Programa Justiça Comunitária sedia encontro para enfrentamento da violência sexual em Ceilândia

por PJC/ACS — publicado 2017-07-10T19:20:00-03:00

encontro para enfrentamento da violência sexual em Ceilândia Na última sexta-feira, 7/7, o Programa Justiça Comunitária do TJDFT sediou o encontro da rede social de Ceilândia com representantes das Secretarias de Estado Saúde, da Secretaria de Políticas para Crianças e Adolescentes e Juventude e a da Subsecretaria de Políticas para Mulheres (SEDESTMIDH). Os órgãos do Governo do Distrito Federal (GDF) uniram-se à rede social de Ceilândia para discutir e elaborar um plano de enfrentamento da violência sexual naquela cidade. Um público diverso composto de assistentes sociais, profissionais da saúde, educadores, psicólogos, representantes do Ministério Público e do Conselho Tutelar, instituições de ação social, entre outros, além de servidores e agentes do PJC, trouxe a voz de setores públicos e privados para a discussão sobre uma questão grave que vitimiza (e revitimiza) a população, especialmente mulheres, adolescentes e crianças.

A iniciativa do encontro partiu do GDF, motivada por recentes índices apurados pela Secretaria de Segurança Pública em relatório que constata o aumento de ocorrências e denúncias de práticas violentas contra mulheres e menores de idade, no Distrito Federal, e, em especial em Ceilândia, que lidera os números nessa estatística.

O encontro foi aberto pela servidora do PJC Conceição Aparecida de Rezende e pelo Agente Comunitário de Justiça e Cidadania Valdeci Pereira, que enfatizaram atuação do Justiça Comunitária como articulador nas redes sociais, além de trazerem esclarecimentos sobre o trabalho desenvolvido pelo Programa também na mediação de conflitos e na educação para os direitos. 

A Subsecretária de Promoção de Políticas para a Criança e Adolescente, Perla Ribeiro, explicou que a proposta do GDF é buscar discutir ações que podem ser efetivadas para enfrentar essa realidade de forma articulada com as redes sociais, criando-se uma metodologia de ação: “Espera-se que, dos nossos debates, desse pensamento conjunto, com a atuação do serviço público e da sociedade civil, possamos estabelecer 2 ou 3 ações e, a partir daí, se desenvolver um cronograma para o próximo semestre. O início está se dando em Ceilândia não somente por estar na liderança dessa estatística, mas também por ser uma cidade que já tem uma rede social muito organizada. A ideia é fazermos aqui o projeto-piloto, e, quando as ações estiverem bem encaminhadas, expandiremos para outras regiões do Distrito  Federal”.

Miriam Pondaag, Coordenadora de Políticas para Mulheres da Subsecretaria de Política para Mulheres, vinculada a Secretaria de Estado de Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos – SEDESTMIDH), apresentou dados estatísticos apurados pela Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP) relativos ao primeiro trimestre de 2017, relacionando-os com indicadores do mesmo período de 2016. Entre os números estão: aumento de 22,5% de registros de casos de violência sexual; entre os cenários do crime, em primeiro lugar figura a própria casa da vítima, e, em segundo, a casa do autor do crime; o grupo mais afetado pela violência sexual é de mulheres jovens e, o segundo, de crianças, entre 6 e 11 anos.

Ao apresentar as informações estatísticas, Miriam realçou a importância de se ponderar o aumento dos números considerando algumas variáveis: “Deve-se ter em conta, de todo modo, que o aumento de registros de casos de violência sexual não revela necessariamente o aumento de casos dessa violência. Isso porque, inclusive pelo trabalho já bem organizado da rede social de Ceilândia, a violência sexual tem sido “desnaturalizada”. Ou seja, atos violentos antes tidos como ‘normais’ ou aceitáveis, a partir da conscientização das vítimas, passam a ser mais noticiados também. Os relatos são trazidos aos órgãos públicos: a criança ou a adolescente que conta para a mãe ou para a professora sobre o abuso sofrido; a mulher que passa a denunciar a violência em casa; a mudança da lei com relação à tipificação mais ampla do crime de estupro também tem efeitos diferentes nessa incidência. uma família e a sociedade se envolvem mais com o problema que é de todos. Além disso, temos hoje mais ações educativas nesse sentido: aulas, palestras, informação. Assim, mais registros não significam exatamente mais fatos ocorridos”, ressalva Miriam.

 “ A força do hábito”: a cultura do estupro 

encontro para enfrentamento da violência sexual em Ceilândia A psicóloga Fernanda Falcomes, chefe do Núcleo de Estudos e Programas na Atenção e Vigilância, da Secretaria de Saúde do DF, alertou para o fato de que a cultura do estupro, que propicia o desrespeito às mulheres e as torna as maiores vítimas da violência sexual, frequentemente começa na educação: “O menino precisa entender que o ‘não’ da menina não é um ‘charme’ para ela dizer sim. Para a mulher adulta essa já é uma situação muito difícil. E quando o adulto violenta uma menina? O ‘não’ é insuficiente nesse combate. É preciso de uma retaguarda fortalecida para essa proteção. Sobretudo quando é necessário se combater isso dentro de uma casa”, afirma a psicóloga. Paulo Farias, articulador social do Centro Salesiano do Adolescente Trabalhador e integrante da rede social de Ceilândia, concorda: “A cultura de estupro é para ser combatida muito além do campo profissional e por uma rede social; é um combate que se inicia com a educação, em casa, com a educação, com o filho, o sobrinho, o irmão.”

Selma Aparecida Costa é conselheira tutelar em Ceilândia e também esteve presente à reunião no PJC. Selma relatou casos de atendimento do Conselho, especialmente em regiões rurais, onde comumente o autor da violência compõe o cenário familiar e a violência se perpetua entre mães, irmãs e filhas, em clima de silêncio e opressão: “Os Conselhos Tutelares vivem hoje a aflição de não conseguir acompanhar e fazer o que é preciso. Somos a porta de entrada de muitas denúncias, e as demandas são muitas. Um grupo de trabalho assinado pelo governo nesse enfrentamento é essencial. Se não houver, por exemplo, uma boa preparação dos policiais, na abordagem desses casos mulheres e crianças acabam sendo revitimizadas”, adverte Selma.

O agente comunitário Jhony Felipe Barbosa mostrou-se otimista com a inciativa: “Como agente e morador de Ceilândia, acredito que é necessário multiplicar o acesso à informação, fomentar discussões acerca de temas relacionados à sexualidade e combater a naturalização da violência em nossos discursos. Há tabus em nossa sociedade, a influência da mídia na opinião pública, padrões a ser desconstruídos. Precisamos acreditar nas políticas públicas lutar juntos. O PJC e a comunidade se somam a elas. Ações bem articuladas entre as instituições fazem o invisível tornar-se visível e esse trabalho, mais fácil.”

Antes de finalizarem a reunião, as representantes do GDF colheram dos presentes, por questionário, informações, ideias e propostas para análise mais detalhada para a elaboração de ações e estratégias de enfrentamento à violência sexual contra crianças, adolescentes e mulheres. O planejamento é levar os dados coletados para sistematização e, a partir de então, definir-se um plano operativo e a geração de um cronograma de realização, a ser desenvolvida pela rede. O novo encontro já está programado para agosto. Após, haverá a implantação do plano e um período de acompanhamento. A comissão, então, partindo da experiência em Ceilândia, estenderá a ação no enfrentamento à violência sexual para outras regiões administrativas do DF.