Vítima de tentativa de feminicídio conta sua história durante Semana da Paz em Casa no TJDFT

por CS — publicado 2019-03-15T17:00:00-03:00

foto de uma moça, de costas, contando sua história para uma plateia, no auditório sepúlveda pertenceCom o aumento das denúncias de casos de violência doméstica pelo Distrito Federal e em todo o país, ao longo dos últimos anos, e em meio à realização da 13ª Semana da Justiça pela Paz em Casa, o TJDFT recebeu a estudante de enfermagem Maria Francisca, de 34 anos, para contar sua história de superação e sobrevivência, após cinco anos de agressões dentro do relacionamento.

Maria Francisca deu um depoimento na abertura do evento, na última segunda-feira, 11/3, com o objetivo, segundo ela, de mostrar que é possível recuperar sua autoestima, reinventar-se e levar uma vida normal outra vez, mesmo após passar por uma tentativa de feminicídio.

Natural da cidade de Santa Rita de Cassia, no interior da Bahia, a jovem veio para Brasília estudar e trabalhar. Em dezembro de 2012, ela conheceu o antigo parceiro com quem se relacionou por cinco anos.

No primeiro mês de namoro, os primeiros xingamentos, sem motivo nenhum aparente. O ciúme já se mostrava excessivo e, da mesma maneira, desmotivado. Ainda assim, com seis meses de relacionamento, os dois decidiram se casar.

As agressões não pararam. Ao contrário, tornaram-se mais frequentes e mais graves. Empurrões, controle do celular, dos horários de chegar, das companhias. Para quem trabalha com isso diariamente, as situações são típicos casos de violência contra a mulher. Para a vítima, no entanto, muitas vezes, esses sinais não são fáceis de se identificar e aceitar. Este foi o caso da Maria Francisca.

“Eu saí de casa várias vezes e ele ia atrás, prometia que ia mudar e eu acreditava, tinha fé que ele ia melhorar”, contou. “Eu não queria desistir do meu casamento”. No depoimento, a estudante contou que após as promessas, ele voltava a beber e retomava as agressões. Nesta altura, já físicas.

Tentativa de feminicídio

O relacionamento abusivo durou cinco anos, até a última investida, numa tarde em que ela limpava a casa, enquanto ele cozinhava e bebia algumas cervejas. “Do nada, ele começou a me xingar e, de repente, ele disse que iria tacar fogo em tudo. Eu pensei que era na casa, nas coisas, e pedi que não fizesse isso”, relatou. “Enquanto eu estava no tanque de lavar roupas, ele despejou álcool nas minhas costas e acendeu a chama do fogão”, lembrou ela.

A chama atingiu o corpo de Maria, que conseguiu fugir até o banheiro e pedir ajuda. O agressor tentava em vão apagar o fogo que começou a pegar nos utensílios domésticos, pouco se importando com a vida da companheira.

Graças à ajuda dos vizinhos, que chamaram a polícia e os bombeiros, Maria Francisca conseguiu sobreviver, mas ficou dois meses internada, teve 40% do corpo queimado e hoje é acompanhada por fisioterapeuta, psiquiatra e psicólogo semanalmente, além de um dermatologista e um cirurgião plástico.

“Não compensa viver com um agressor dentro de casa. Não façam como eu que desisti das medidas protetivas. Denunciem e mantenham a medida. Ela podia ter evitado tantos traumas físicos e psicológicos, além de eu quase ter perdido a vida”, aconselhou.

Maria Francisca ainda não retornou ao mercado de trabalho devido a intensa rotina de atendimentos médicos, mas segue estudando enfermagem e começou um outro relacionamento afetivo. “Acredito no amor e que podemos, sim, reconstruir nossas vidas e sermos felizes com um outro parceiro, como estou fazendo agora”, disse ao injetar um pouco de esperança no coração de tantas mulheres também vítimas do que ela passou. 

O ex-marido de Maria Francisca, Leonardo Gonçalves Borges, foi condenado a 15 anos de reclusão, em regime fechado, pela tentativa de homicídio triplamente qualificada por meio cruel (emprego de fogo), uso de recurso que dificultou a defesa da vítima e contra a mulher (feminicídio), por razões da condição do sexo feminino. Clique aqui e saiba mais.

Números

Em 2018, os 19 juizados do Distrito Federal conheceram 20.104 novos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. Eles também foram responsáveis pelo deferimento de 10.923 medidas protetivas em favor das vítimas (total e parcial); pela expedição de 319 mandados de prisão preventivas e temporárias; e por 4.472 sentenças condenatórias contra os agressores. As varas do Tribunal do Júri do DF também deram sua contribuição, conhecendo 94 novos casos de feminicídio e proferindo 62 sentenças de mérito relativas ao tema.

Na Semana da Paz em Casa, o TJDFT realizou uma série de atividades com o objetivo de prevenir e coibir possíveis atos de agressão contra mulheres dentro ou fora de suas residências. A iniciativa, que chega à sua 13ª edição, é uma ação conjunta que abrange todos tribunais do país, numa mobilização nacional, que visa promover esforço concentrado de audiências e sentenças e a conscientização sobre o problema da violência doméstica, alcançando comunidade e instituições parceiras.

 Fotos: Daniel Coelho-NBastian/Divulgação TJDFT

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