência, quando declarado revel.

A denúncia é feita com base no termo circunstanciado, lavrado pela autoridade policial quando da notícia de um crime. Caso necessário o Ministério Público pode requerer diligências complementares, quando não estiver convencido dos fatos que perfazem o crime descrito, e o exame de corpo de delito, que ocorrerá, como no geral, a pedido da própria autoridade policial, uma vez que haja necessidade de tal exame, auferindo materialidade do crime por boletim médico (§ 1º do artigo 77).

Não havendo, em face da complexidade e circunstâncias do fato, possibilidade de dar continuidade com a denúncia, assim como no caso de não se conseguir citar o autor do fato, os autos deverão ser encaminhados à Justiça Comum para as providências cabíveis, a pedido do Ministério Público feito ao Juiz (§ 2º do artigo 77 combinado com o artigo 66). Com a queixa ocorre o mesmo, entretanto quem verifica a necessidade de se encaminhar os autos à Justiça Comum é o Juiz, não havendo influência do Ministério Público (§ 3º do artigo 77).

Reduzida a termo, cópia da denúncia feita oralmente em audiência é entregue ao autor do fato, cientificando-o da data da audiência de instrução e julgamento. Também saem da audiência cientes o Ministério Público, a vítima, seu representante legal (se houver) e seus advogados (artigo 78). No que se refere à queixa, se feita oralmente em audiência, e estiver o acusado presente, ele também sai cientificado.

Não estando o acusado presente quando da denúncia ou queixa-crime, a citação ocorrerá nos termos já descritos, pessoalmente ou por mandado, neste momento, da cientificação, também será informado da necessidade de apresentar, em audiência de instrução e julgamento, suas testemunhas, ou, então, requerer, no próprio Juizado, (informando nomes e respectivos endereços), num prazo de no mínimo 5 (cinco) dias antes da audiência, sejam elas intimadas (§ 1º do artigo 78 e artigos 66 e 68). Para ofendidos representados, a intimação é pessoal com AR (§ 2º do artigo 78), da mesma forma com que são intimadas as testemunhas (§ 3º do artigo 78).

Não há adiamento de atos processuais e, desta forma, é permitido ao Juiz, até mesmo, a determinação de condução coercitiva, ou seja, quando a autoridade policial vai buscar a parte, o que pode ocorrer inclusive no dia e hora de audiência, se necessário (artigo 80).

Na audiência de instrução e julgamento é tentada a conciliação, e oferecida proposta pelo Ministério Público, momento que transcorre conforme os artigos 72, 73, 74 e 74 (artigo 79). Não ocorrido acordo ou proposta é dada a palavra ao defensor sobre a acusação, em seguida o Juiz recebe ou não a denúncia ou queixa.

Recebendo a queixa ou denúncia, são ouvidas respectivamente: a vítima, as testemunhas de acusação e defesa e, somente por último, o acusado, diferentemente do que ocorre, por exemplo, no rito do tribunal de júri, na justiça comum, em que o réu é ouvido primeiro (artigo 465 do Código de Processo Penal). Portanto, nos Juizados Especiais, é garantido ao autor do fato uma ampla defesa eficiente, pois ocorre após todas as pessoas do processo deporem. Imediatamente após os depoimentos é dada abertura aos debates orais e, após, há a prolação da sentença (caput do artigo 81).

As provas que existirem serão produzidas na audiência de instrução e julgamento, podendo serem limitadas ou excluídas à critério do Juiz, quando as considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias (§ 1º do artigo 81).

Demonstrando a simplicidade e economia processual desta via judicial é lavrado termo do ocorrido em audiência, e após este breve relato dos fatos o Juiz prolata a sentença (§ 2º do artigo 81), que dispensa relatório e apenas contém os fundamentos em que o juízo se baseou para decidir (§ 3º do artigo 81).

Da sentença cabe apelar ou embargar de declaração. A Apelação ocorre com relação as decisões que não aceitam a denúncia ou a queixa. É interposta no prazo de 10 (dez) dias, contados da ciência da sentença pelo Ministério Público, réu e defensor. Deve conter as razões e o pedido, e sua resposta será escrita, após a intimação do recorrido, também num prazo de 10 (dez) dias. Será julgada por uma turma de 3 (três) juízes de primeiro grau, na sede do Juizado. (artigo 82)

Os Embargos de Declaração são cabíveis sobre sentença ou acórdão que sejam obscuros, contraditórios, omissos ou revelem dúvida. Podem ser escritos ou orais, apresentados num prazo de 5 (cinco) dias, contados da ciência da decisão. Se os embargos forem contra sentença terão efeito suspensivo com relação ao prazo para recurso. (artigo 83)

É importante dizer que, com relação a erros materiais, ou seja, erros de português, e outros, estes podem ser corrigidos sem que seja necessário recorrer-se, embargar de declaração, pode o Juiz realizar tais correções de ofício. (§ 3º do artigo 83)

Quando o acusado for condenado a pagar uma multa ou for feito um acordo de composição de danos, deve fazê-lo na Secretaria do Juizado ou por depósito em conta da vítima. Com o término do pagamento é extinta a punibilidade e, consequentemente, arquivado o processo. Não há registro de antecedentes criminais, ou seja, não se gera reincidência, apenas é registrada a pena para fins de requisição judicial, como, por exemplo, quando esta multa refere-se a transação penal, neste caso o registro serve para que novo benefício não seja concedido antes de 5 (cinco) anos do benefício anterior. (artigo 84)

Em sede de execução, apesar de serem os Juizados Especiais competentes, de acordo com o que dispõe a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 98, no Distrito Federal, acontece diferente. A Lei de Organização Judiciária do Distrito Federal determina que o responsável nesta circunscrição é o Juiz da Vara de Execuções Criminais ? VEC. Isto é uma particularidade no Distrito Federal, tratando-se de questão de política judiciária. Portanto, também é na VEC que serão processadas as penas cumuladas (de multa, privativa de liberdade e restritiva de direitos).

A transação penal, tal como a conciliação, é um dos instrumentos dos Juizados, e tem como objetivo a reinserção social do infrator. Preocupado com o número de criminosos que reincidem, o legislador passa a lhe dar uma chance quando da aceitação de proposta de transação penal proposta pelo Ministério Público. Trata-se pois, a transação penal, de um benefício instituído pela Lei n. 9.099/95, e que será objeto do capítulo que se segue.

Continua na Parte IV